Queda
I
Disseram-me que não colocasse os pés no abismo, mas um já pendia e os olhos fitavam o chão. A altura era sufocante e o rio não passava de uma linha indecisa – enroscava e sumia sob o verde dos pinheiros. E estes eram espigões de aço que ocupavam cada canto. E havia tantas pedras escuras asfixiadas por musgo quanto era possível haver. E a queda mataria com a certeza do Sol que rasteja pelo horizonte nas auroras, calado. E a queda seria longa. E a pedreira ria. E o rio, e o verde – o musgo ria.
II
Era um gracejo infindo, exalação de risos num eco úmido dos musgos. Algaravia que retumbava nas pedras numas zombadas gargalhadas. Eu – lânguido – que trago olhos fundos, fundos; que olho no riso e cheiro os olhares. Eu que ali caí.
III
Almíscar que desprendia das águas e se enroscava nas narinas; o doce cheiro da dor banhada. Desci os olhos, livrei-me do vale – tão prostrado estava -, abafei o riso com a realidade.