Charles, Anjo 7.62 (VIII)

A trombeta havia soado do modo como haviam sonhado - e temido - por noites sem conta. No imenso heliporto da cidade, helicópteros negros aguardavam o embarque das tropas, rotores girando, prontos para decolar.

No penumbra do seu quarto, Charles acabara de calçar os coturnos quando a porta se abriu e o vulto de Helga se desenhou contra a luz do corredor.

- Eu estou partindo - ele disse.

- Eu sei. Ouvi a trombeta - disse ela.

Estava vestida com sua roupa de trabalho, o mesmo tailleur cinza escuro que ele vira da primeira vez, num passado que tornava-se difícil situar em termos de dias ou anos. Os olhos cinzentos estavam ocultos por trás das lentes negras e o rosto dela parecia vazio de expressão.

- Eu também estou partindo - disse, e pela primeira vez ele sentiu uma ponta de hesitação na voz dela, sempre tão absolutamente segura de si.

- Você vai descer, não é? - Perguntou ele, colocando-se de pé.

- Sim - respondeu Helga.

- E se eu não estiver aqui quando você voltar?

Ela não respondeu. Em vez disso, correu para dentro do quarto e abraçou-o com força, como se não quisesse deixá-lo ir.

- O meu amor vai com você - disse ela, à custo.

(continua)