O balanço das ondas

O balanço das ondas

j f da costa filho

O barco dançava, e nós dançávamos com ele. Havíamos velejado a noite toda e nenhuma mostra de terra – praia ou elevado – nos havia chegado à visão. Eu, eleito timoneiro, comecei a meter na cabeça volumosas preocupações. Tantas que se escapavam pelos olhos e ouvidos, formando luminoso globo que ia e voltava pelos redores das águas.

Manhãzinha, o gajeiro esgoelou-se: “Vejo terra... teerra!”

Apontei a proa na direção indicada. Pois não é que lá chegamos à paz e salvamento! Apenas umas tantas serpentes marinhas tentaram abraçar o barco. Mas nós corremos com elas à custa de muxicões na pele escorregadia.

Descemos a seguir em terra firme; montamos uma vera cruz com remos e ramos, em cuja sombra frei Henrique proferiu a terceira missa do dia. Tomamos posse da gleba em nome de uma confraria imaginada. E na carta de bordo tudo se registrou para conhecimento dali e d’alhures, do agora e do vindouro.

Então, Cabral bateu-me na cabeça com seu cajado encastoado de prata e intimou: “Acorda e vamos que el-Rei nos espera...”

j f da costa filho
Enviado por j f da costa filho em 07/12/2010
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