Elas, as musas

Uma homenagem a Tarcísio Germano de Lemos

As musas saíram a passeio e fiquei a catar conchas na areia da praia. Enquanto o dia lentamente se espreguiçava, a minha coleção ia, aos poucos, aumentando. Onde estarão as musas?

- Dá para ouvir o mar! – ele certamente me diria isso e eu imaginaria um oceano inteiro dentro daquela concha rosada e seu som estereofônico do oceano.

“Mas para onde ele foi” – foi o meu primeiro pensamento, como que a interrogar a sua ausência ao meu fiel amigo inconsciente. E ele não me respondeu.

– Por este caminho, andando uns quarenta minutos, você chegará a uma praia fantástica, deserta e com águas cristalinas.

– E tem muita água viva por lá?

– Não sei, nunca vi, mas tem ouriço, tanto que até já me machuquei.

– Pai, você sabe nadar bem?

E mais nenhuma resposta. Nem ao menos um sinal que pudesse me identificar o paradeiro – dele e delas – “Ah, as musas”, pensei.

Segui a trilha e fui identificando coisas que só havia visto na minha infância: uma represa onde passamos juntos um final de ano. Casa simples, mas com toda a família. Até o ex-marido da moça estava presente. E foi bom.

Lembro-me de nós todos nadando no rio e, quando percebo, não é mais o mesmo rio, não são mais as mesmas pessoas e nem o tempo é igual. Diria que seria assim como um local mágico, com passagens secretas para outros e mais outros lugares assim como esse. Recordo-me muito bem de tudo aqui, às vezes, visito tudo quando me desdobro.

Falando nisso, tenho visitado muitos outros mundos por estas noites inacabadas. Não tenho mais medo. Já tive, eu sei, mas hoje não mais. Hoje, aproveito esses passeios para aprender.

O elevador que anda para o lado e balança. Quantas vezes já o peguei. E a floresta, montanha, lago, céu, sol, tudo isso dentro de um andar de um prédio... É, eu fico imaginando coisas... eu sei.

Mas o fato é que ele se foi. E nem me despedi. Tinha tanto a lhe dizer. Fazer o quê? E ainda acho que as musas o acompanharam. Fiquei só. Eu que sempre desejei estar sozinho... Quero não.

Quero a volta das musas, como diria Tarcísio, quero a volta das fadas, de meu pai e de minha irmã. Quero rir com as peripécias das duas meninas e quero ficar feliz quando sinto a presença dos amigos que me protegem.

Eu gosto de imaginar coisas...

E, por isso, imagino.

Imagino um cometa e, agarrado nele, as musas da primavera e de todas as outras estações. Pego-as com as duas mãos e as fecho num formato de concha. Ouço o mar. Um oceano inteiro dentro de mim. A alegria pulsando, a vida. E a certeza de que o mundo pode ser meu se eu assim desejar.

E eu o quero azul.

E todo iluminado.

Porque elas, Tarcísio, elas, as musas, elas voltaram!

Texto publicado no livro Viver: um jogo perigoso, de Márcio Martelli, Editora In House (2009).