PÓ E SONHO

Naquela manhã o sono era banhado por um sonho muitas vezes repetido, repetido demasiadas vezes. Sonhava que sonhava. Havia uma avenida que se prolongava até ao mar. Parecia ser o mar. Alguém corria em direcção a uma mulher excessivamente pintada. Esse alguém oferecia um anel a essa mulher e o anel rolava pelo areal e o homem, que era esse alguém, correu, correu e ao fundo desapareceu quando a areia já estava húmida pela espuma do mar. Apenas as roupas dispersas ficaram ali isoladas, uma mancha negra na areia branca, a mancha das vestes do homem, as vestes corrompidas até se esboroarem em pó. Peter – um nome possível - tinha conseguido tornar este sonho um sonho lúcido, como dizem os neurocientistas. Acordava conscientemente quando todo o cenário era pó.

in "Narrativas"