Charles, Anjo 7.62 (VI)
- Não devia fazer isso. Faz um mal desgraçado pra saúde.
Nua, sentada na beira da cama do seu quarto no alojamento, Helga lançou-lhe um olhar torto. Ela tinha olhos cinzentos e isso o deixava fascinado. O restante do corpo também, naturalmente.
- Pra alguém que está morto e quando estava vivo vendia drogas é uma observação no mínimo intrigante - retrucou ela, acendendo um cigarro.
Charles suspirou. Faziam algumas semanas que ela o visitava quase todas as noites e ele sentia-se cada vez mais enredado pela mulher misteriosa.
- Eu me preocupo com você, Helga.
Ela girou as pernas de volta para o colchão e recostou-se na cabeceira da cama. Jogou os cabelos para trás e soltou uma longa baforada antes de responder:
- Eu não sou sua mulher, acho que já disse isso.
Depois que chegara à gerente da "boca", Charles praticamente podia escolher qualquer garota da favela para sua diversão. Daí as tais treze namoradas. Duas ele deixara grávidas, lembrou-se com uma ponta de remorso. Nunca conheceria os filhos.
Helga era um tipo totalmente diferente. Para princípio de conversa, sempre deixava muito claro quem estava no comando.
- Se não é minha mulher como então vem me ver um dia sim, o outro também? - Perguntou ele, tentando parecer sarcástico. No fundo, o que queria ouvir é que ela sentia falta dele.
- Por que eu gosto de trepar com você - disse Helga soltando outra baforada. - Não era por isso que as "cachorras" te procuravam?
Charles ficou em silêncio.
- Só que eu não sou cachorra. Sou loba - continuou ela, esboçando o meio sorriso que parecia ser sua expressão máxima de diversão.
E inesperadamente, ela fez um gesto que o surpreendeu: acariciou a cabeça raspada dele.
- Acho que você está apaixonado por mim - disse ela.
Contrariado, o rapaz afastou o olhar do objeto do seu desejo. Isso só serviu para atiçar ainda mais a curiosidade dela. Pegou-o pelo queixo e o fez encará-la, como se ele fosse um menino birrento.
- Você me ama! Que delícia! Não imagina como vou fazê-lo sofrer daqui pra frente...
Charles não respondeu, pois já estava sofrendo por antecipação.
(continua)