A LUZ QUE NOS PROTEGE

Helena é meu nome.

Já fui rainha, faz muito, muito tempo.

Sou da Babilônia.

Conhecida como "a rainha má".

Durante meu reinado, muitas cabeças foram cortadas. Sacrifiquei minha própria filha e dei seu coração ao rei de Israel visando apaziguar conflitos. Em busca e em nome do poder cometi muitas atrocidades. Condenei sem julgamento, todos os meus apositores. Comandei ao meu exército que atacasse e destruísse os turcos. Um dia, seguia em minha carrugem e fui atacada, estuprada e degolada. E degolados foram, todos os demais que estavam comigo. Vi que a carruagem partiu deixando-me para traz. Gritei por André, meu cocheiro, mas ele me olhou, ajeitou os areios e deu ordem para que os cavalos partissem. Então a carruagem desapareceu. Vi-me só na estrada.

Uma floresta me esperava.

Naquele dia, usava um longo vestido e levava um turbante na cabeça. Inicieu uma caminhada pela floresta, algo que não estava acostumada a fazer, tampouco estava acostumada a andar só, a ter sede, a ter fome e mais ainda, nunca na vida havia sentido medo.

Minha garganta ardia e percebi que havia sangue no meu vestido. Numa rápida averiguação verifiquei que minha cerolua havia sido rasgada e eu estava sangrando. Desabei chorrando e recordei o que havia acontecido. De ímpeto levei a mão à garganta e a notei molhada. Olhei meus dedos nervosamente. Estavam cheios de sangue. Corrri feito uma louca para o interior da floresta, gritando e chorrando, mas não houve resposta.

Eu estava só e a noite caia.

Muito andei entre as árvores.

Muito medo tive e nenhuma compreensão do que estava acontecendo. Pensei que meus inimigos haviam tomado o poder e arrebatado-me do meu reino com a ajuda de traidores.

Pensei que após isso, eles teriam me deixado ali para morrer, mas eu havia sobrevivido.

Perdi a noção do tempo. Andava em círculos e não mais achei o caminho da estrada. Minha boca estava muito seca, pois há tempo eu não ingeria água, minhas unhas sujas e quebradas, meu lindo turbante se fora, meu vestido rasgara e meus pés estavam em carne viva de tanto andar. Achava estranho não adormecer, mas o dia transcorria e a noite vinha com seus sons. Tive muito medo dos animais, mas não temia pessoas.

Só uma infinita solidão me acompanhava.

Não sabia há quanto tempo estava ali. Sentia fome, sede e frio. Certo dia, sentei-me ao pé de uma árvore e enxerguei ao longe algo que parecia um lago e na beirada, de costas par mim, uma moça sentada. Seus cabelos longos atingiam a cintura. Usava uma túnica branca, com uma faixa dourada na cintura. Eu me sentia tão cansada que pensei: - Não vou até lá, quero apenas ficar aqui e adormecer. Adormecer para sempre. Então a moça virou-se e deu-me um sorisso. Meus olhos encheram-se de lágrimas, levantei-me, dei um grito:

- Talila.

Era minha filha. De braços abertos corri em sua direção, gritando seu nome, mas o chão ía afundando sob meus pés e eu não avançava. Vi Talila levantar-se, olhar-me novamente sorrindo e andar em direção a água límpida, até sumir.

A floresta num só minuto desapareceu, as árvores, o verde, os animais, os pássaros, o lago, tudo ficou cinza e desolado. A mata tornou-se trevas e o chão onde eu pisava ficou movediço. O dia passou a não mais existir, somente a noite e com ela o medo e o desespero, que me acompanharam por mais de cem anos. Vi minhas carnes minguarem e a ferida da minha garganta apodrecer, a ponto de ser insuportável o odor. Vi pessoas passando por mim em estado tão deplorável como o meu, mas não havia comunicação. Pensei que havia sido jogada num depósito de loucos.

Já estava resignada e esperava apenas a morte. Até que um dia vi chegar uma carruagem.

O cocheiro desceu, estendeu-me a mão e eu vi luz nos seus olhos. Então eu entendi e implorei: - Tem misericórdia de mim senhor.

Neste dia e fui resgatada e pela misericórida de Deus socorrida.

Minha filha esperava no hospital onde fui tratada, durante um longo tempo.

Hoje, eu apenas acompanho o tratamento dos que chegam no hospital, não estou ainda, autorizada a voltar para redimir meus erros.

Rara orquidia negra
Enviado por Rara orquidia negra em 18/08/2011
Reeditado em 19/08/2011
Código do texto: T3167627
Copyright © 2011. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.