UMA VACA A MENOS NO PASTO
Nequinho da Serafina até que vivia bem. Desde muito jovem se habituara à lida do campo. Com pouco mais de cinco anos de idade já ordenhava as vacas, recolhia ovos, dava milho às galinhas, colhia as frutas caídas do pé, abria e fechava a porteira para o gado passar e por aí seguia seus afazeres diários que perdurariam por toda a vida.
Na adolescência, mal despontaram as primeiras penugens de uma barba muito rala, Nequinho já ganhara o direito de ser peão e de mão cheia. Aprendera também a administrar as terras que herdara do pai que morrera muito cedo em conseqüência de doença grave.
Nó nas tripas, diziam os colonos da fazenda. Tiro do marido da amante informava o boletim policial. Lesão generalizada, provocada por instrumento perfuro contundente, atestava o laudo da necropsia.
O rapaz ficará responsável por tudo visto que não tinha irmãos e Dona Serafina, a mãe, “... era simples demais para assumir tal responsabilidade”. Dizia a viúva que se recolhera ainda mais às suas orações após a partida inesperada do marido, sobretudo naquela circunstância!
Nequinho trabalhava com afinco desde a madrugada até o anoitecer todos os dias da semana. Sua vida era o gado, a plantação, a compra e venda das mercadorias e cuidar de Dona Serafina.
Uma vez por ano, entretanto, ia para cidade participar do rodeio. Era apaixonado por montaria, cavalo, touro bravo, e pelo povaréu que abarrotava o vilarejo nessas ocasiões. Vinha gente de toda banda. Fazendeiros, cavaleiros, peões, turistas e um mulherio de cair o queixo. Gente bonita mesmo. Moças de arrepiar os peões mais destemidos. Uma delas, Joana, arrebatou o coração, a alma, o espírito e o sossego de nosso desvalido personagem.
Dona Serafina ralhou, suplicou, orou, pediu, chorou, mas quê? Em três meses o casamento estava consumado e Joana já mandava na casa. A moça era dengosa, maliciosa e a fazenda vivia agora sempre em festa. A rapaziada da vila não saia mais de lá. Até o vigário passou a visitar Dona Serafina, embora só conversasse com Joana.
Um ano e o primeiro filho nasceu. Nequinho andava jururu. Criança de olhos azuis? Quem teria “puxado”? De minha família é que não há de ser. Resmungava Serafina.
A vida embora seguisse em frente não era mais a mesma. Outros filhos nasceram. Cada qual diferente do outro. Os aborrecimentos aumentaram em muito, não pelos filhos, mas a mulher estava cada vez mais popular entre os peões, amiga inseparável dos fazendeiros da região e extremamente caridosa com o vigário.
Nequinho não se sentia mais à vontade entre os vaqueiros nos rodeios. Apesar de matuto percebia os olhares que eram dispensados a sua senhora e aqueles que eram dirigidos a sua testa. Fora isso, sempre que se aproximava de uma roda de peões, todos paravam de falar e o silêncio lhe feria como se houvesse levado uma punhalada no peito.
Dona Serafina não ia mais à missa, não que perdera a fé, pelo contrário, orava como nunca, porém se amofinava com as más línguas.
Um jeito tinha de ser dado. Nequinho mandou chamar Zelão das Barrancas, um caboclo de má fama que morava lá pelas ribanceiras do Riachão. O desafortunado tinha prestado alguns serviços menos importante na fazenda, mas não se fixara por causa da cachaça e das brigas que teimava em estar sempre metido.
Zelão, por incrível que pareça, nesse dia não estava bêbado, ouviu atentamente as lamúrias do patrão e prometeu que por uma vaca daria solução as aflições do amigo. E nisso empenhava a palavra.
- Qual? Zelão não tinha jeito só dizia besteira. Onde já se viu uma vaca... - O assunto se encerrou ali.
Na manhã de domingo Joana chegou à fazenda junto com o sol. Passara a noite na quermesse da vila. Estava visivelmente embriagada e entre gritos e gargalhadas proclamava aos quatro ventos que com certeza nessa noite embuchara de novo. E desta vez o bichinho vai ser sarara.
Nequinho arroxeou de ódio, quase espumou, mas não disse absolutamente nada. Saiu em direção ao Riachão e só retornou na boca da noite. Dona Serafina trancou a porta do quarto e de lá só saiu no dia seguinte atraída pelo alvoroço que vinha do terreiro. Joana sumira.
Foram organizadas buscas, a polícia foi chamada, anunciaram na igreja, os peões se embrenharam nas brotas no sopé da serra e nada. Até Zelão ajudou, vasculhando toda banda do Riachão. A busca se estendeu, em vão por semanas. Até hoje na delegacia tem retrato da moça com a tarja de “desaparecida”.
Dona Serafina está mais tagarela e voltou a frequentar as missas e as novenas. O vigário sabe lá Deus por que anda meio amuado. Nequinho remoçou e está pensando em participar do rodeio no próximo ano...
Lá no vilarejo, o que mais intriga a todos é o sumiço de Mimosa, a melhor vaca da fazenda de Dona Serafina.
Um verdadeiro mistério!
PS - Há quem diga, que muito tempo depois, as vacas foram avistadas lá pelas bandas do sítio do autor.
NA - Pura fofoca... Imagina, eu?... Quem me dera!
