UM DIA INESQUECÍVEL
TIC!!! TAC!!! TIC!!! TAC!!!
O relógio de parede já marcava 17 horas, o dia praticamente havia chegado ao seu fim. Bilu estava deitado no sofá da sala observando atentamente o movimento dos ponteiros, a ansiedade aumentava a cada volta.
- Mãe o ponteiro pequeno está no cinco e o grande está no doze. Falta bastante tempo ainda?
- Filho! Você tem que esperar o ponteiro pequeno ficar no sete e o grande no doze. Então meu querido, fique calmo, ainda está faltando bastante tempo. Escolha algum brinquedo legal e vá se divertir.
- Tá bom mãe!
Mal terminada a frase e Bilu já estava dentro de seu quarto escolhendo algum de seus brinquedos prediletos. Esse dia havia sido de muita expectativa para ele, pois hoje chegariam de viajem seus avós. Essa viajem fora bastante demorada para quem está acostumado a acordar e dormir sempre tendo a companhia de um dos dois por perto.
O casal Rica e Aroldo abrigavam em sua casa os pais dela. Como a casa era bem grande, todos conviviam em tranquilidade, sem muitos apertos e desconfortos. A convivência entre o casal e os pais dela era muito cooperativa, todos ajudavam um pouco, e dessa forma, todos podiam ocupar uma fatia do tempo para brincar e passear com Bilu.
Pronto. Bilu já estava de volta a sala com meia dúzia de carrinhos que ele acabara de escolher na prateleira. Começada a brincadeira ele logo já havia montado uma estrada usando as almofadas, cadeiras, tapete e revistas que estava na sala.
Ele já havia decidido qual seria a brincadeira naquele momento, iria fazer o caminho igualzinho ao que seus avós estavam fazendo, desde a saída do sítio onde eles estavam até a chegada em casa. Para caracterizar a zona rural onde o sítio estava localizado, pegou também alguns cavalinhos e vaquinhas de plástico que tinha ali por perto.
- Mãe adivinha do que eu tô brincando?
- De corrida.
- Claro que não. Olhe bem. Tem estrada, cavalo, carrinho. Adivinha vai?
- De motorista de caminhão.
- Não mãe estou brincando de viajem. Melhor ainda, estou fazendo uma viajem igualzinha a do vovô e da vovó. Legal né?
- Nossa filho, que ideia legal. Tenho certeza que o tempo vai passar bem mais depressa.
E lá estava ele naquela estrada dirigindo seu fusquinha de plástico azul em meio a seus cavalos e vaquinhas de plástico. Passava por baixo das cadeiras que ele havia enfileirado para fazer um túnel, passava por cima das almofadas demonstrando os caminhos de descida e subida do trajeto, ultrapassava os carrinhos que havia deixado de lado, e não se esquecia de sinalizar dando um tchauzinho, sempre que passava por seus bonequinhos de playmobil que colocara perto da estrada.
Após umas duas voltas completas por toda a sala ele dirigiu seu fusquinha para o banheiro, indo em direção ao vaso sanitário. Parou o fusca ficou em pé e disse em voz alta.
- Abastece com gasolina que eu vou aproveitar para esticar as pernas e ir no banheiro que estou apertado.
Terminado o serviço que tinha pra fazer dentro do banheiro, se abaixou novamente, pegou seu fusquinha azul e partiu em direção a sala para prosseguir em sua viajem de volta. Nesse momento sentiu no ar um cheiro bem conhecido que vinha da cozinha. Era o bolo de fubá que sua mãe estava preparando para recepcionar seus pais.
- Mãe. Esse cheiro está me dando água na boca. O bolo já está pronto?
- Calma filho, já está quase pronto, assim que seus avós chegarem a gente lancha com eles.
- Oba.
E lá se foi Bilu rumo ao tapete, prosseguindo em sua viajem. Passou novamente por baixo das cadeiras, por cima das almofadas, acenou para os playmobil que estavam a beira da estrada e ao chegar perto do sofá parou seu fusquinha, olhou na parede e mais uma vez ficou parado olhando para o relógio.
TIC!!! TAC!!! TIC!!! TAC!!!
- MÃE!!! MÃE!!! MANHÊ!!!
- O que foi menino. Está ficando maluco, quer me matar do coração. Porque está gritando desse jeito.
- Olha. O ponteiro pequeno do relógio sumiu. Agora só tem um ponteiro. Então o vovô e a vovó não vão chegar mais.
- Para filho. Presta bem atenção, o que está acontecendo é que os dois ponteiros estão exatamente na mesma posição. Por isso que você só está vendo um dos ponteiros. Eles já estão quase chegando. Repare, os dois ponteiros passaram um pouquinho do número seis. Agora são 18:35 e mais um pouquinho o ponteiro pequeno irá ficar no sete e o grande no doze.
- Não sumiu um ponteiro mesmo?
- Não filho não sumiu. Brinca mais um pouquinho que eu vou terminar de preparar as coisas pra gente tomar um café bem gostoso com os seus avós. Deixa eu te falar mais uma coisa, dá uma arrumada na sala,. Você fez uma bagunça danada nessa viajem hein.
- Tá bom.
Mais que depressa Bilu colocou tudo no lugar arrumou as cadeiras, as almofadas, as revistas, recolheu as vaquinhas, os cavalinhos e os playmobil, pegou os seus carrinhos e foi correndo guardá-los no quarto. Quando voltou na sala deitou-se no sofá e ficou novamente olhando o relógio.
Nesse momento toca o telefone e Rica atende. Do outro lado da linha era uma pessoa que se identificara como policial rodoviário. A notícia não era nada boa, um acidente fatal acontecera na estrada envolvendo vários veículos. Um caminhão desgovernado invadiu a pista contraria chocando-se contra vários carros, e matando-se seus pais.
Esse golpe foi muito forte e Rica apenas sentou-se no sofá calada, sem nenhuma reação, ela abraça Bilu e fica fitando o relógio de parede. Sua perplexidade foi tamanha que não conseguiu nem mesmo perceber que o leite que ela estava fervendo tinha derramado no fogão apagando o fogo. O gás vazava em grande quantidade pela casa. Como o forno estava aceso terminando de fazer o bolo de fubá não demorou muito para que toda a casa estivesse ardendo em chamas. Uma grande explosão sacudiu todo o quarteirão, aquele casarão já não existia mais, restara somente entulho e ferro retorcido.
Nesse momento Aroldo que chegava do trabalho para seu carro em frente do que seria sua casa e fica pasmo. Ele abaixa-se e apanha no chão uma massa de plástico derretido azul que a momentos atrás era o fusquinha que seu filho amado brincava na sala e que ele através de sua web cam pode apreciar de dentro do seu escritório.