Os poetas e o extraterrestre



 
                        Já estava me acostumando  a uma sensação de paz deliciosa ao contemplar todas as madrugadas o espaço celestial.  E via os inúmeros astros com meu pequeno telescópio.  Tinha mandado fazer uma pequena torre em cima do telhado da minha casa e cismara de enquadrar meu telescópio numa pequena área do céu. Pelos meus cálculos, essa área estaria a apenas 50 anos luz de distância da terra. Numa dessas noites, de repente, piscou uma luz forte e um cartaz acendendo e apagando dizia: “Estou  vendo você  e sei algo a seu respeito”.
                        Não tinha como responder, e de início fiquei apavorado, pois já estava sabendo que o nosso escritor Veríssimo havia tido um  contato extraterrestre. A civilização que ele havia encontrado estava de olho no nosso planeta. À procura de poetas. O leitor naturalmente já estará perguntando: - “Procurando poetas para quê?”  Segundo o Veríssimo, para comê-los. Foi comendo poetas que essa civilização  conseguiu imenso progresso.
                        Agora o leitor vai entender minha preocupação. E se essa civilização fosse a mesma que estava me vendo?  E se me confundissem com um poeta, mesmo um reles poeta, que nem sabe fazer um soneto... Meu intuito era desfazer qualquer mal entendido comigo.
                        A minha angústia pelas noites seguintes era responder logo que não era poeta, que era um escritor amador e que só escrevia crônicas, e no máximo alguns contos bobos.  E ficava embasbacado olhando para o meu ponto escolhido no céu. Na terceira noite, novo facho de luz e lá veio a frase: - “ Sei que você anda escrevendo muito e tem vários amigos poetas”.  E outra frase, em seguida: “Não se assuste, só queremos saber como vocês conseguem viver neste planeta terra. É o pior lugar pra se viver em todo o universo”.
                        Estava salva a pátria, não estavam querendo comer ninguém, nem os poetas. Mas estava cheio de dúvidas. Quem estaria falando comigo? Um homem, uma mulher, um animal falante ou um ser totalmente desconhecido por mim?
                        Continuei varando as noites em busca de respostas. Certa noite, resolvi arriscar. Fiz uma tabuleta e escrevi: “ Pior planeta, por quê?” Veio a resposta: - “Porque vocês precisam de oxigênio, que oxida tudo e por isso vocês morrem”. E logo, outra explicação: “as primeiras bactérias no início da terra criaram o oxigênio. Foi um erro; ele dá vida, mas mata também, não sei como essa civilização ainda sobrevive”.
                        Essa informação me fez muito bem. Sempre fui um revoltado com a morte. Sempre achei que tudo poderia ser diferente. Mas poucas pessoas me entendem. Fiz muitas outras perguntas ao meu estranho amigo, ou amiga, ou animal, sei lá! Pude constatar que o ditado “do pó viemos e ao pó voltaremos” estava totalmente errado, ou pelo menos, parcialmente errado. O certo é dizer: “ Da ferrugem viemos e à ferrugem voltaremos”.
                                 Numa noite, não perdi a oportunidade e perguntei ao misterioso amigo: - " Em que devo acreditar?"  A resposta demorou um pouco. "Veja bem, - disse-me ele,- o mundo é isso mesmo que você está vendo, não espere salvação. Viva a vida e continue contando suas estórias. Seja um quase zen-budista, já está de bom tamanho".  
                        O extraterrestre um dia se despediu de mim. Disse-me que todos no universo fugiam do planeta terra, para não se contaminarem com o oxigênio. Perguntei, então, já saudoso: - “ Pelo menos alguma coisa da terra vocês gostariam de ter?”  E o amigo respondeu: - “Ferrugem (o apelido que ele me deu), talvez a camisa 10 do Flamengo.” Pensei comigo mesmo: - “ Que obsessão terrível essa do Flamengo, se alastra até nos confins de todos os universos...”  
                        Parei de olhar para o céu e o meu telescópio enferrujou, mas uma certeza me ficou: o cara que falava comigo era um tremendo brincalhão!                                                                            Ou, não?
                                                                      



Nota:  Está sendo programado um encontro dos Recantistas no dia 05 de outubro deste ano, em  Miguel Pereira/RJ, na Praça do Chafariz, a partir das 10,00hs.
              Contato:  Regina Madeira, de Miguel Pereira