O Misterioso Dia dos Pais

Mike acordou num quarto branco. Era branco mesmo, e muito iluminado. Os raios do sol, os poucos raios que passavam dentre a persiana faziam desenhos esmaecidos na parede do lugar.

Com a vista ainda turva devido ao sono que ainda sentia, observou o quarto. Era um quarto comum, com uma televisão prateada presa a parede, uma pequena geladeira bem debaixo dela, e alguns porta-retratos sobre uma cômoda também prateada. Diferente do que se recordava.

Tentou mexer os pés e, para sua surpresa conseguiu movê-los. Sentou-se na cama e pode observar melhor o local aonde se encontrava. Aos poucos foi se lembrando de como fora parar ali. Lembrou-se de seu primo John lhe dizendo como se comportar e sobre o que não poderia falar após a experiência que iria passar. De inicio ele ficou receoso.quase chegou a desistir, mas precisava fazer aquilo. Precisa fazer pelo menos uma vez e assim, poder descansar em paz. Poder seguir sua vida tranquilamente.

Nesse momento, uma enfermeira entrou no quarto com uma prancheta em mãos. Se aproximou de Mike e sorriu. Parecia aliviada de vê-lo acordado e sentado. Retirou uma pequena lanterna do bolso de seu jaleco branco e iluminou os olhos dele. Fez uma expressão com os olhos como se estivesse satisfeita com o que via. Pediu para que Mike abrisse a boca. Ele o fez e a enfermeira a iluminou com a lanterna. Fez a mesma expressão e guardou a pequena lanterna.

-E aí? Como foi? – perguntou ela enquanto anotava algo na prancheta.

Incrivelmente surpreso, Mike tentou buscar na sua memória ao que realmente ela se referia. Não lembrava de ter feito nada demais. Sabia que havia entrado no hospital às onze da noite de dois anteriores, e que, só acordara ali, dois dias depois pelos seus cálculos.

-Não se lembra de nada né?... Normal... Isso sempre acontece. Não há motivo para preocupação, Mike.

Seus olhos se voltaram para o interior de sua mente. Queria se lembrar. Mas não conseguia. Na verdade, só se lembrava porque se internara, mas não se lembrava do que havia acontecido enquanto estivera ali. Só conseguia no máximo, se lembrar de seu primo falando que ele não poderia contar. Ok, ele não podia contar... Mas exatamente o quê?

Mike saiu da clínica e foi direto para casa. Precisava ver seu pai.na verdade, aproveitar que ele o visitava, pois era algo que não acontecia constantemente. Sempre tivera uma enorme admiração por ele. Achava seu pai o homem mais inteligente do mundo, uma verdadeira enciclopédia ambulante. Ficava abismado ao notar que, qualquer que fosse a pergunta que o fizesse, o cara sabia responder. Chegou certa vez a até questionar a veracidade das respostas, mas ao entrar no Google e pesquisar algumas das suas respostas, todas foram confirmadas, e sua admiração só aumentou.

Mike tinha vinte e dois anos, e desde os dezoito, estranhamente, perdera um pouco da... Como se pode dizer?... Perdera um pouco da intimidade com ele. Não brincavam mais, não conversavam mais. E para se ter uma idéia, nem para fazer as tão constantes perguntas Mike tinha mais abertura para fazer. Parecia que com o tempo, conforme crescera, se pai deixara de ser seu amigo, e passara a ser só o cara que o colocara no mundo. Isso o entristecia. Isso o deixava chateado, pois ele sempre fora seu herói.

Desde que seu pai e sua mãe se separaram eles viviam assim. Afastados, só se cumprimentando, apertos de mãos e conversas superficiais sobre o tempo. E Mike queria mudar isso. Queria ter outra chance, e aproveitaria esse dia para mudar as coisas.

Ao chegar em casa, lá estava ele, sentado no sofá lendo seus jornais. Não esquecia daquela mania particularmente nerd que seu pai tinha de comprar três jornais diferentes e lê-los quase que simultaneamente. Queria ser assim. Queria também ler com tanto ardor. Ler dois, três livros ao mesmo tempo. Queria amadurecer como seu velho.

Aproximou-se do sofá sorrindo e emocionado. Seu pai ergueu os olhos e se surpreendeu com seu filho chorando. Colocou o jornal ao seu lado e levantou-se.

-O que houve,filho? Você está chorando?- perguntou mantendo uma certa distância do filho. Coisa que, há alguns anos, seria substituído por um caloroso abraço e palavras de consolação.

-Nada pai. É que estou me sentindo mal! – respondeu sentando-se no sofá.

A mãe de Mike entrou na sala carregando uma bandeja com salgadinhos variados. Colocou-a sobre a mesa de centro e voltou para a cozinha sem falar nada.

Mike olhava para seu pai como se nunca o tivesse visto antes, ou como se não o visse há anos. Queria abraçá-lo mas estava travado. Maldita falta de intimidade! Como fora deixar isso acontecer? Como pode deixar que antes dois amigos se tornassem apenas colegas.

-Feliz dia dos pais!- disse Mike quase que num sussurro.

