MUITA CALMA NESSA HORA

Torquato Silveira considerado uma sumidade quando tema levantado é violência, do alto dos seus cinquenta e dois anos de idade e trinta de devoção a questão da violência urbana, navegava como poucos por esse assunto, sem se abalar com a tentativa de transformar em melodrama, fatos hoje corriqueiros, principalmente nos grandes centros.

Professor titular da UFRJ, e funcionário concursado do IPEA ao longo da vida produziu praticamente uma biblioteca desse samba de uma nota só.

Constantemente convidado a integrar o gabinete de segurança de alguns governadores de esquerda, foi sempre respeitado por sua obstinação no trato com essa espécie de Câncer que se alastrou pelo tecido urbano, ênfase para cidades com mais de meio milhão de habitantes.

Torquato sempre foi figurinha procurada, quando algum evento diferenciado ocorria em alguma cidade. O sujeito sempre tinha uma opinião, que muitas vezes se afastava do que seria o senso comum.

Sua seriedade era realmente inquestionável, calcada numa formação sólida, onde constava experiências práticas em cidades violentas da Colômbia, Peru e Equador.

No Brasil, seu foco sempre a Cidade que além de Maravilhosa, sempre conviveu com violência, antes restrita a sua periferia, mas que gradativamente avançou para seu núcleo turístico, até então supostamente seguro para seus privilegiados moradores.

Tudo aconteceu numa fração de segundo, parado num semáforo no Leblon, local do metro quadrado mais valorizado da cidade, se viu cercado por duas motocicletas, ambas com sua capacidade máxima, motorista e garupa, sendo que os caronas portando aquele tipo de revólver que parece fora de escala.

A ordem foi de abandonar o veículo para os quatro ocupantes, pais e filhos. Todo mundo já aprendeu que em situações como essa, o mais importante é manter a calma, não fazer movimentos bruscos, e o mais importante, sair o mais rápido possível de dentro da viatura.

Mas foi nessa hora que o imprevisto aconteceu muito nervoso Torquato não conseguia destravar o cinto de segurança, o que irritou os meliantes, com adrenalina subindo para a cabeça.

A opção de momento foi atirar contra o equipamento, e assim abandonar o local da abordagem. Foi nessa hora que o nervosismo dos assaltantes, ao contrário do esperado piorou a situação, o primeiro disparo acertou a mão esquerda de Torquato, outro a virilha e o último a cabeça do fêmur.

Mais nervosos ainda, abandonou a arma, e foi liberar a vítima do cinto, imediatamente o puxndo para fora do carro.

Pronto, ainda de capacete para evitar possibilidade de reconhecimento, os facínoras partiram em disparada pela Avenida Ataulfo de Paiva, sua aventura acabou como clipes na mídia, em menos de um minuto, ao se estatelaram contra um caminhão da companhia de limpeza e coleta de lixo na cidade.

Os dois ainda estavam vivos quando a viatura do corpo de bombeiros conseguiu resgatá-los do veículo agora compactado, como o lixo do caminhão.

A notícia fornecida posteriormente pelo porta voz da polícia militar informava que ambos morreram no trajeto até o Hospital Miguel Couto, há menos de um quilômetro do local da colisão.

Além das mortes, Torquato nunca mais andará com as próprias pernas, agora paralisadas, necessita companhia nos deslocamentos tanto para aulas no Fundão, como também nas idas e vindas ao IPEA.

Ele que sempre preconizou calma nestes momentos especiais, não conseguiu seguir seu principal conselho ao público.

Alcides José de Carvalho Carneiro
Enviado por Alcides José de Carvalho Carneiro em 26/10/2024
Código do texto: T8182533
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