INESPERADO ROMANCE, FINAL

Roberto, 63 anos bem caracteriza aquele discreto solteirão bem apessoado e dedicado síndico do prédio onde reside em companhia de sua irmã Nice, recatada senhora evangélica de aparente tranquilidade, cabelos grisalhos sempre presos e invariavelmente trajando vestidos na altura da canela. Nice fazia parte do grupo de senhoras que davam suporte ao pastor Serafim.

Na impecável cobertura onde residem podem desfrutar da panorâmica vista da Praça Edmundo Bittencourt, ao fundo uma montanha verdejante separa bairros de Copacabana e Botafogo.

Ninguém imaginaria que o determinado Dr. Roberto, mantivesse discreta vida paralela, para tanto, alugava compacto apartamento de quarto e sala na Rua Prado Junior, onde habitualmente oferecia entre tantas outras coisas, também teto ao seu amante de momento.

O relacionamento com Tiago começou despretensioso, se encontravam esporadicamente, mas com o passar do tempo, a proximidade entre ambos cresceu, e Roberto acabou por ceder o apartamento para o amigo morar. Para Tiago uma dádiva, trabalhava em Copacabana, logo passou a fazer o trajeto casa/trabalho/casa da forma mais natural possível, a pé.

O primeiro desacerto entre ambos ocorreu quando Tiago, sem consentimento de Roberto, passou a levar parceiras para o apartamento, e o porteiro do prédio resolveu relatar o fato ao responsável pelo imóvel.

Isso gerou o primeiro momento de crise no relacionamento. Depois de uma série de promessas, a vida retomou a normalidade, pelo menos de forma aparente. Na realidade, um pequeno suborno calou o porteiro, em tese o problema foi sanado.

A gota d’água que desandou de vez a relação coincidiu com o aniversário de Tiago, Roberto se preparara para uma noite romântica a dois, quando chegou ao apartamento quase enfarta. Eram mais de dez pessoas empolgadíssimas com a música alta e drogas rolando soltas.

Roberto teve uma crise de ciúmes diante dos amigos de Tiago e imediatamente convidou todos a se retirarem do imóvel. Em pouco tempo, se viu solitário e frustrado com a situação que tinha criado sem perceber.

Ainda ficou uma semana tentando digerir aquele turbilhão de fatos, que acabaram desaguando em depressiva solidão, agora sua vida se restringia ao convívio com a irmã carola, que praticamente passava calada e pensativa as horas do dia.

Na semana seguinte tentou dar uma de detetive, não sabia mais onde Tiago estava agora morando, mas tinha conhecimento de onde trabalhava. Passou a frequentar um bar em frente ao seu trabalho. Chegava ao local por volta do meio dia e ficava ali bebericando uma cervejinha acompanhada de um tira gosto. No final da tarde repetia a dose, às vezes esticava o tempo de bar, para esperar a saída do ex amante.

Com o passar das semanas não tinha mais dúvidas, fora substituído por outro coroa, e pelo andar da carruagem a relação parecia prazerosa para ambas as partes, provavelmente passavam o dia juntos e isso não esgotava essa nova relação.

Morria de ciúmes do casal, precisava tomar uma atitude o quanto antes, pensou em contratar alguém para dar uma lição nesse ladrão de namorado. E a raiva crescia, quando via a alegria de ambos ao saírem rotineiramente para o almoço.

Como não suportava mais assistir a tanta alegria, aproveitou facilidades proporcionadas pelo desgoverno do capitão para adquirir sua primeira arma acompanhada de muita munição. Inscreveu-se num desses muitos clubes de tiro, também liberados naquele momento e foi gradativamente apurando o manejo com a arma, faria justiça com as próprias mãos.

Antes de efetivar o plano, passou um pente fino nas possíveis câmaras de prédios no entorno, e de madrugada usava uma vara de PVC com um joelho de ferro para eliminar qualquer possibilidade de flagrante da futura ação.

Agora concentrava sua vigília apenas no período noturno, ia armado para o bar, esperando uma oportunidade de serão da dupla. E foi assim que executou o desconhecido parceiro atual de seu amante.

No momento dos disparos, chovia forte no local, e trovoadas abafaram o barulho dos disparos da arma de Roberto, Tiago percebeu a aproximação do estranho, mas não reconheceu quem era, apenas correu em ziguezague na direção oposta torcendo para não ser alvejado.

Roberto apressado entrou na primeira rua à sua esquerda, em seguida partiu com tranquilidade para casa, sua irmã o aguardava para o jantar. Foi então dormir sem o menor remorso.

Alcides José de Carvalho Carneiro
Enviado por Alcides José de Carvalho Carneiro em 15/10/2024
Código do texto: T8174058
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