-Obrigado, filho. E para onde vamos? Sua mãe disse que hoje você queria sair?

-É,pensei em fazer algo que não fazíamos há anos. Sei lá..caminhar por aí!

-Boa, Mike! Podíamos ir até o Central Park, tem tempo que não vamos lá.

Mike sorriu. Realmente fazia tempo que não passeavam pelo Central Park. Lembrou-se do dia em que, por distração sua, se perdera dos pais e andara pelo parque sozinho. Se viu só num mundo enorme, cercado de árvores. E quando ia chorar, surgiu seu pai como um super-herói. Nunca se esquecera desse dia. E ali, sua admiração só crescera.

Caminhar pelo Central Park seria a oportunidade de reviver os melhores momentos de sua infância, e as melhores horas ao lado de seu pai. Com ele conhecera metade dos Estados Unidos. Com ele conhecera o Texas, o Grand Cânion, a Estátua da Liberdade... E sempre com detalhes. Sempre com a companhia de seu guia turístico favorito.

Comeram os salgadinhos e saíram juntos. A mãe de Mike não falava com seu ex-marido. Ela tinha motivos, e não era culpa dele. Na verdade se sentia envergonhada. Fora pega o traindo em flagrante. Desde então, não o dirigia a palavra, e sabia que muito do afastamento do pai e filho, era culpa dela. Seu ex-marido não suportara saber da traição, e nunca tivera coragem de explicar ao filho. Embora Mike achasse que fora ele que se afastara do pai, a mesma coisa acontecia do outro lado.

Os dois entraram no carro calados. Mike queria falar mais, queria abraçá-lo. Sentia algo estranho. Sentia que devia aproveitar aquele momento. Relembrar os velhos tempos, contar as novidades, falar sobre suas namoradas. Não se sentia mais a vontade para comentar certas coisas com ele, a distância era grande entre os dois.

-Pai... – começou Mike.

-Oi, filho. Fala...

-Por que a gente não conversa mais?

A fisionomia de seu pai mudou nesse momento. Parecia que temia que essa conversa acontecesse, e que, finalmente o momento havia chegado.

-Mas a gente conversa, Mike...- Desconversou.

-Não pai, não como antes. Não sobre tudo. Não sobre nós dois. Não sobre o que tenho feito. A gente tá distante tem anos.

-Filho, a gente não se vê mais constantemente. É difícil, a gente acaba perdendo a intimidade. É assim com tudo na vida. Quando não praticamos, a gente acaba se desacostumando.

-Não pai! A gente não podia deixar acontecer com a gente. A relação de pai e filhos é igual a andar de bicicleta. A gente nunca desaprende, nunca desacostuma!.. Mas eu sei que a culpa é minha.

-Não fale besteira,Mike!

-É sim pai. Eu que me afastei. Eu que parei de ir te visitar aos finais de semana. Eu que troquei nossos momentos juntos por momentos com amigos, com namoradas.

-Você cresceu, cara! Criei você para o mundo, e você está se saindo muito bem. Estou orgulhoso de você.

-Queria voltar e poder mudar tudo. Queria ser um bom filho.- Aqui Mike chorou.

O carro estacionou.

-Filho, desde que eu e sua mãe nos separamos, a nossa relação ficou abalada. A gente perdeu o contato e logo em uma fase em que você iria começar a prezar pela sua liberdade. Não é culpa sua. É a ordem da vida!em momento algum eu fiquei triste com você! Em momento algum me senti abandonado por você. Sempre me senti, e me sinto orgulhoso de você! Não se culpe! Eu te amo! E esse é um dos melhores dia dos pais que vivi! E se eu morresse hoje, morreria orgulhoso pois você é meu maior orgulho nessa vida.

Os dois se abraçaram e choraram. Mike estava aliviado. Muito aliviado.

-Pai, eu nunca deixei de me sentir culpado. Sempre achei que o havia abandonado. Mas sempre quis ser como você. Quero envelhecer como o senhor. Quero ter a sua inteligência. Quero saber um pouco de tudo...

-Não sou inteligente, cara! Só leio muito. Você já é inteligente, maduro...

Abraçaram-se de novo. Mike estava feliz,e triste, pois sabia que logo aquilo ali acabaria. Que aquele momento seria uma dos últimos com seu pai. Aproveitara o dia no Central Park como nenhum outro. Conversaram sobre tudo. Não só sobre detalhes históricos mais sobre as vidas de ambos. Sobre detalhes que não foram divulgados, e fora um dia maravilhoso.

Já anoitecendo, Mike se despediu de seu pai. Sabia que não o veria novamente.sabia que estava ali graças a uma coisa que ele antes não acreditava. Coisa que seu primo o apresentara e que vira nela a oportunidade de mudar algo no passado sem alterar seu presente.

Há alguns dias, Mike se lembrara do último dia dos pais com seu pai. Na verdade, esse dia não acontecera. Em cima da hora, Mike desmarcara o passeio ao Central Park.queria poder sair com Susan e aproveitar que a menina mais popular da escola o convidara para sair. Seu pai entendera o cancelamento, e por mais que negasse, ficou triste. Mas sabia que seu filho precisava daquele espaço, e não insistira.

