... Continuação dos capítulos anteriores postados aqui no Recanto.

A lenda de Hiphitusi 

 
18. A visão de Roi
 

-- Quando cheguei a Namibe não fui muito bem recebido pelos amigos do príncipe! – Iniciou Roi de uma forma a chamar toda a atenção sobre si. – Parece que ainda se ressentem de que você os tenha de certa forma abandonado.
Kedaf olhou para ele de forma curiosa, mas limitou-se a ouvir.
Roi então narrou detalhadamente todos os problemas que enfrentara, desde sua entrada no deserto, os ladrões que o acompanhavam, a fome e a sede que o sufocaram, a sorte que sempre fora sua amiga, lhe colocando na entrada do templo, que encontrara destruído.
Por muitas vezes ele ouviu os suspiros que Vanuzia dava em cada um dos momentos tristes que acabou narrando, como se ela de longe tivesse sentido tudo ou ao menos por se tratar de alguém que amasse agora precisasse sentir o que ele sentira e assim reconfortá-lo.
-- E isso é tudo! Agora creio que devemos unir as quatro partes de nosso mapa e ir para a última parte de nossa longa missão! Mas como a hora é propícia, melhor almoçarmos antes, que acham?
Ambos concordaram, mas antes que saíssem Kedaf segurou roi pelo ombro.
-- Vá descendo Vanuzia, preciso saber de mais um detalhe particular com o amigo aqui e em seguida nos reuniremos contigo.
-- Por mim tudo bem! – Disse ela e se despediu de Roi com um beijo.
Kedaf fechou a porta e encarou o outro por um longo tempo, tentando desvendar algo que não conseguira compreender, mas Roi manteve um semblante impassível.
-- O que é que está errado nesta história que contou meu amigo? – Perguntou ele –Existem alguns detalhes que tenho certeza que agora sabe sobre mim, mas por que não ouvimos falar dele na última hora?
Roi fez menção de responder, mas Kedaf o impediu, lhe estendendo uma mão espalmada na direção de sua face.
-- Deixe-me completar meu raciocínio! Agora sabe que não sou príncipe nenhum, que sou um antigo bandido do deserto, que lhe enviei para uma possível morte, que quis sim soltar sua mão no templo do Peru, então por que não disse nada!
Esperou que Roi absorvesse suas palavras e continuou.
-- O que vem tramando dentro dessa sua mente? Será que é tão maquiavélico quanto eu? Será que pretendia que eu fosse ingênuo o suficiente para não perceber o que estava escrito em seus olhos? Ou será que existe alguma outra motivação? – Ao dizer as últimas palavras, Kedaf lhe deu as costas – Veja que eu estou desarmado, com um traje fino, facilmente ultrapassado por uma adaga, se assim o amigo quisesse! Mas estou assim não por ser um tolo, nunca fui e por isso sigo adiante vivo! É que eu conheço as pessoas, aprendi a vê-las por suas arestas, onde não conseguem jamais disfarçar quem são na realidade, pelo menos assim sempre pensei. Será que no seu caso eu estava enganado? Se for assim um homem morto agora eu sou, nem vou reagir, faça o que veio fazer!
Roi não moveu um músculo sequer, a não ser os lábios.
-- Eu bem desconfiei de você desde o início, quando você se juntou a nós no Chile. Também enxergo as verdades e mentiras expressas no rosto de cada uma das pessoas que passo a conviver e apesar de ter pesquisado sobre você, continue desconfiado.
-- Confirmei minha suspeita no Lar da Pedra do Peru, vi algo em seu rosto que me assustou de tal forma que tinha a certeza de que morreria! Mas vi outra coisa também atrás da maldade declarada: determinação! A mesma que eu sempre carreguei comigo! Então nessa hora pensei que se em alguma coisa éramos semelhantes, podíamos também ser iguais em outras.
-- Está enganado! – Cortou Kedaf voltando a encará-lo – Somos muito diferentes!
-- Sim, eu sei. Não existem duas pessoas totalmente iguais no mundo, até mesmo os gêmeos têm algumas características que divergem, por menores que sejam. Tanto é que não me espantei tanto ao descobrir que sua nobreza era fruto de uma mentira. O que eu não sabia era a sua motivação em agir assim...
-- Do que está falando?
-- Estou falando do que o motiva a agir da forma que age ou agiu, ou até agirá no futuro!
-- Eu nasci assim...
-- Não foi bem isso que eu descobri...
-- Me diga então o que descobriu pesquisando sobre mim em tão pouco tempo.
-- Eu tive um dia inteiro enquanto me recuperava do desgaste sofrido no deserto! Descobri de onde você veio, da maneira escrava como sua tribo vivia e vive até hoje, explorada como é há séculos, presa a costumes arcaicos que já não deveriam mais existir.
-- É lógico que eu não creio que isso seja uma desculpa, existiam outros caminhos, diversos, mas é claro que você, o príncipe Kedaf, não teve muitas escolhas ou até bons exemplos para seguir, pois seu mundo na infância sempre foi de muita dor, necessidades e sacrifícios constantes. Nem posso imaginar pelo que passou...
Kedaf soltou uma sonora gargalhada.
-- Repito que está enganado Roi! Sempre fui assim, mau, ambicioso, gosto da vida fácil. Você é um tolo que se deixa levar por sentimentos desconexos...
-- Sentimentos que você sempre desconheceu não é? – Cortou Roi. – Por isso lhe parecem tão estranhos.
Kedaf fez um sinal com as mãos que significava ter baixado a guarda.
-- Continue pensando o que quiser de mim, pouco me importo. Se está certo ou errado somente o tempo vai lhe mostrar, mas eu vou continuar lhe afirmando que está errado e portanto deve tomar cuidado redobrado, por você e pela sua bela namorada. E falando nisso não vai lhe contar nada a ela sobre essa sua recente descoberta?
A resposta espontânea que Roi deu rodou na mente do falso príncipe por vários dias.
-- Não creio que seja necessário! Ela o vê como um príncipe e eu gostaria que ela continuasse o vendo assim, afinal é o mínimo que você merece por tudo que teve que passar para receber este título.
E alguma coisa estranha, desconhecida, tocou Kedaf bem no seu íntimo. Talvez fosse amor, ódio, ou quem sabe as duas coisas juntas.
 

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19. Gangkhar Puensum

 

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JGCosta
Enviado por JGCosta em 17/01/2010
Reeditado em 18/01/2010
Código do texto: T2034352
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