Surreal - Parte 1

Acordei com uma sensação estranha... um estremecimento passou pelo meu corpo, não estava em meu quarto, onde eu habitualmente dormia e acordava todos os dias da minha pacata vida... pelo menos até hoje. Olhei em volta, o lugar onde eu estava se parecia com o meu quarto, mas era muito mais bonito, como eu sempre sonhei que um dia seria, só que era triste, melancólico, um pouco escuro. Estava envolto em uma bruma, como fumaça de insenso, só que sem o cheiro doce, estava frio.

Eu estava anestesiada, não sentia medo nem pavor como era de se espera; tomando uma decisão desci da cama, que por sinal era altíssima, e a primeira coisa que fiz foi olhar pela janela. Com calma surpreendente descobri que lá fora era uma floresta, ou pelo menos foi como eu vi aquele monte de árvores e plantas e pedras e musgos, sem pensar mais em nada, peguei em cima de uma cadeira um penhoar, que cobria minha camisola e descia até os tornozelos, olhei de relance no espelho e o que vi fez gelar o sangue em minhas veias, eu estava com uma aparência fantasmagórica, toda de branco, no meio daquela bruma toda, o que era realçado por meus cabelos muito pretos e meus olhos igualmente pretos, que pareciam conter a escuridão do universo... Dando de ombros cheguei perto da porta e me pus a ouvir, tentando distinguir os sons que vinham do outro lado, sons como os de xícaras de porcelana, vozes abafadas, abri a porta bem devagar, olhando para um corredor que nunca tinha existido em minha pequena casa, corredor comprido e escuro, cheio de retratos que supus serem de família, fui olhando um a um, e não reconhecia ninguém... Até que cheguei em um retrato muito amarelado, parecendo muitíssimo antigo, e percebi horrorizada que eram meus pais, assim como eu me lembrava deles, como eu tinha deixado ontem antes de dormir, mas era como se eles tivessem vivido em outra época, mas adiante vi uma foto minha, igualmente antiga e amarelada, do jeitinho que eu me encontrava agora, cabelo solto, rosto muito pálido e grandes olhos negros. Não estava entendendo nada, onde eu estava? O que estava fazendo ali? E porque o meu retrato, que eu não tinha tirado, estava no corredor, que não era da minha casa, e porque parecia que o retrato fora tirado a uns 100 anos?

Continuei andando e me deparei com uma escada, fui descendo pé ante pé, sem fazer barulho, lá em baixo tudo era estranho, era e não era a minha casa, é como se eu estivesse na minha casa só que depois de uma grande reforma, eu não estava reconhecendo muitos móveis, e duvido que meus pais tivessem o gosto parecido com o de quem quer que estivesse morando lá agora, fiquei no meio de uma sala, ouvindo, esperando escutar minha mãe falando tranqüilamente com meu pai, mas não ouvi nada, nem um som, o mais completo silêncio, como se estivessem me esperando, mas quem? Ou o que? Era disso que estava começando a ficar com medo, o que estaria acontecendo comigo?

Passei os olhos pelo resto da casa que se encontrava vazia, voltei para o meu quarto e abri o armário, as roupas eram estranhas, como se fossem de outra época, peguei um vestido, o que me pareceu mais normal, de seda, vermelho escuro, quase vinho, longo, que estranhamente acentuava mais minha palidez em contraste com o negro dos cabelos e dos olhos, olhei de novo no espelho e me veio uma sensação estranha de que não era eu o reflexo do espelho, mais sim a garota do retrato que eu vira no corredor; fechei os olhos e dei um longo suspiro, calcei uma sapatilha vinho e sai do quarto, fui direto para uma porta que tinha encontrado na cozinha, abri e dei uma espiada para fora, e quase não acreditei no que vi, só mais alguns metros de chão e depois, o que me pareceu um precipício, fui andando bem devagar até a borda e admirada vi que lá em baixo tinha um mar revolto, que se chocava com umas rochas pontiagudas, e isso era tudo o que se via, só a imensidão do mar. Voltei e entrei, atravessei a casa e saí pela porta de uma sala que parecia ser a frente da casa, e o que vi me fez paralisar, uma floresta ainda virgem, com mata cerrada de todos os lados que eu olhasse, e só o que indicava que existia vida ali era um caminhosinho quase imperceptível que se embrenhava no meio da mata.

Sem outra opção, peguei na ponta da saia do vestido e saí, fui pelo caminho que tinha visto, andei com dificuldade, tirando os galhos do caminho e afastando as folhas; o interior da floresta era frio e úmido, o sol se filtrava pelas folhas e dava um aspecto rendado, lindo , de luz e sombra...

Priscila Pereira
Enviado por Priscila Pereira em 16/03/2013
Reeditado em 25/03/2016
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