Muito Longe do Fim Décima Quarta Parte
A administração de Imaculada funcionava em um prédio branco, próximo a uma linda praça. Fomos recebidos com muita cordialidade e fizemos nossos registros como novos moradores do lugar. Parece que somente pessoas jovens e bonitas moravam naquela cidade, não vi ninguém mais idoso. Dr. Teodoro se despediu, disse que estava à disposição para o que precisássemos, bastava chamá-lo pelo pensamento, e foi embora flutuando. Eu ainda me espantava bastante com isso...
Alexandre e eu fomos dar uma volta na praça. Era um lugar de sonho. Grama verdinha e orvalhada, como a gente nunca vira antes. As árvores ostentavam cachos de flores amarelas, rosadas, brancas, e davam uma sombra perfumada. Em um lago de água transparentes nadavam cisnes brancos, e mais adiante, erguia-se um alto pedestal com uma imagem de mármore, em tamanho natural, de Nossa Senhora da Imaculada Conceição, padroeira da cidade e dos suicidas em geral.
Sentamos num banco, apreciando toda aquela beleza e paz. Nossos coraões tinham necessidade dessas coisas, depois de tudo o que havíamos sofrido.
- Que lindo, - murmurei.
- Lindo demais. - disse Alexandre, e de repente me perguntou: - Você tem vontade de encontrar mais alguém, Passarinho, além dos nossos amigos que já estão aqui conosco?
Refleti por um instante.
- Meus pais e minhas irmãs. - respondi. - Mas não sei onde eles estão. - encarei meu amigo. - E você? Quem você gostaria de rever, Alê?
- Eu também gostaria de rever meus pais, e o meu filho. - disse ele, brincando com a aba do boné. - E acredito que vou encontrar com eles um dia... é só uma questão de tempo. Mas, quem não me mereceu, quem me fez sofrer, quem me abandonou na hora em que eu mais precisei... esses eu já deletei da minha cabeça, Passarinho. Pra sempre...
Essa resposta me encheu de uma misteriosa felicidade.
- Ah, eu gostaria muito de conhecer aquela poetisa, a Florbela Espanca. - falei. - Fiquei muito fã dela.
- Qualquer dia ela aparece. - disse Alexandre. - Vem voando, como o pessoal faz por aqui. - riu muito. - Eu ainda não me acostumei com esse meio de transporte...
- Nem eu, - disse, rindo também. - Ainda prefiro andar.
Alexandre se levantou e me puxou pela mão.
- Por falar nisso, vamos andando? A rapaziada vai passar la em casa pra nos buscar depois.
- Vamos. - concordei, e fomos embora de mãos dadas.
CONTINUA