Maldições não devem ser quebradas, mas são

– Quando é nossa previsão de chegada? – perguntou Rurik.

O grupo estava no começo de uma subida por uma colina. Ao redor dessa colina havia uma pequena floresta. Agnus olhou para Itivy e sorriu. Agnus seguia ao lado de Thandera. Sórdyrus e Sayrus andavam em completo silêncio. Rurik e Shane iam trocando ofensas. Ravena e Ghost iam andando e falando sobre seus casos ao longo de suas existências. Em certo ponto do trajeto Itivy parou e sorriu. Ele se virou para todos e apontou para alguns pontos onde havia uma espécie de pó preto. Ninguém mostrou reação nenhuma. Itivy continuou com o sorriso. Agnus logo perguntou:

– Por que o sorriso? E o que aquele pó preto tem de mais?

– Drückgeister, haviam quatro aqui antes de chegarmos.

– E perdemos a oportunidade? Droga.

– O que seria Drückgeister? – perguntou Shane sem empolgação nenhuma.

– Espíritos da Opressão. Tentam matar qualquer ser que se mexe. São seres morto. Existe a inveja. Nenhum ser vivo pretende morrer cedo. Os que morrem atormentam os vivos – explicou Agnus – Mas se eles estão mortos quer dizer que... Merda! Outros estiveram aqui antes de nós. Não somos os únicos nessa caçada. Um problema isso.

– Acaba de descobrir isso? – perguntou Thandera ironicamente – Não presta atenção em nada? O Forbaneddes que nos recepcionou ao chegarmos havia dito que não estávamos sozinhos nessa corrida. Ele disse que se alguém de Sariderça morrer nós também morreremos. Conclui-se quê? Não precisa responder.

– Então eles estão à nossa frente? – perguntou Sayrus preocupado.

– Ao que tudo indica sim. Mas podemos contorná-los – garantiu Agnus – O que acha, Itivy?

– Ele dormiu. Eu assumo agora. Prazer, sou Ity. Podemos contorná-los. O Velho Hint os está guiando. Durante o por do sol ele se despedaça, isso todo dia. Ele demora cerca de dez a onze minutos a se reconstituir. Talvez possamos usar isso a nosso favor. Temos velocidade e aprendemos a sobreviver com que pudermos achar. Eles vivem dos dons deles. Podemos ir pela floresta e teremos uma boa vantagem. Eles acham mais seguro ir em campo aberto.

– Mas e esses Drückgeister? Não serão um problema? – perguntou Ravena alarmada.

– Podemos com eles – respondeu Ity.

Ele olhou ao redor e apontou para quatro pontos distintos. Sórdyrus, Rurik, Shane e Thandera foram até esse pontos e trouxeram de lá uma arma cada. Um martelo, um arco, uma espada e uma lança, respectivamente.

– O que são essas armas? – peguntou Ravena.

– Não temos tempo para explicações. Vamos logo pela floresta.

Sórdyrus foi o último a entrar na floresta. Ele olhou para a estrada e lançou Mjolenir contra uma árvore. O martelo foi sugado pela árvore. Sórdyrus seguiu para dentro da floresta.

O grupo andava rapidamente e em silêncio. De repente estancaram, havia em sua frente uma alcateia com sete lobos alvos e grandes, estavam imóveis. Ity recuou. Os lobos olhavam fixamente para o grupo. Rurik pôs uma flecha em seu arco e apontou para o lobo que estava à frente da alcateia. Ravena imitou Rurik e armou sua flecha, apontando para o último lobo, que ao contrário de todos os outros, era negro. Ity se pôs na mesma posição dos lobos. Ity avançou. O lobo negro se interpôs entre Ity e o primeiro lobo. Ele olhou para todos os presentes e em seguida atacou Rurik, que instintivamente atirou a flecha. O lobo recuou sem ser atingido pela flecha. Sayrus tomou frente e armou sua besta. Ele apontou para o terceiro lobo da direita e atirou. A flecha transpassou o cranio do lobo, que continuou em seu estado inicial, imóvel e inalterado. Rurik e Ravena também atiraram contra dois dos lobos. Pareciam estátuas. O lobo negro se pôs em modo de ataque. Ity se levantou e olhou bem nos olhos do animal.

– Não ataquem. Não são seres. São estátuas. O lobo negro está tentando os defender. Vamos embora ou a coisa não será agradável – sugeriu Ity.

– Não estou defendendo nada. Estou esperando que eles voltem a vida para que eu os mate. Sou um ser superior. Não percebes a diferença? Olhe bem. Nossa pelagem é diferente. Nossos instintos são diferentes. Eu sou superior. Não hesitem. Talvez tenham êxito ao me matar. Mas não será fácil. Acredite estamos todos à mercê da Lei da Sobrevivência. Não existe uma distinção entre crianças e velhos. Mortos e vivos. Somos todos sobreviventes, inclusive os que morrem – o Lobo disse – Sei o quão fantasioso é ouvir um lobo falar.

