O rapto do holograma
E eis que mesmo neste reino, em que a normalidade passa longe e o inusitado é cotidiano, da-se um fato tão imprevisível quanto jamais imaginável.
Vem de longe um forasteiro vendedor de quinquilarias, parafernálias e desconhecidas maquinarias. Faz anuncio e alvoroço, de uma coisa nunca vista, chama à praça toda a gente, pois que naquele entardecer, como mágica, uma moça ele faria aparecer.
E se juntam desconfiados em pequena multidão, apressados em se colocarem num lugar de boa visão. Bem abaixo do frondoso jequitibá (quem não se lembra do jequitibá, por onde passaram os bravos mosqueteiros, as damas recatadas do coletor de sementes, deu descanso a um jovem pastor, ponto de partida das famosas caçadas, onde se fixou o anuncio de um baile de outro rei, acolheu a chegada de um certo cowboy, se escondem em escapadas as ninfas e faunos do bosque e indica o caminho pro tal canto dos mistérios), só poderia ser ali, a apresentação do anunciado “espetáculo”.
Pois que monta, o forasteiro, aparelhagem tão esquisita. São caixinhas e caixinhas com luzinhas coloridas, sons curtos e freqüentes, tampas iluminadas com figuras de “brinquedos”. Então logo que escurece, ante tanta curiosidade e impaciência pela espera, pede o “mago” toda a atenção dessa gente.
De repente, de uma das máquinas escapa uma luz, que entre formas e cores indefinidas, faz nascer, bem ali na frente de tantos olhos atentos, uma jovem completamente irreconhecível. Voz tão doce e calma, num sibilar que ecoava, os trejeitos graciosos como os que ensaiados em movimentos tão contidos. De aparência tão perfeita, olhos boca e cabelos e um corpo desenhado numa roupa que a leveza desmentia ser uma armadura.
Intocável. Era um anjo? Ou um filme sem cinema? Um feitiço que aprisionava, e da jovem só mostrava como espectro, a sua alma?
Extasiados estavam todos, a ouvir as suaves falas, que ninguém se deu conta que um cavalheiro, tudo observava. Outro estranho daquele reino, pouca fala, nenhum amigo, solitário que passava seu tempo a cuidar do que em suas terras cultivava. Nas passagens pelo povoado, pra o extremo necessário, raras eram as vezes em que se intrometia na rotina, só quando algo injusto ele constatava, e bem por isso sempre fora respeitado.
Sem chamar muita atenção, por entre o povo circulava, como se de cada canto, tentasse entender o que se passava. “Como pode uma criatura ainda aprisionar como escrava e vender em praça pública, quase um anjo de tão delicado”. Que com todo esse encanto, seu coração havia tocado.
Curto tempo havia passado e em galope montado, o cavalheiro abre espaço, traz a moça para a garupa, enquanto à laço, puxa a máquina e parte em disparada.
No meio do povo aturdido, só se ouvia os brados desesperados do forasteiro enfurecido:
_ Meu holograma, meu holograma!!!!...raptaram meu holograma!!!
Nome feio, assim pensavam, que ele dera a tão linda moça. Que mal gosto o do forasteiro, diziam todos, enquanto dispersavam!
m.raposo*