"CUIDADO COM AQUILO QUE DESEJAS; TU PODES CONSEGUIR." COMEMORATIVO AOS 100 TEXTOS POSTADOS.

CUIDADO COM AQUILO QUE DESEJAS; TU PODES CONSEGUIR.

Barnapião Ignácio Gonzaga, fez, naquele dia, tudo como costumava fazer.

Igualzinho.

Acordou, infalível, às seis horas da manhã.

Durante dez minutos de revolta, remoeu a dor de acordar mais um de seus trinta e cinco mil, setecentos e setenta dias já acordados e respirados.

Depois, girou seu corpo magro para o lado esquerdo.

Sentou-se à beira da cama com cabeceira de palhinha, e calçou os pés ossudos e quase transparentes com o chinelo de pelica marrom.

Fez um automático “em nome do pai”.

Meio que empurrou para a frente e para cima seus ossos jurássicos vestidos num clássico pijama bege com listrinhas marrons.

Alongou-se, espreguiçando-se, e partiu vagarosamente, valente e corajoso, para o cumprimento das tarefas obrigatórias e cotidianas como fazer xixi, escovar as dentaduras, lavar o rosto de pele macilenta, pentear a meia cabeleira traseira ralinha e sem cor, trocar o insípido pijama pelo naftalítico terno três peças modelo mil novecentos e cinqüenta e oito, limpar seus óculos de aro de tartaruga.

Então, sentar-se à mesa do café, posta por Efigênia, uma anciã mais teimosa do que ele, que serviu, primeiro à família inteira, e depois por falta de opção e de vida própria, decidiu, sem questionar a ninguém, ficar ali, servindo a ele, o único da família que nem casara e nem morrera.

Uma vez sentado à mesa, era pegar o jornal ao lado da xícara de porcelana bordada de florezinhas – sobrevivente de outras vidas – ler, sem entender direito, as notícias novas de uma era moderna à qual ele não pertencia.

Depois, tomar seu mingauzinho de fubá, comer seus sequilhos acompanhados do seu cafezinho docinho.

Bem docinho mesmo.

É que já fazia mais de trinta anos que deixara de bancar o machão queimando e amargando a língua no café quente e forte.

Terminado o desjejum, era olhar em volta, desesperançado com a indizivelmente árdua tarefa de escolher o que fazer do resto daquela interminável vida contida naquele mais um dia.

E então, aconteceu.

De repente, sem mais nem quê, Barnapião Ignácio Gonzaga, sentiu sopitar-lhe no peito, uma aviltante vontade de sair porta a fora e afrontar aquela vida imensa que teimava em se lhe grudar aos poros.

Escancarou a porta da rua e com seus passinhos trôpegos de noventa e oito anos, lançou-se fora sem pensar duas vezes.

Era para não correr o risco de, na segunda vez, mudar de idéia. Barnapião custou uns bons cinco minutos de caminhada vertiginosa para aperceber-se de alguns detalhes.

Primeiro, ele andava muito rápido e sua respiração continuava normal.

Segundo, que o temido cheiro, ou antes, o mau cheiro de gás carbono não existia.

Ao contrário, um cheiro leve, fresco e primaveril inundava suas narinas.

Terceiro, o que havia sido feito do asfalto?

Quarto, que muitas pessoas o haviam cumprimentado cortêz e alegremente, mas ele, em sua pressa militante, apenas abanara a mão banalmente sem prestar atenção.

Quinto, que ele estava “na moda” com seu terno três peças e sua tartaruga de estimação.

Estranho...muito estranho!

O que estaria acontecendo?

Avistou uma praça vagamente familiar e andou para lá já sem tanta pressa.

Sentou-se em um banco de madeira sob uma linda trepadeira florida e espectral.

Estupefato, Barnapião observava os bondes passando ao largo, os cavalos com seus cavaleiros, inexplicavelmente ainda existentes, os sobrados antigos com suas janelas abertas de onde saíam, por vezes, bandas de cortinas de cassa, e por vezes ainda, baciadas d’água ameaçando os passantes que empunhavam, para seu total espanto, bengalas de mogno ou sombrinhas de babados.

Nesse assistir bizarro, Barnapião viu de repente uma cena que o alvoroçou, ou antes, o assombrou.

Lá ao longe, p’ros lados da Bica do Quintão, vinha vindo um ajuntamento de pessoas e então os sinos da igreja rococó começaram a badalar.

Barnapião não queria acreditar, mas era verdade.

Todos eles estavam ali, inclusive Efigênia que ele não vira naquela manhã tão inusitada.

Mas...como podia ser aquilo?

Aproximou-se um tanto quanto hesitante, temeroso mesmo.

