A Iteração do Medo

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-Jennifer! Jennifer! Por que está suando frio dessa forma? Levante-se. Lembre-se que hoje é dia de visitar o dr. Crystal. Venha, vista-se!

Bem, como não é nada costumeiro estava muito cansada. Geralmente estou bem disposta e pronta para fazer minhas tarefas, principalmente numa manhã tão linda de sol como essa, diferente da chuva forte que nos atingiu ontem. Hoje não, estou exausta. Mas, o ponto aonde quero chegar é o que me deixou desse modo. Minha noite anterior foi comparativamente incomum. Só de pensar no fato que aconteceu, meu coração dispara e sinto como se minha vida fosse desmoronar. O medo misturou-se com a incapacidade de autodefesa transformando-me em alguém completamente inútil diante de tamanho horror. Minha esperança é que nunca mais voltasse a ter uma experiência parecida. Creio que meu coração não suportaria outra vez. Mas enfim, tudo aconteceu ontem, da forma como contarei aqui.

Tempo chuvoso e frio, dia perfeito para tomar um café e ler um jornal. E foi o que fiz. Sentir a deliciosa e quente bebida no meu paladar despertou os mais profundos sentimentos de prazer, desejo e apreciação, quebrados apenas pelas decepcionantes passadas pelo jornal do dia em que nada além das clichês corrupções na política, derrotas no esporte e quedas na economia se apresentaram. Pareceu uma tolice, mas foi onde tudo realmente começou, o que não havia percebido até então. Algo como o prelúdio do terror. Porém, imediatamente após isso nada de extraordinário aconteceu. Foi o que aconteceu algumas horas mais tarde é que me arrepiou e me desnorteou.

Eu havia ido à biblioteca da cidade entregar uns livros que peguei. Lovecraft e Poe. Dois dos mais brilhantes escritores fantásticos que já existiram. Lê-los me envolveu de forma tal que o prazer seria semelhante ao de tomar aquela xícara de café mais cedo. Inigualável. Entretanto, o tempo passou, o sonho acabou e o pesadelo havia começado.

Voltava eu pela chuvosa e desértica rua, coberta pelo breu da noite, ouvindo o soar tenebroso da chuva torrencial que desabava. Vagando pela imensidão negra, observei o pálido reflexo da lua. O único toque de luz por entre negras nuvens de chuva dava um certo toque de ânimo. E eu continuei meu caminho sem saber que isso havia sido em vão. Poderia ter aproveitado mais o momento de admiração à luz da lua? Não poderia. Era o curso natural das coisas, atuando sobre mais uma vítima, algo imutável, e que estava para acontecer. Havia algo no chão. Curiosamente parei para olhar. Claro, um objeto colorido destaca-se em uma noite como essa. Descrevo-o como uma bola de cristal, onde diversas cores do espectro luminoso estavam contidas nele. Um prazer foi-me despertado mais uma vez como o momento do café. Talvez uns minutos, segundos, milésimos. Tempo em que tudo se apagou. E o espetáculo de horror começou, durando não mais infindáveis milésimos, mas infinitas horas. Ouvi palavras distorcidas serem pronunciadas. E foram. Vi a lua se apagar. Emudeci. Tudo rodopiava. Logo senti um bater de asas e um pássaro negro como a noite pousou na inerte bola de cristal que estava a minha frente. E a bola acendeu. Parecia ser a única luz em todo o planeta. E lembro de ter lido uma certa inscrição nítida na bola: “Ph’nglui mglw’ nafh Cthulhu R’yleh wgah’nagl fhtagn.” E encarei o pássaro. Tudo rodopiava. E li a inscrição. E encarei o pássaro. A verdadeira encarnação do demônio. Algo extremamente causticante a minha visão. E fiquei cega. Quando ouvi perfeitamente estas palavras: “Nunca mais.”. E fiquei surda. E senti um gosto amargo de café na boca. E perdi os sentidos.

-Jennifer! Jennifer! Por que está suando frio dessa forma? Levante-se. Lembre-se que hoje é dia de visitar o dr. Crystal. Venha, vista-se!

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