O Cavaleiro Zé Finí
O cavaleiro José Finí, mais conhecido como Zé Finí cavalgava em uma noite quente e iluminada por um pundonoroso brilho lunar de uma lua cheia de novembro sobre um caminho ermo e empoeirado, mas que essa noite se encontrava calmo. Passando por meio de uma encruzilhada, encontras no chão garrafas de vinho barato; vasilhames com farofa e pimenta; ossos secos de galinha; caixas de fósforo; velas pretas e charutos de má qualidade pela metade.
Já desolado por de fato ser um pobre e miserável vivente das quebradas da região do Planalto em Sorocaba, já não se importa com nada e da um grande gole do vinho barato e de súbito, cospe tudo do chão e clama com ardor: "Puta que Pariu, sô! Que vinhoca!". De certo, arrancaram o rotulo para enganar o diabo, mas não conseguiram enganar nem mesmo um pobre e miserável cavaleiro que por ali passava a caminho da cidade adiante. Mas já estazado, senta-se ao lado da oferenda e com muito esforço bebe o resto da garrafa. Já entorpecido com a excelente bebida, resolve saciar sua fome, que na verdade fome não tinha, mas já bêbado decide comer os restos de carne que se impreguinavam nos ossos secos da galinha; a farofa e as pimentas. Depois disto, com o fósforo, ascende o charuto e o fuma com prazer, mesmo sendo de péssima qualidade.
Aproveitou-se de tudo que ali encontrara, menos das velas pretas, pois o luar já o iluminava perfeitamente; por ser lua cheia, e disto o caboclo estava receoso, pois se dizia que em noites como esta, costumava aparecer pelas redondezas um ser que uivava, um tipo de um homem coberto de pelos longos, que ataca as pessoas que encontra circulando por ai. No fundo Zé Finí estava com pouco de medo, mas macho com se dizia, não podia ficar com medo de coisa que nunca viu ou duvidava existir.
Quase adormecido com o efeito do vinho, vê logo adiante uma figura insólita que senta-se e fica a observar nosso impávido Zé Finí. Este, que já pálido, vai de vagar e quase que rastejando ate sua montaria. A figura levanta e vai andando, meio que flutuando, ao encontro de seu "companheiro", ou quem sabe de sua próxima vitima. Vai chegando perto de Zé Finí; cada vez mais tremulo; suava frio; rezava em voz baixa, temia a própria morte. Zé não conseguia ver quem estava a sua frente, via apenas sombra, nada mais. Logo, esta sobra leva a mão para trás de si e foi tirando-a de vagar. Nestes movimentos, Zé estremece e ajoelha aos pés da figura, que pra ele era o próprio demônio: "Oh, descurpa seu Demônio, eu num queria usa de sua oferenda, mas num pude evitar. Eu tava com fome e cansado seu Demô..."
A voz se rebela:
- Demônio? Quem é o demônio meu caro, José Finí?
- Quê? Como? De onde sabe meu nome? Nunca te vi, ocê também nunca me viu e sabe meu nome... e ainda diz que não é o demônio em pessoa.
- Não sou o demônio e digo mais, costumam chamar-te de Zé Finí, estou certa?
- E eu to certo de uma: ce não é 'o' demônio, é a Demônia.
- Demônia! - rindo - Não, não, sou uma mulher, isso sim, mas não sou o feminino de demônio, sou uma...é ...é ... coisa.
- Coisa. O demônio é uma coisa, o coisa ruim e ocê se denomina coisa, então só pode ser: o coiso ruim da demônia em pessoa.
- Na verdade, não sei o que sou. Muitos me chamam de... acho que já ouviu falar... chamam-me de lobisomem.
- Ora, mais não pode ser, ocê nem me ataco.
- Mas nunca ataquei e nem atacarei. As pessoas dizem que mato, mas nunca me viram fazer isso...
- Mas por que dizem? Se dizem é por que é!
- Acenda essa vela - apontando para a vela preta no chão.
- Pronto!
- Agora aproxime-a de mim.
Quando Zé Finí aproximou a vela da 'Coisa', ele deu um pulo pra trás, subiu em seu cavalo e saiu aos galopes. A sra. 'Coisa' não tinha um cavalo, mas o alcançou voando. Quando Zé Finí olhou pra trás e deu um grito, seu fiel escudeiro, C´est Fini, seu cavalo, olhou também para ver o que havia, e quando viu um negocio cheio de pelos negros voando atrás deles, jogou Zé de suas costas e foi-se embora sozinho.
Caído no chão, olha para a 'mulher' toda cheia de pelo. Mas olhando para ela, tão inofensiva, perde o medo e pergunta :
- Se é O, ou, A demônia, por que ainda não me atacou ?
- Eu não sou o lobisomem. Assim me denominaram, apelidaram. Quando eu era criança, aparentava uma simples menina, mas quando meus 15 anos completar eu ia, começaram a nascer esses pelos. No inicio, era uma simples penugem, mas eles continuaram a crescer, foi quando meus pais me expulsaram de casa, pois diziam que eu era o Cão, o coisa ruim, o diabo encarnado. Então, de medo e vergonha da reação das demais pessoas, vivo aqui, escondida. Mas em algumas noites, pessoas como você me viam perambular por ai, achavam que era algum monstro. Sou apenas uma mulher com grande excesso de hormônios masculino. Por isso os pelos!
- Já tentou se barbear?
- Sim, mas eles tornam a crescer, e cada vez mais grossos.
- E depilação? Já tentou?
- Depilação? O que é isso ?
- E um jeito que as muié arranca os pelo usando cera, um tipo de cola.
- Sabe, vivi tanto tempo aqui, escondida, isolada do mundo desde os 15 anos e hoje com 40, estou desinformada, não sei de mais nada alem dessas vastas matas. Fico aqui escrevendo poesias e me alimento das oferendas que deixam nessa encruzilhada. Talvez eu realmente seja o demônio, - ironizando - sou eu quem come a oferenda que para ele deixam.
- Então também sou, acabei de comer sua comida - ri Zé Fini.
- Mas agora eu já vou. Prazer em ter te conhecido!
- Antes, me fala uma coisa: como é seu nome, como sabia o meu nome e como fez para vir voando atrás de mim e de meu cavalo?
- Sou Ana Júlia. Quanto ao resto, logo saberá, dentro de alguns segundos saberá...
Foi quando Zé Finí acorda de um sonho profundo com os passos animalescos de um suposto lobisomem. Não pensando que fora um sonho, ele vai ao encontro de sua 'amiga', Ana Júlia. Mas é devorado por um Lobisomem. O diabo em suas palavras.