Naquele Edifício...
Acordou bem cedo, se é que dormiu. Via naquela entrevista uma oportunidade.
Tentou com um par de bons pensamentos espanar a poeira e fazer luzir a ultimamente tão fugidia auto-confiança. Qual a espessura da crosta de desprezo que teria que romper desta vez?
Tinha como ferramentas para isso uma ótima formação e uma vasta experiência. Sabia, entretanto, que uma era constantemente desafiada pela velocidade das transformações e a outra, a outrora tão valorizada capacidade de saber conduzir qualquer transatlântico pelo estreito caminho da barra até o porto, já não lhe rendia os aplausos de antes. Ou era simplesmente porque não conseguia ouví-los?
Chegou bem antes. Notou algo estranho: havia algumas cadeiras ocupadas por pessoas muito parecidas com figuras notórias. Rindo para ele ou dele? Será que até seus olhos agora conspiravam contra sua razão?
- Próximo ! Resumo de qualificações.
- Bom Dia. Aqui está.
Após algum tempo de análise e sobrancelhas franzidas, veio a pergunta:
- Aquí diz que o Senhor trabalhou durante 50 anos. O que significa isso?
- Eu sempre fui um trabalhador.
- Não vai me dizer que estudou também durante todo esse tempo?
- É, isso. Tentei manter o meu conhecimento em dia e nunca parei. Trabalhava durante o dia, estudava à noite e nos finais de semana. E, nas horas vagas, ainda ajudei minha mulher com nossos seis filhos.
- Quer dizer que o Senhor trabalhava, estudava e fazia filhos enquanto outros companheiros... e o Senhor no "bem-bom", totalmente alienado como se nada estivesse acontecendo?
- Mas...
- Não terminei ainda! Sem nenhuma marca na coronha e ainda tem coragem de vir aqui candidatar-se?
- Se o Senhor quizer eu canto agora mesmo "Prá não dizer que não falei das flores" de trás pra diante e trago a boina do "Che" que ainda tenho lá em casa. "Amo esa Isla" do Pablo Milanés, era a canção de ninar das crianças. E eu só vim pelo cargo de porteiro.
- Porteiro? O Senhor está totalmente enganado. Aqui é pra Síndico.
Sín-di-co. E o Senhor não tem a mínima qualificação.
- Próximo !
(Ufa, ainda bem que é só um conto surreal)
Acordou bem cedo, se é que dormiu. Via naquela entrevista uma oportunidade.
Tentou com um par de bons pensamentos espanar a poeira e fazer luzir a ultimamente tão fugidia auto-confiança. Qual a espessura da crosta de desprezo que teria que romper desta vez?
Tinha como ferramentas para isso uma ótima formação e uma vasta experiência. Sabia, entretanto, que uma era constantemente desafiada pela velocidade das transformações e a outra, a outrora tão valorizada capacidade de saber conduzir qualquer transatlântico pelo estreito caminho da barra até o porto, já não lhe rendia os aplausos de antes. Ou era simplesmente porque não conseguia ouví-los?
Chegou bem antes. Notou algo estranho: havia algumas cadeiras ocupadas por pessoas muito parecidas com figuras notórias. Rindo para ele ou dele? Será que até seus olhos agora conspiravam contra sua razão?
- Próximo ! Resumo de qualificações.
- Bom Dia. Aqui está.
Após algum tempo de análise e sobrancelhas franzidas, veio a pergunta:
- Aquí diz que o Senhor trabalhou durante 50 anos. O que significa isso?
- Eu sempre fui um trabalhador.
- Não vai me dizer que estudou também durante todo esse tempo?
- É, isso. Tentei manter o meu conhecimento em dia e nunca parei. Trabalhava durante o dia, estudava à noite e nos finais de semana. E, nas horas vagas, ainda ajudei minha mulher com nossos seis filhos.
- Quer dizer que o Senhor trabalhava, estudava e fazia filhos enquanto outros companheiros... e o Senhor no "bem-bom", totalmente alienado como se nada estivesse acontecendo?
- Mas...
- Não terminei ainda! Sem nenhuma marca na coronha e ainda tem coragem de vir aqui candidatar-se?
- Se o Senhor quizer eu canto agora mesmo "Prá não dizer que não falei das flores" de trás pra diante e trago a boina do "Che" que ainda tenho lá em casa. "Amo esa Isla" do Pablo Milanés, era a canção de ninar das crianças. E eu só vim pelo cargo de porteiro.
- Porteiro? O Senhor está totalmente enganado. Aqui é pra Síndico.
Sín-di-co. E o Senhor não tem a mínima qualificação.
- Próximo !
(Ufa, ainda bem que é só um conto surreal)