Apocalipse
O céu coberto de nuvens negras faz anoitecer as quatro de uma tarde de primavera como um anúncio de que o pior está por vir.
Poucos corajosos nas ruas e muitos curiosos debruçados em janelas com a falsa e impressão de estarem protegidos em seus lares. O silêncio só não é absoluto por causa dos aparelhos de TV e rádio ligados em todo lugar e transmitindo as notícias do que está acontecendo no mundo todo em tempo real.
De repente um vento forte surpreende a todos. É um helicóptero! Na realidade, milhares de helicópteros carregando baldes gigantescos de água por locais onde os caminhões-pipa não conseguem chegar para molhar tudo. As pessoas, preocupadas e desesperadas, tentam ajudar jogando água pela janela. Até as crianças colaboram com suas pistolas d’água sem nem mesmo saber o motivo de tanta agitação.
Ruas molhadas... Expectativa... Inquietação... Olhando para o alto, é possível ver pequenos pontos de luz caindo do céu,... Começa tímido e logo se torna uma chuva torrencial de bolas de fogo!? Não! São estacas de madeira flamejante que ferem as poucas pessoas pelas ruas, que apesar dos arranhões e galos nas cabeças, respiram aliviadas ao perceber que o fogo não está se espelhando graças à água jogada anteriormente.
Uma notícia urgente chama a atenção de todos: uma gravação de áudio de origem desconhecida traz a voz de Fernando Pessoa. Sim, o poeta dos heterônimos! Na gravação ele sugere que todos olhem para o céu para contemplar sua nova cor, o vermelho sangue. Um sujeito sai na rua, olha para cima e revolta-se ao deparar-se com um vermelho clarinho, fraco, quase rosa e grita: “Pô, o Da Vinci não tá aí no céu também? Manda ele pintar isso de vermelho sangue de verdade!”
A voz do repórter na TV arrebata, mais uma vez, a atenção da população aflita: “Aos que pensavam que era coisa de criança, agora darão mais atenção a elas.”
De um clarão forte como um relâmpago, surgem bruxas. Bruxas com verrugas no nariz e vassouras voadoras como as de contos de fada... BRUXAS!
Rapidamente as pessoas fecham cortinas e persianas entoando um mantra que teoricamente impede a entrada das bruxas por tempo suficiente para que alguém faça uma mistura bizarra de vinagre e álcool e jogue no parapeito das janelas. "-- Isso é um repelente de bruxa?” – indaga uma menininha quase aos prantos. "-- Não! Faz melhor!” – alguém responde.
Nesse momento a cortina se abre permitindo a entrada de uma das horrendas bruxas que se torna pó instantaneamente.
Aproximo-me de uma janela, vejo centenas e mais centenas de bruxas voando em vassouras, as ruas cobertas de água quase como numa enchente, pessoas correndo, crianças berrando e então exclamo: “-- Hoje não é dia 21 de dezembro de 2012... Os Maias vão ficar decepcionados!”
Acordei!