O velho e as maçãs

Era um dia de sol

desses que não se lembra nada

Apenas o clima

e as brincadeiras perdidas

na memória.

Me afastei um pouco de casa

com seis,talvez sete anos

Nunca ousei ir longe

o porque não sei bem.

Talvez medo,

ou a falta de alguns amigos

para compartilhar tal aventura.

Mas ... Era dia de sol

lembro bem...

Um desses verões infantis

tão belo e trágico,

Como esse inverno infeliz.

A última casa da rua,

em ruínas e mal assombrada.

Assim diziam meus irmãos

nunca vá lá,é perigoso e estranho

Você não iria gostar,

Mas o portão estava aberto,

e o dia tão claro;

Não resisti,entrei,fui passear no jardim.

Cheio de folhas secas e galhos caídos por todos os lados...

No centro uma grande árvore,

uma figueira como a do meu jardim antiga e imensa

Suas raízes se estendiam ao longe,

grossas,grotescas.

Havia também cactus

espinhos longos,afiados como garras,pontudos feito agulhas

Essa imagem desolada cercava toda casa e como ela

era só desalinho.

Nos fundos não vivia quase nada

arbustos secos,canteiros invadidos por ervas daninhas

Havia uma árvore,

um pouco baixa eu diria,

Naqueles dias grande demais.

Dava trabalho reconhecer

não fosse uma tabuleta descascada eu jamais iria saber

Macieira

-mas estava - murcha,seca e enrugada.

Soprou um vento frio

olhei pro céu,sol,tinindo e cegando

Ainda assim senti um arrepio

De repente ,uma sombra se alongou sobre mim

-Infame,ladrãozinho atrevido,o que voce está fazendo no meu jardim?

Imagine o susto,demorei a me recuperar,

eu apenas o olhava

cheio de admiração e pavor.

Era um velho,um velho que gritava.

Como era feio,sujo e desgrenhado

pele dura e trincada

Cabelo cinza,roupa esfarrapada

Um olhar assustador,parecia um abutre irritado

me levantou e me sacudiu,

Aquele velho malvado.

- Responda!

-Perdeu a voz? O gato comeu sua língua?

Foi um balbucio,um fiapo de voz...

Não agora me solte por favor.

- Só quando me disser o que veio fazer aqui.

O portão estava aberto

não tinha ninguém,

fiquei curioso e entrei.

-Menino atrevido,já ouviu falar que a curiosidade matou o gato?

Apesar do olhar feroz,já tinha me largado

correr eu não podia,

estava mesmo enrascado.

Ele olhou o meu rosto,tocou meus cabelos

suas mãos eram duras,encrespadas

Unhas grandes e sujas

e disse:

- Menino curioso,

nenhum mal vou lhe fazer,me desafiou entrando no meu jardim

sem convidado ser.

-Menino bonito,um presente eu vou lhe dar,uma maçã,uma maçã para voce saborear.

Estendi a mão,e apanhei a maçã

era grande e murcha,cheia de fungos

Apodrecida,

não cheirava mal,mas comida,não seria.

Recuei um passo,o velho dois

-pode ir- falou depois.

Com as pernas fracas fui andando,mas próximo do portão

juntei forças e o resto de coragem e corri,

corri como nunca.

Sentia o vento nos cabelos,e a necessidade de fugir dali,

fui o mais longe que consegui,

acabei chegando em casa.

Sem folego e vermelho

minha mãe me amparou

Seu abraço seguro,me consolou,

me acalmei.

E a maçã,

aos seus pés deixei cair.

-Onde voce conseguiu isso?

Foi o velho que me deu.

-Que velho meu amor?

o velho da casa mal assombrada lá longe.

-Isso não existe meu filho,voce deve ter achado essa maçã velha por aí e sua imaginação o deixa ainda mais inocente.

Mas mamãe...

-Nada de mamãe,já para o banho e de aqui essa maçã,tenho destino certo pra ela.

Saí andando desconsolado,era um presente,um presente que o velho tinha me dado. O corredor parecia mais longo,ou eu estava cansado?

Tomei banho,jantei

mamãe leu histórias,eu dormi.

E sonhei com o velho perguntando, se a maçã eu já comi.

Ainda vi o velho algumas vezes,sempre ganhava uma maçã,

e mamãe sempre jogava fora.

A última vez que fui ao jardim tive um susto ainda maior.

Não havia nada,nem casa

nem árvores

Era um terreno plano e gramado,coberto por cruzes,estátuas e lápides.

Meus pés estavam sobre uma.

Gennaro Navarro

*1816 +1910

e acima da inscrição uma foto. Era o velho.

Caí de joelhos espantado.

E quando olhei alguém sorria e uma maçã já tinha ao meu lado.