– Se são estátuas por que está aqui esperando que eles se movam? – perguntou Rurik.

– Não são estátuas. São seres vivos amaldiçoados. Eu os mato todas as noites como castigo de traição. Eles invocaram a ira de Deuses e Seres. Estão fadados a morrerem todas as noites. Por minhas presas suas carnes são rasgadas. Por meu bafo seus ossos são transformados em pó. Por minha existência ele vivem e morrem ao final e término da noite.

– Podemos observar? – perguntou Ghost.

– Podem sim. Mas deverão pagar um tributo. Qualquer um.

– Quer um de nós? – perguntou Ravena – Eu me ofereço.

– Quero a criança. O maldito.

– Por que quer nosso guia? – perguntou Shane – Ele não terá utilidade para você. Ele nem mesmo é comestível.

– Eu serei o sacrifício – disse Ity.

– Não seria melhor irmos embora? – sugeriu Thandera – Os de Sariderça devem estar em nossa frente. Ao invés de parar para ver uma inutilidade poderíamos seguir em frente.

– Ela tem razão – disse Sayrus – Não podemos perder tempo com coisas desnecessárias.

– Faço questão que vejam – insistiu Ity – Como será o sacrifício?

– Eu mato você. Como sua carne e pronto.

– Achei que existia toda uma dramaticidade.

– Não existe mais as orações aos deuses. Não mais existem os deuses. Exis te Død Hore. Ela se vangloria por ser uma soberana, mas nunca foi e nunca vai ser.

O lobo se aproximou de Ity, rosnou e pulou no pescoço do Ity mordendo sua jugular. Ity caiu desfalecido no chão. O lobo olhou ameaçadoramente para os presentes. Não havia ninguém assustado, aquilo parecia normal. Não era muito diferente do que todos já haviam feito antes ao longo de suas vidas, matar em nome da sobrevivência ou só matar. Ghost e Ravena se sentaram com as costas rente a uma árvore e ficaram conversando. Sayrus e Sórdyrus foram caminhado pela floresta. Crow se juntou ao lobo para comer a carne de Ity. Shane e Rurik ficaram em pé observando o guia ser devorado. Thandera fez seu trono erguer e se sentou nele. Agnus olhou ao seu redor. Ele subiu em uma árvore e desenrolou seu pergaminho. Nele havia escrito a invocação:

”Sie, die durch Verrat und Eifersucht wurde in Hel zu stoppen,

sondern wiedergeboren als das Licht am Ende der Zeit der Götter.

Mit Ihrem leistungsstarken Licht erfrischend,

schnell kommen, um mit mir zu bleiben und mir helfen,

weil ich brauche, was erwartet uns in der Zukunft”

Agnus repetiu a invocação em tom confidencial e inaudível. As letras do pergaminho sumiram e uma nova mensagem foi sendo lentamente reescrita.

“Ingen jævla som dør som følge av et monster.

Det er ingen monster som dreper fordømt.

Det er ikke noe liv som blekner til å berøre bakken.

Det er ingen grunn som blekner til å ende livet.

Det er en syklus til slutt.

Det er ingenting å stoppe.

Begynner ikke avhengig av avslutninger.

Men avslutninger avhenge av begynnelse.”

O pergaminho parecia enigmático, mas não era. Ele só não revelava de imediato o que devia ser dito. Além do mais eles eram Denker, havia a obrigação de saberem coisas. Agnus leu em voz alta para que todos pudesse ouvir, até os que estavam longe:

“Não há maldito que morra por consequência de um monstro.

Não há monstro que mate malditos.

Não há vida que se esvai ao tocar o chão.

Não há chão que esvai ao terminar a vida.

Não existe um ciclo que se acabe.

Não há o que acabar.

Começos não dependem de términos.

Mas términos dependem de começos.”

O grupo esperou até o anoitecer. O lobo já havia devorado Ity por completo. Ao anoitecer os lobos brancos começaram lentamente a se movimentar. O terceiro lobo da direita caiu ao mesmo tempo que começou a se mover. Restavam agora seis, contando com o lobo negro. Os lobos brancos olharam à sua volta e observaram atentamente os presentes.

– Como ousas matar Dib? – perguntou o lobo à frente da alcateia.

– Do mesmo jeito que ousarei matar-te, Zev – respondeu o lobo negro.

– Não devias ocupar teu nobre tempo nos punindo, Óffila – disse Zev – Não devias estar amaldiçoado aqui conosco.

– Não estou. É um prazer matar vocês todas as noites. E corram o tempo que vos é concedido está para acabar.

