De Lobatos e Tubarões
Lobato dormia enquanto o resto do dia e da vida corria impune sobre sua janela. Lá ele ficou durante o dia inteiro e sem mover um músculo, continuo por mais dois dias. Não sabia se dormia ou se havia morrido, quando então resolveu se levantar e para sua surpresa, não viu o reflexo tão habitual no espelho. Pensou em ir num hospital, pensou em ir na policia, no cabaré, na casa da sua tia, num bar encher a cara, numa escola, procurar emprego, mas não, dentre tantas alternativas preferiu a cama e voltou a dormir, sem nem entender o porque da decisão. Por mais dois dias ele passou deitado, não dormia, estava consciente, no entanto passou com os olhos fechados o tempo todo. Só abriu quando o sol do amanhecer do terceiro dia já lhe ofuscava a visão e novamente correu ao espelho, novamente tomou um susto ao não ver seu reflexo.
Lobato decide ir ao mar, se afogar e desaparecer de vez, sendo triturado e engolido por um tubarão ou quem sabe até piranhas. Desceu os quatro jogos de escada do seu prédio, abriu a porta e saiu de encontro ao mundo. Quando olhou na sua volta viu que não existia mar ali na sua frente. Havia apenas outro prédio, e outro, e outro e outro e uma casinha peculiar com uma cruz em cima. Certamente não era a praia. Perguntou para as pessoas, mas ninguém o escutava e sua paciência já estava se esgotando, achou melhor voltar para seu prédio. Subiu os mesmos quatro jogos de escadas e deitou.
Dormiu. Acordou, novamente três dias depois. Não sentia frio nem calor, não via sua imagem no espelho. Lobato não se sentia triste, nem alegre. Não tinha um pensamento a seguir, apenas desejava ir ao mar, se afogar e ser triturado por um tubarão. Não havia possibilidades, abriu sua janela, procurou o mar no horizonte, não o encontrava. O céu terminava atrás de um prédio cinzento e cheio de janelas.. e começava do lado de uma casinha peculiar com uma cruz em cima. Não entendia nada de prédios ou casinhas com cruzes em cima. Passou acordado até o anoitecer, e se espantou quando o céu azul se tornou escuro, bem aos poucos, não foi visível a mudança, mas foi gigantesca. Pensou que agora iria encontrar o mar, desceu correndo as escadas e atravessou a rua parou do outro lado e... não encontrou nenhum oceano com tubarões. Voltou devagar para seu quarto, tentando decifrar o que aquilo tudo significava.
Lobato dormiu novamente, só que dessa vez acordou logo no amanhecer. Ouviu o canto de um pássaro e entendeu que ele o mandava seguir até o mar, se afogar e ser devorado pelos dentes cruéis de um tubarão. Lobato sentou pensativo...
“O que são tubarões?”, pensou antes de deitar e dormir novamente...