DESTINO DE UMA FLOR EM BOTÃO

Em meio a uma crise

sem saber o que fazer

decidi sair por ai

numa estrada sem destino.

No findar de uma tarde

me senti perdido

sem direção a seguir

quando ao lado da estrada

surgiu um casebre

cercado de terras

Tudo tão silencioso

que as imagens emitiam ruídos

Havia muita terra sem plantio

havia um cão magro

havia uma vaca de olhos cansados

havia uma flor em botão

havia um velho sentado a porta

Da terra sem aragem

percebia-se fertilidade

mas ausência de cuidados

nos pastos vizinhos

um mar de verde

e ali estava tudo seco e árido

como quem clama

sem lágrimas

O cão em prontidão

ao lado do dono

olhar frágil e caído

carente do afago

que não conhecia

mas permanecia fiel

como preso a uma promessa

corria em círculos

para sentir-se vivo

ou para morrer um pouco

A ruminante pastava no vazio

no canto dos olhos

um caminho avermelhado

parecia o caminho das lágrimas

uma vaca que parecia esvaziada

cansada de ser sugada

arrastava os cascos no seco

parecia estar de pé

para aleitar o bezerro

que um dia existiu

Ao lado da casa

uma roseira

apenas um botão

curvado e seco

como quem morreu

antes de nascer

antes de abrir

cumprir-se flor

cedeu ao meio

foi promessa

onde não havia crença

Quase sem ânimo

indaguei ao velho

qual motivo de tanta mazela

em meio a fartura

Disse-me ele:

“ tudo é como tem que ser”

deixou a todos

por um sonho de algo melhor

ficou só

não tinha mais forças

esperava o cair das tardes

fixava olhar no horizonte

como se pudesse

levá-lo para longe

tudo era um resto

do que poderia ter sido

Nada mais falei

não me sentia mais perdido

descobri uma única direção

À direita sigo a estrada da vida

faço retorno no Largo do amor

subindo pelo Morro da Esperança

descendo a Ladeira da Fantasia

pegando a esquerda a Rua do Desejo

Chegando a Santa Fé

Recebido por entes meus

os verei como nunca

em punho uma flor

em botão

viva e salva

pelo orvalho dos meus olhos.