Porém, seus pais, irmãos, tios, primos, cunhados, sobrinhos e alguns amigos mais íntimos, o abraçaram com grande alegria e saudade.

E Barnapião sentiu-se envolto no calor e conforto daquele contato.

Sentiu-se vivo sem a medonha obrigação de respirar.

Barnapião os foi acompanhando para a igreja, tentando perguntar e responder coerentemente, quando notou que Efigênia chorava completamente exclusiva no meio de toda alegria reinante.

Porém, ele não conseguiu aproximar-se para consolá-la.

Assim, entraram todos na igreja e foi então que um susto agudo e irremediável traspassou o coração de Barnapião, que acabava de compreender tudo.

Tudinho mesmo.

Lá na frente, bem em frente ao altar, estava o seu caixão tendo dentro o seu corpinho murcho e sem expressão.

Efigênia, senhora absoluta daqueles restinhos mortos, chorava desconsolada ao lado daquele "andor".

Barnapião estarreceu-se.

Ele morrera. Finalmente morrera.

Mas em que prisão havia entrado!

Sonhara e esperara pela morte por anos infinitos para ver-se livre da vida e de toda a opressão acocorada nela.

E agora que estava morto, que não podia mais fugir ou esconder-se dentro de casa, descobria-se mais vivo do que nunca, pois nem morrer podia mais.

O silêncio e a escuridão, o nada absoluto tão esperados, revelavam-se impossíveis.

Chocado, Barnapião Ignácio Gonzaga afastou-se.

Retornou para a praça onde estivera pouco antes.

Sentou-se no mesmo banco e vagou o olhar desconsolado pelo perene cenário que se lhe descortinava.

Resolveu esperar ali mesmo por Efigênia que fatalmente viria.

Resignado e esmagado pelo peso da verdade absoluta, Barnapião pensou com seus botões de madrepérola:

“É...CUIDADO COM AQUILO QUE DESEJAS; TU PODES CONSEGUIR.”

COMPLETO, COM ESSE CONTO, MEU CENTÉSIMO TEXTO PUBLICADO AQUI NO RECANTO. DEIXO UM ABRAÇO CARINHOSO DE AGRADECIMENTO PELA ACOLHIDA TERNA QUE RECEBI DE TODOS.

11/08/2009

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V islumbro 100 motivos para visitar

I ngressar-me nestas leituras

S abendo da grande aventura

L er a alma de que vem se oferecer

A vida livre de quem conquistou

L ugar neste Recanto

E aos poucos mostrou seu encanto

N o ideal de nos trazer o bem

N o seu caminho também

O amor que tende a espalhar

R enovando o coração com seu pensar

Enviado por ANGELICA GOUVEA em 11/08/2009

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VOCÊ, EDMILSON, É MUITO PERSPICAZ. OBRIGADA PELA ATENÇÃO PRESTADA AO PEQUENO DETALHE, MAS DEVO ESCLARECER QUE SÃO 100 LINHAS DO TÍTULO ATÉ O FINAL DA INFORMAÇÃO SOBRE A CENTÉSIMA PUBLICAÇÃO. AGRADEÇO A VOCÊ, MEU FIEL LEITOR, PRESENTE DESDE A PRIMEIRA PUBLICAÇÃO. VOCÊ É O QUE EU PODERIA FACILMENTE DENOMINAR COMO O MEU LEITOR NOTA "100". **OBRIGADA** !!!

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Este conto tem historia,

Reluz em meu padecer,

E também me faz crescer,

Pela historia contada...

Da poetiza afinada,

Escreve como ninguém,

Textos já chegou a 100,

Cada um quer ser melhor...

Neste coro não estou só,

Te digo meus parabéns,

Se você chegou aos 100,

Outras centenas virão...

Enviado por Miguel Jacó

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Essa centésima obra

Ratifica o seu talento

Isso você tem de sobra

Digo sem constrangimento

Parabéns por esse dia

Que redobre a alegria

Vivida nesse momento

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Cada obra é um evento

Que nos cobre de encanto

Cada reconhecimento

É recobrir-se com o manto

Divino do pai celeste

Você é a flor que veste

Os poetas do Recanto.........................

Enviado por Heliodoro Morais

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OBRIGADA A VOCÊ QUE PARTICIPOU DA MINHA CENTÉSIMA PUBLICAÇÃO.

E ESPECIALMENTE OBRIGADA A VOCÊ QUE CARINHOSAMENTE DEIXOU UM COMENTÁRIO, TORNANDO "BRILHANTE" ESSA PÁGINA!

*HFigueira - Muito obrigada!

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Isabel Damasceno
Enviado por Isabel Damasceno em 11/08/2009
Reeditado em 10/09/2022
Código do texto: T1747832
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