A sétima maçã

A sétima maçã

“Não é o que entra pela sua boca que contamina o homem, mas o que sai” (Mt 15.11)

A noite já havia invadido desde antes dos rumores da própria guerra. Ela já havia alcançado tudo, excetuando a aquele que andava sobre seus passos. O soturno envolvia-se com a penumbra, de onde nasciam monstros infernais. Mas era dele aquilo que tinha se tornado noite, e apesar do medo e da morte dos seus anelos, a rosa que havia em suas mãos era a vida que havia ali. A esperança embatia ao mesmo tempo em seu corpo, porém sem latejar era lânguida, chula, nula. Ela não podia entrar em portas trancadas. Ele, inevitavelmente, assim se conduzia. Escorregando nas próprias gotas lacrimejantes, se desesperando com cada sangue que de suas veias palpitavam-se a beijar o preto das rochas. Qual seria a reação de outrem? Tudo que ele tinha, não mais tinha. Havia saído do controle que ele nunca teve. Destinado a vaguear sem destino, andando sem andar, perdido em sua própria perca. Sua mente, obviamente, aceitava ser conduzida, tal qual a ovelhas que ceguem, cegamente, seu pastor nos campos. Os demônios ofereciam-no frutas do Éden. Era o final? Mas não houvera começo, ou, ao menos quem lembrava-o? Seus ouvidos foram estuprados pelas tempestades de areias negras. Seus olhos já haviam cegado, pois, não eram dos morcegos. Sua boca congelava-se com a solidão de si a si mesmo que ele fazia. A guerra passava a entrar nele. Ele comeu a primeira maçã que o ofereceram, e seus olhos achavam que viam, e se enganavam quando enganavam ele, ao ver companhias verdadeiras, pessoas lá ao seu lado, aparentemente o estimulando. Mas toda enganação apenas serve para enganar, e quando feita por si mesma, frustra. Nele não havia objetivo, mas donde vinha, e para onde ia, não havia suicídio ou perca de memória. Ele comeu a segunda maçã, esta um demônio chamado “Arrogância” o deu. Era doce como mel na boca, porém inflamava seus pés, ele não podia andar – nem se fosse para o lado. Ele comeu a terceira, e da mesma forma ocorreu, porém suas mãos e seus braços inflamaram, de tal forma que se quisesse abraçar os ventos que não se viam, seria mais impossível. E ele comeu a quarta e a quinta de uma vez. Elas o fizeram levitar, e se separar em dois, e um ficou abaixo, imóvel, enquanto o outro voava mais alto, até o momento que este ficava acima de si mesmo. As maçãs do Éden, o faziam ter objetivo. Ele viciado queria mais delas. Não havia mais nada para fazer lá senão ter as maçãs. Mas nenhum demônio queria lhe dar a sexta maçã. Negavam e não queriam contestação, que ele fazia questão de cobrar. Foi preciso guerra para ele poder ter sua maçã. E ele assassinou seu medo, sua angústia e seu autodesprezo para ter a fruta. Ele fez guerra a guerra. E fez da noite um deserto a noite. Sem demônios, sem o outro de si, que até então imóvel também tentou-o impedir. E estava lá a fruta, no chão um pouco machucada, mas suficientemente saciável para seu querer, que de uma vez por todas tinha implodido. Ele comeu. Sua ação era mais devastadora. Ela, estonteantemente, o fez vomitar tudo que tinha haver com maçãs de suas entranhas. Seria por isso que os demônios não queriam dar-lhe? E seus olhos abertos se abriram. E ele viu um local escuro, mas não completamente sem iluminação. Era o mesmo local, só havia, aparentemente, acendido alguns refletores. Ele ganhou sabedoria, força e agilidade com a maçã. Mas, os demônios haviam ressuscitado. O medo, a esperança, e seu outro eu estavam ali novamente a incomodar. Apesar disso, ele às vezes facilmente, outrora com dificuldade variável negava seus apelos e chamados, agora considerados por sua sapiência de tolos. Ele havia ganhado músculos. Encontrou outra maçã – a sétima. E sabia, que dessa vez, apenas comeria a maçã, por ser uma maçã. Não por ser um sonho a se realizar, ou uma única forma de se saciar. Ele ganhou o poder de criar. E ele criava árvores, e outras fontes de comida. Ele estava, apenas, querendo degustar sua maçã, enquanto caminhava livremente, e destemidamente pelos monstros. Ele ao olhar para o horizonte sabia que aquilo tudo era dele, porque aquilo tudo era ele. E ele olhou para cima e gritou para mim: - Não podemos deixar em nenhum momento nenhuma dessas monstruosidades saírem!

Eu acenei. Mostrei um “legal” com o polegar. Nós sorrimos. Eu continuei a escrever como agora. Ele voltou aos poucos comer a maçã, e construiu uma casa debaixo de uma macieira. E uns demônios ainda ousaram gritar: - Mas essas maçãs não são do Éden! – Ele respondeu: - Serão! Se eu quiser...

Leandro Santtos
Enviado por Leandro Santtos em 03/04/2014
Reeditado em 03/04/2014
Código do texto: T4755089
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