A ORFÃZINHA E O MENINO JESUS

Aproxima-se a grande festa da criançada - o Natal do Menino Jesus -, trazendo a todos nós um clima gostoso de ternura, de nostalgia, à lembrança dos tempos de infância que já se vão tão longe... Partilhando tais sentimentos com os amigos do Recanto, publico a crônica abaixo com votos de um feliz e santo Natal a todos e um venturoso 2014.

A ORFÃZINHA E O MENINO JESUS

Era noite de Natal. A capelinha estava cheia de gente. A reza já tinha começado quando a menininha entrou temerosa, olhando ressabiada para um lado e outro, a ver se recebia ao menos um sorriso dos adultos que pareceram nem tê-la visto no seu vestidinho de chita remendado e os pezinhos descalços. Não devia ter mais que seis aninhos.

Sem se importar com o descosido da saia, por onde se via a pele nua do corpinho magro, a pobrezinha foi entrando devagar. Lá na frente, diante do presépio, a criançada se apinhava, acotovelando-se irrequieta, cada um querendo ver o Menino Jesus mais de perto. Ela foi se achegando de mansinho, com medo de ser escorraçada dali para fora como sempre acontecia em todos os lugares onde procurava fazer-se amiga.

Ao vê-la avançando para o presépio, as crianças se afastaram dela entre risos e cochichos, abrindo caminho.

Sem ligar para o que acontecia a sua volta, a menina se pôs a olhar para o Menino Jesus, e viu-o sorrir e estender carinhosamente os bracinhos para ela. No mesmo instante, Jesus saiu da manjedoura, cresceu em tamanho e até a idade dela, e sentou-se à beira do presépio a conversar com ela.

— Que bom que tu vieste me ver! Nesta noite, as crianças do mundo inteiro me pedem presentes. O que é que tu queres ganhar? Podes pedir, que eu te darei, seja o que for.

As crianças que nada viram nem ouviram do extraordinário, estranharam ao ver a pobrezinha erguer os bracinhos e ficar como se enlaçasse o pescoço de alguém. Curiosas, ouviram-na sorrir e falar com voz sumida e pensaram que ela estivesse louca ou sonhando.

— Ah, meu bom Menino Jesus, que saudade eu sinto da mamãe! Depois que ela morreu, eu nunca mais ganhei um carinho, nem mesmo um sorriso... muito menos um presentinho. Eu sinto tanta falta dela!... Me disseram que ela foi com o Senhor... Por que o Senhor tirou minha mãezinha de mim? Deixe eu ir morar com ela lá no céu, deixa! É só isso o que eu peço.

As crianças viram-na, ainda, curvar o corpinho para frente, virar o rostinho e dar um beijo estralado no ar.

A reza acabou, e a criançada barulhenta se foi aos empurrões. O povo todo saiu, e a capelinha foi fechada. A menininha, porém, sem ser percebida, ficou ali, abraçada ao seu Menino Jesus.

Na manhã seguinte, ao chegar à capelinha para celebrar a Missa de Natal na comunidade, o vigário surpreendeu-se ao ver uma menininha deitada sobre o assento do banco mais próximo ao presépio. Pensando que ela estivesse dormindo, tocou-a no rostinho macilento, para acordá-la e sentiu-o gelado.

O Menino Jesus cumpriu o prometido, atendendo-a em seu pedido, e levou-a para morar no céu com sua mamãe.