– Que são esses seres que vos acompanha? Não tens o direito de fazer de nossa morte um espetáculo.

– Corram! – disse Óffila – Não darei a vocês chance.

Os cinco lobos brancos saíram correndo cada um para uma direção diferente. Agnus ainda em cima da árvore observava tudo. Ele tinha uma visão completa de toda a floresta.

– Subam nas árvores – ele gritou – Daqui de cima poderemos ver melhor a caçada.

De imediato todos subiram em uma árvore diferente. A visão era perfeita. Todos podiam ver Óffila caçando um por um dos lobos brancos. Haviam dois lobos ao Norte, outro ao Sul, outro ao Leste e Zev ao Oeste.

Ravena pulou de cima da árvore e rumou para o Norte. Ela empunhou seu arco e o armou com a flecha. Rurik e Sayrus fizeram o mesmo seguindo, respectivamente, para o Sul e o Leste. Os outros apenas ficaram a observar.

Ravena encurralou os dois lobos. As orelhas deles ficaram apontadas para cima e mostraram os dentes. A flecha de Ravena mirava ora um dos lobos ora o outro.

O lobo à esquerda pulou em cima de Ravena, mas esta instintivamente saiu de seu lugar antes que o lobo pudesse tê-la sob suas patas. Num gesto rápido o segundo lobo se pôs em frente a Ravena e fez menção de atacá-la. Ela apontou sua flecha e a disparou contra o crânio do animal. Mas este não caiu e continuou o ataque.

– Por que ele não caiu? – perguntou Shane de cima da árvore – Ele levou uma flechada na cabeça. Isso deveria ter sido fatal.

Ninguém respondeu nada. Todos ficaram apenas observando. Uma Naguinata surgiu do nada e acertou o lobo que estava em cima de Ravena onde deveria estar seu coração. Numa ação rápida e certeira ela lançou o lobo contra uma árvore. Blackthblood começou a escorrer e por muito pouco Ravena não teve seu corpo corroído. O segundo lobo teve as orelhas voltadas para trás e a cauda entre as pernas. Aquele era uma demonstração de medo. Talvez não fosse o medo de Ravena, mas o medo do sobrenatural que assombrava sua noite. Ele estava condenado a voltar à vida e a morrer todas as noites. Tendo seu corpo dilacerado por um de sua especie. Ravena pegou uma flecha em sua aljava e a lançou contra o lobo. Este caiu de imediato.

Ravena se levantou e voltou para junto dos outros. Ao chegar onde antes estava o corpo de Ity ela só viu ossos. Movido por alguma força extraordinária os ossos se ergueram no ar e montaram o esqueleto de Ity. A carne e o Blackthblood dos lobos mortos foram reconstruindo o corpo de Ity. Aos fim de 10 minutos ele estava em toda a sua forma.

– Olá – saudou ele – Voltei como era previsto. O Ity é um idiota. E agora está morto. Ele não devia ter se oferecido como sacrifício. Mas graças a ele agora eu sou o único a habitar este corpo. Vou guiar vocês porque assim me obrigaram a fazer. Mas ao fim dessa jornada vou estar livre. Sei que não se importam com isso, até porque, nem eu me importo.

– Podemos ir embora? – perguntou Thandera – Estou cansada desse lugar.

Os que estavam em cima das árvores pularam para o chão. Rurik e Sayrus voltaram de sua caçada. Rurik estava com um arranhão no braço esquerdo. Sayrus estava ileso. Óffila voltou para encontrá-los. Seu corpo estava machucado. A noite parecia em seu apogeu. Os lobos aos poucos voltaram caminhando para as suas posições iniciais. Embora todos houvessem sido mortos ainda andavam. Ao estarem em suas posições desapareceram. Não havia mais estátuas.

- Seus idiotas. Ao deixarem que seu Forbannede se sacrificasse permitiu que aqueles traidores se libertassem. Eu devia matá-los, mas não me permitem fazer isso.

- Maldições não devem ser quebradas, mas são – disse Sórdyrus.

- Como sabe disso? - perguntou Óffila.

Sórdyrus não respondeu. Ele seguiu pela floresta rumo ao seu destino. Os outros o acompanharam. O silêncio foi mútuo. O grupo andava sem fazer qualquer ruido. Uma ordem muda foi ouvida por todos e eles começaram a correr floresta adentro, seguia cada um para uma direção. Não se falava nada. Quando todos já estavam, completamente, fora de visão surgiu uma estrada. Todos apareceram nela ao mesmo tempo. Eles se cumprimentaram e passaram a andar lado a lado.

Ravena olhou para trás, não havia mais uma floresta. Estavam em campo aberto.

Luiz Antônio
Enviado por Luiz Antônio em 15/05/2013
Código do texto: T4292087
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