Dois dia depois, Mike recebera um telefonema dizendo que seu pai havia falecido durante a madrugada, devido a um ataque cardíaco fulminante. Mike associou que a culpa era sua. Que ter faltado ao dia dos pai havia deixado seu velho tão tirste, que seu coração não agüentou. Desde então, vivia triste e pedindo uma chance de falar tudo que queria ter falado. Como se arrependia de tê-lo deixado de lado tantas vezes por motivos fúteis.

E foi então que seu primo apareceu e o apresentou a sua clínica de medicina esotérica.

Mike acordou num quarto branco. Era branco mesmo, e muito iluminado. Os raios do sol, os poucos raios que passavam dentre a persiana faziam desenhos esmaecidos na parede do quarto.

Com a vista ainda turva devido ao sono que ainda sentia, observou o quarto. Era um quarto comum, com uma televisão prateada presa a parede, uma pequena geladeira bem debaixo dela, e alguns porta-retratos sobre uma cômoda também prateada.

Tentou mexer os pés e, para sua surpresa conseguiu movê-los. Sentou-se na cama e pode observar melhor o local aonde se encontrava. Aos poucos foi se lembrando de como fora parar ali. Lembrou-se de seu primo John lhe dizendo como se comportar e sobre o que não poderia falar após a experiência que iria passar. De inicio ele ficou receoso.quase chegou a desistir, mas precisava fazer aquilo. Precisa fazer pelo menos uma vez e assim, poder descansar em paz. Poder seguir sua vida tranquilamente.

Nesse momento, uma enfermeira entrou no quarto com uma prancheta em mãos. Se aproximou de Mike e sorriu. Parecia aliviada de vê-lo acordado e sentado. Retirou uma pequena lanterna do bolso de seu jaleco branco e iluminou os olhos dele. Fez uma expressão com os olhos como se estivesse satisfeita com o que via. Pediu para que Mike abrisse a boca. Ele o fez e a enfermeira a iluminou com a lanterna. Fez a mesma expressão e guardou a pequena lanterna.

-E aí? Como foi? – perguntou ela enquanto anotava algo na prancheta.

Incrivelmente surpreso, Mike tentou buscar na sua memória ao que realmente ela se referia. Não lembrava de ter feito nada demais. Sabia que havia entrado no hospital às onze da noite de dois anteriores, e que, só acordara ali, dois dias depois pelos seus cálculos.

-Não se lembra de nada né?... Normal... Isso sempre acontece. Não há motivo para preocupação, Mike.

-Não me lembro realmente...

-Olha, você se internou na clínica para um processo de regressão física. Nós conseguimos te transportar até seu dia dos pais. E assim, você pode falar com seu pai antes que ele falecesse!

-Nossa! Então eu estive com meu pai... Antes de ele morrer? E não fiz nada para mudar isso?

-Mike, a regra é que você não altere o passado! E de fato, você não o alterou. Quer dizer, você tivera o encontro que não teve com seu pai. O tal dia dos pais que não aconteceu. Mas seu pai, ele faleceu do mesmo jeito. O que mostra que você não teve culpa pelo seu enfarte!

-Mas eu nunca irei lembrar? Como vou saber se foi um dia bacana? Se ele foi um encontro como os antigos?

-Mike, pela reação de suas ondas cerebrais, você estava muito feliz. E seu primo, que não foi muito a favor dessa sua experiência no início, disse que você se tornaria um novo rapaz. Mas por favor, não comente essa experiência com ninguém ao sair daqui. Tanto que te demos dois dias para pensar. Você durante sua “regressão”, em algum momento você se deu conta de que aquilo era uma segunda chance...mesmo que breve!

Mike chorou ao olhar para o lado e ver uma foto sua com seu pai, no Central Park. Os dois sorrindo sobre a ponte. E Mike o abraçando. Era um dos momentos que não esqueceria, e que sempre lembraria mesmo sem lembrar.

A enfermeira se aproximou e o ajudou a ficar de pé. Ela não queria demonstrar, mas estava feliz. Estava emocionada, sabia do amor daquele jovem pelo falecido pai. E, assim como ele, ela também tivera problemas, e que por sorte, conseguira modificar ao seu tempo. Os dois dariam uma nova visão sobre o mundo. Sobre os momentos insubstituíveis que a vida nos dá, e que, quando não os aproveitamos, podemos perdê-los de vez.

Mike saiu da clínica sem se lembrar do dia no Central Park, mas tendo certeza que nesse dia dos pais, seu pai estaria ao seu lado, o protegendo, e contando breves histórias sobre a vida, o universo e tudo o mais.

(FELIZ DIA DOS PAIS - DEDICADO AO MEU PAI, THADEU VELLOSO, AINDA VIVO, (GRAÇAS A DEUS),E MEU HERÓI INTELIGENTE)

Fael Velloso
Enviado por Fael Velloso em 11/08/2010
Reeditado em 25/03/2011
Código do texto: T2432729
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