Nequinho da Serafina até que vivia bem. Desde muito jovem se habituara à lida do campo. Com pouco mais de cinco anos de idade já ordenhava as vacas, recolhia ovos, dava milho às galinhas, colhia as frutas caídas do pé, abria e fechava a porteira para o gado passar e por aí seguia seus afazeres diários que perdurariam por toda a vida.
Na adolescência, mal despontaram as primeiras penugens de uma barba muito rala, Nequinho já ganhara o direito de ser peão e de mão cheia. Aprendera também a administrar as terras que herdara do pai que morrera muito cedo em conseqüência de doença grave.
Nó nas tripas, diziam os colonos da fazenda. Tiro do marido da amante informava o boletim policial. Lesão generalizada, provocada por instrumento perfuro contundente, atestava o laudo da necropsia.
O rapaz ficará responsável por tudo visto que não tinha irmãos e Dona Serafina, a mãe, “... era simples demais para assumir tal responsabilidade”. Dizia a viúva que se recolhera ainda mais às suas orações após a partida inesperada do marido, sobretudo naquela circunstância!
Nequinho trabalhava com afinco desde a madrugada até o anoitecer todos os dias da semana. Sua vida era o gado, a plantação, a compra e venda das mercadorias e cuidar de Dona Serafina.
Uma vez por ano, entretanto, ia para cidade participar do rodeio. Era apaixonado por montaria, cavalo, touro bravo, e pelo povaréu que abarrotava o vilarejo nessas ocasiões. Vinha gente de toda banda. Fazendeiros, cavaleiros, peões, turistas e um mulherio de cair o queixo. Gente bonita mesmo. Moças de arrepiar os peões mais destemidos. Uma delas, Joana, arrebatou o coração, a alma, o espírito e o sossego de nosso desvalido personagem.
Dona Serafina ralhou, suplicou, orou, pediu, chorou, mas quê? Em três meses o casamento estava consumado e Joana já mandava na casa. A moça era dengosa, maliciosa e a fazenda vivia agora sempre em festa. A rapaziada da vila não saia mais de lá. Até o vigário passou a visitar Dona Serafina, embora só conversasse com Joana.
Um ano e o primeiro filho nasceu. Nequinho andava jururu. Criança de olhos azuis? Quem teria “puxado”? De minha família é que não há de ser. Resmungava Serafina.
A vida embora seguisse em frente não era mais a mesma. Outros filhos nasceram. Cada qual diferente do outro. Os aborrecimentos aumentaram em muito, não pelos filhos, mas a mulher estava cada vez mais popular entre os peões, amiga inseparável dos fazendeiros da região e extremamente caridosa com o vigário.
Nequinho não se sentia mais à vontade entre os vaqueiros nos rodeios. Apesar de matuto percebia os olhares que eram dispensados a sua senhora e aqueles que eram dirigidos a sua testa. Fora isso, sempre que se aproximava de uma roda de peões, todos paravam de falar e o silêncio lhe feria como se houvesse levado uma punhalada no peito.
Dona Serafina não ia mais à missa, não que perdera a fé, pelo contrário, orava como nunca, porém se amofinava com as más línguas.
Um jeito tinha de ser dado. Nequinho mandou chamar Zelão das Barrancas, um caboclo de má fama que morava lá pelas ribanceiras do Riachão. O desafortunado tinha prestado alguns serviços menos importante na fazenda, mas não se fixara por causa da cachaça e das brigas que teimava em estar sempre metido.
Zelão, por incrível que pareça, nesse dia não estava bêbado, ouviu atentamente as lamúrias do patrão e prometeu que por uma vaca daria solução as aflições do amigo. E nisso empenhava a palavra.
- Qual? Zelão não tinha jeito só dizia besteira. Onde já se viu uma vaca... - O assunto se encerrou ali.
Na manhã de domingo Joana chegou à fazenda junto com o sol. Passara a noite na quermesse da vila. Estava visivelmente embriagada e entre gritos e gargalhadas proclamava aos quatro ventos que com certeza nessa noite embuchara de novo. E desta vez o bichinho vai ser sarara.
Nequinho arroxeou de ódio, quase espumou, mas não disse absolutamente nada. Saiu em direção ao Riachão e só retornou na boca da noite. Dona Serafina trancou a porta do quarto e de lá só saiu no dia seguinte atraída pelo alvoroço que vinha do terreiro. Joana sumira.
Foram organizadas buscas, a polícia foi chamada, anunciaram na igreja, os peões se embrenharam nas brotas no sopé da serra e nada. Até Zelão ajudou, vasculhando toda banda do Riachão. A busca se estendeu, em vão por semanas. Até hoje na delegacia tem retrato da moça com a tarja de “desaparecida”.
Dona Serafina está mais tagarela e voltou a frequentar as missas e as novenas. O vigário sabe lá Deus por que anda meio amuado. Nequinho remoçou e está pensando em participar do rodeio no próximo ano...
Lá no vilarejo, o que mais intriga a todos é o sumiço de Mimosa, a melhor vaca da fazenda de Dona Serafina.
Um verdadeiro mistério!
PS - Há quem diga, que muito tempo depois, as vacas foram avistadas lá pelas bandas do sítio do autor.
NA - Pura fofoca... Imagina, eu?... Quem me dera!