o caso do andaime
CASO DO ANDAIME
Andando pela Avenida Afonso Pena, experimento uma alegria satânica, ao olhar para o alto de um edifício e ver um grande andaime com seus trinta metros de comprimento – assim me parecia naquela altura de cem metros, talvez, logo a alegria transformou-se em desejo perverso, cruel, maravilhoso!
Ah! Como eu gostaria que aquele andaime se desprendesse de sua imponente altura e esmagasse! Os seres que transitavam na Avenida, absortos em seus sonhos, suas ambições, seus problemas... Com este desejo atroz a invadir-me, a penetrar-me, apossar-se de minha alma... adentrei-me, no misticismo, no esoterismo, no sobrenatural.
Os caros leitores já devem ter lido qualquer coisa sobre “o poder da mente”. Sim, esta era a única esperança de realização da minha vontade. Atravessei a rua em transe. Encostei num paredão frontal ao meu alvo. Eu era todo o andaime: mente, olfato, audição, enfim, cada partícula do meu ser e do não ser! Estava telepaticamente concentrado no amado andaime. Ou ele desabaria, ou minha frustração a mim.
Lá estava eu... Passou-se meia hora? Passaram-se cinco? – Não sei! Havia perdido a noção de tempo e espaço. Todo o meu espaço era ocupado pelo andaime. O tempo? infinito.
Imaginável do inimaginável ! Meu olhar fixo apenas retardava , como que sustia o andaime; bastou um ligeiro piscar de olhos e, lá veio ele, como pássaro, atingido por caçador infalível.
Ouvi gritos desesperados! Horripilantes! Terríveis. Vi corpos em estertores, agonizantes, gemidos sobre-humanos. Ah, tão cruel é o ser humano! Não senti nenhuma piedade. Apenas um misto de alegria e desprezo. Sim, minha mente estava além daquela massa estúpida!