Além Do Que Se Ver
Lendo as páginas da compreensão que encontrara jogadas na mesa, percebi quanta desinformação havia nas conversas que ouvia sentado nos bancos de praça, das bocas dos próximos e distantes, ou da vida que sussurra sem pensar no que pode acontecer conosco. Cada página que passava fazia surgir uma verdade de tal forma a contestar tudo aquilo que via de maneira plena e absoluta. O andar das pessoas, o voar dos pássaros, o beijo dos namorados, tudo pareceu tão simples que me perguntei se o mundo ali descrito era o mesmo que vivi durante todos esses anos. Perfazia uma pureza tão nobre e singela, tocante ao coração de quem ler e instigante ao ponto de imagens surreais planarem suavemente. Tão curioso que junto a isso luzes saíam de todos os lados esclarecendo as maiores interrogações que laçam o intelecto humano, se não bastasse uma calma fulgurante em todo o ambiente.
Ainda não havia olhado a capa de tal livro, mas nem vontade sentia afinal a paz que estabelecera em mim com todas as sensações só aumentava e tudo se tornava prazer. Enquanto, passavam várias pessoas e se impressionavam com um ambiente mágico, apesar de fechado, aberto como o céu de poucas nuvens. Foi aí que uma moça se aproximou e fez uso de palavras para perguntar-me porque estava ali há tanto tempo. Sem pensar muito, apenas de gestos usei balançando a cabeça e erguendo os braços no sentido de trazê-la até mim. Ela, sem imaginar quão belo era tudo aquilo, ignorou e com uma face arrogante continuou andando, foi então que decidi sair da sala e mostrar para todos os pensamentos e reflexões que momentos diante daquele mundo proporcionaram para mim. Fui até o outro lado de onde estava com a emoção de poder transparecer o que havia compreendido sabendo eu que causaria reações controversas. Das pessoas que tocavas e exclamavas frases, só retornavam-me a ignorância de outrem que desinteressava qualquer um, tentei ainda parar e repensar as palavras que estava usando, mas nada surtia efeito, até parecia um palhaço pintado de branco e preto desbotados sem sequer conseguir emitir som algum. Pulei de um para o outro, e nada! Expus verdades inconvenientes que aprendi a perceber durante toda a vida, mas nem isso era suficiente para conseguir a atenção daqueles tão presos por algo fúnebre.
De tanto levantar, correr e pular, cansei e devagar sentei-me na beira de um banco. Isto porque o mesmo estava cheio de gente cuja atuação principal era ignorar-me com tento e fervor. Dali, não resisti por muito tempo e pus-me a sair devagar, procurando não ser percebido pela multidão acalorada e enraizada no solo mais impuro e sujo. Foi então que noto chegar perto de uma fonte. Que linda! Possuía uma água tão clara quanto meus pensamentos ficaram após algumas páginas passadas, um líquido que só em vê-lo no ar já se sentia o atravessar por entre poros e a tranquilidade de um bebê com o respirar de uma flor. Era algo inexplicável. Ao lado, uma menina com a mesma admiração trepidou um pouco e retornou para mim a pergunta: “Também lera o que estou pensando?” Eu, curioso pelo que disse e com uma felicidade incansável em vista de não ser o único ali, voltei-me para ela e respondi ofegante: “Não só li, como senti tudo que me foi ofertado, minha percepção de tudo está palpitante, não consigo suportar a pressão do caminhar torto daqueles que vejo ao meu redor.” A partir, calmamente ela me retornou com uma resposta ainda mais subjetiva, dessa vez junto a um sorriso peculiar e, confesso, nunca antes visto: “Normal, a compreensão que agora vejo ter é um fator sublime e está bem acima de todos, pena que só nos resta contentar-se com o que sabemos e ignorarmos a possibilidade de mostrar isso, já que a ignorância plural compressa qualquer tentativa nossa.”
Em busca de entender o porquê de estar daquele jeito, decidi retornar ao lugar onde tudo havia começado. Chegando, encontrei as mesmas páginas sobre a mesa, mas agora tinha o objetivo de saber de que se tratava. Passei por várias, voltando sem pretensão, quando encontrei uma imagem. Nela, um registro panorâmico de uma rua feita com amizade, amor... Não somente com sentimentos transcritos nas pessoas, mas como blocos fundamentais que formavam o que pisávamos, onde sentávamos e até mesmo o que se usava. Difícil descrever isso, já que nossa percepção de amizade, amor, paixão não passa de algo por suprassumo abstrato e intocável, dito por muitos apenas sentidos por nossos corações. Por isso, o perdão de não saber expor da melhor maneira, sendo, pois, até para mim dificultoso discernir ao meu próprio saber. Perguntei-me baixinho se tudo que li de antemão havia mudado minha vida, indagava por que havia começado, de tanta ira, até desejei não ter visto nem lido nada, pois tudo me atormentava, não queria ficar diferente aos olhos de tantos que passaram a me ignorar. Foi quando observei fixamente e notei que a clareza de tudo era fácil de ver, mas complicado de interpretar, por isso chamei quem estava mais próximo de mim para olhá-la e quem sabe ajudar-me a desvendar aquilo. Chegando, um senhor de barba grande e cabelos grisalhos, foi de logo reparando no que tanto olhava. Não demorou, e mais se aproximavam uma mulher com cabelos longos e uma criança nos braços, um homem de farda manchada, uma moça cheia de parafernálias no pescoço, além de tintas sobre a pele, um jovem com estilo meticuloso e apologias diversas em suas vestes, outro que olhava apenas para as partes da menina que também se voltava ao relógio do outro que chegara bem vestido com toda sua vontade de ir para casa e não fazer nada. Aproximando devagar por entre todos, não evitei o sussurro comum que partia. A descrição deles era tão simples que comecei a notar quão longe segui nessa viagem. O que mais se ouvia era a de páginas com letras bem gravadas, formando frases totalmente desconexas na opinião comum, tendo no início disso tudo, uma capa rígida e firme com um simples dizer, “Aqui, o mundo contempla de cada um sua própria e fiel essência”.