O apanhador de sonhos

Depois que os sonhos acabam, depois que você acorda e troca um mundo

de loucura e glória pelo trabalho diário, maçante e mundano, iluminado pelo dia,

pelas ruínas das suas fantasias abandonadas, vem o varredor de sonhos.

Quem sabe o que era quando estava vivo? Ou se, a propósito, já esteve

vivo alguma vez? Certamente, ele não responderá suas perguntas. O varredor fala

pouco, com sua voz áspera e lúgubre, e, quando fala, é quase sempre sobre o

tempo e sobre as perspectivas, vitórias e derrotas de certos times esportivos. Ele

despreza todo mundo exceto a si próprio.

Assim que você acorda, ele se aproxima e varre reinos e castelos, anjos e

corujas, montanhas e oceanos. Varre a lascívia, o amor e os amantes, os sábios

que não são borboletas, as flores de carne, o galope dos gamos e o naufrágio do

Lusitânia. Ele varre tudo deixado para trás nos seus sonhos, a vida que você

vestiu, os olhos pelos quais viu, o papel do exame que nunca foi capaz de

encontrar. Um a um, varre-os para longe; a mulher de dentes afiados que os

afunda no seu rosto; as freiras na floresta; o braço morto que fendeu pela tépida

água do banho; os vermes escarlates que rastejavam no seu peito quando você

abriu a camisa.

Ele varrerá tudo — tudo o que você deixou para trás quando acordou. E,

então, queimará o que acumulou, deixando o palco limpo para os seus próximos

sonhos.

Trate-o bem, se você o vir. Seja educado. Não lhe faça perguntas.

Aplauda as vitórias dos seus times, compadeça-se pelas suas derrotas, concorde

com ele sobre o tempo. Dê-lhe o respeito que o varredor acha que lhe é devido.

Pois há pessoas que ele, o varredor de sonhos, com seus cigarros

enrolados à mão e sua tatuagem de dragão, não visita mais.

Você já as viu. Elas têm bocas crispadas e olhos que fitam enquanto

balbuciam, choramingam e se lamuriam. Algumas andam pela cidade vestindo

molambos, seus pertences debaixo dos braços. Outras estão trancadas na

escuridão, em lugares onde não podem causar dano a si mesmos nem aos outros.

Labelle
Enviado por Labelle em 06/04/2011
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