PEQUENO BEBÊ

Eu levantei por volta das duas da tarde. Era verão, o clima era de alegria, mas com um pouco de pesar... Aquele bebê, sempre me chamou a atenção, não só pelo fato de ele caber na palma da minha mão, mais pelo modo como ele reagia se falassem com ele. Era como se estivesse respondendo às pessoas, tentando dizer algo. Mas seu esforço era em vão, tudo o que ele conseguia era mexer a boca e seu pequeno corpo, que fazia cócegas na mão de quem o segurava. Decidi então me aproximar de minha tia, que o segurava com cuidado. Ele olhou para mim, com aqueles olhos negros, que mais pareciam dois pequenos pontos pretos feitos com um delicado pincel. Ele tentou me dizer algo, mas novamente seu esforço foi em vão. Eu admirava aquela pequena criatura, tão pequena, tão fraca, seria capaz de perdê-lo dentro de meu bolso! Mas mesmo com toda essa fragilidade ele se mostrava insistente e confiante, sabia que um dia iria conseguir o que tanto queria... Ser ouvido. Foi quando minha tia pediu para que eu o segurasse um pouco, eu aceitei. Peguei-o com todo o cuidado de um irmão, pois ele era sangue do meu sangue e não queria que nada de mal acontecesse com ele. Minha tia saiu da pequena sala e eu fiquei ali com o meu pai e o pequeno bebê. Fiquei com ele por pouco tempo, tinha medo de machuca-lo. Entreguei-o a meu pai. Meu pai, com certo desprezo e cuidado o pegou e colocou-o no braço do sofá, como se fosse apenas um pequeno pedaço de carne enrolada num pano. Foi então que minha tia chegou. Olhando aquela cena terrível, um pai não dando importância nenhuma a seu próprio filho! Ela chegou perguntando: “onde está o bebê?” Ele com arrogância disse: “está aqui!” E entregou aquela pequena criatura enrolada num pedaço de pano, toda amassada, distorcida, quase sem forma... Minha tia olhou com cara de choro se perguntando: o que ele fez? Porque não cuidou dele? Como teria deixado seu próprio filho naquele estado? Tudo o que ela pôde fazer foi ficar olhando aquele bebê, que agora mais parecia um pedaço de massa de modelar amassada. Nessa hora eu não aguentei ver aquilo, saí da sala, que agora se tornara tensa e escura, a cortina já não dava espaço para a luz do sol entrar, pelo contrário, bloqueava a luz que entrava na pequena sala, tornando-a fria e escura. Eu fui para o meu quarto. Deu só o tempo de entrar e sair. Quando sai pareceu-me que o tempo tinha se passado, as roupas não eram as mesmas, o tempo já não era o mesmo, a porta da sala que antes estava fechada, estava aberta. Todo o cenário estava diferente, até mesmo a energia daquela sala, minhas últimas lembranças eram de uma sala obscura e com clima pesado, mas que agora se tornara limpa, clara e cheia de energia. Eu entrei meio tímido, sentei no mesmo lugar ao lado de minha tia. O lugar em que se encontrava meu pai estava dando lugar a um pequeno menino. Ele aparentava ter uns seis anos. Parecia estar alegre e ansioso. Era uma criança normal como qualquer outra, tinha cabelos castanhos escuros, pele parda, um pouco acima do peso para as crianças daquela idade, mas ainda assim era uma criança bonita e que chamava a atenção de todos que o viam. Seu olhar misterioso me intrigava. Era um olhar inocente, porém sombrio. Sua movimentação era como de alguém que se espera por algo, como uma presa esperando o momento certo de dar o bote, mas não deixando de ser criança. Foi então que ele se aproximou de mim, parou na minha frente por poucos segundos, olhou bem dentro de meus olhos, aquele olhar me era familiar. Foi então que me lembrei de um pequeno bebê, que fazia cócegas na palma de minha mão, lembrei também de um pequeno bebê sem forma enrolado num pedaço de pano... Seria ele aquele menino? Como aquele bebê frágil se tornara tão grande e forte? E aquele olhar, o mesmo olhar, feito por pinceis, que tanto me intrigava. Ele se afastou de mim, e com um pequeno sorriso saiu, pulando e se movimentando ansioso, apenas aguardando o momento certo.

Rangel Amon

Rangel Amon
Enviado por Rangel Amon em 10/01/2014
Código do texto: T4643620
Classificação de conteúdo: seguro