O CASO DA RUA DAS FLORES - (Versão reduzida/ novo desfecho)

Chovia bastante, noite de outono, mês de junho, era comum chover assim aqui em João Pessoa nessa época do ano. Fátima estava no quarto, toda enrolada num cobertor com a TV ligada. Já passava das 22 horas, ela estava sem um pouquinho de vontade de ir para o térreo cessar os barulhos insistentes da janela, devido à chuva, vindos da cozinha. Cochilou por alguns instantes. Acordou com o som da campainha. Estranhou o horário, já era tarde para ir à casa de alguém. Mesmo assim, criou coragem e foi ver quem era àquela hora. Antes disso foi até a cômoda e pegou sua belezinha.

Desceu as escadas devagar, meio sonolenta. Olhou a imagem pelo interfone e viu uma silhueta conhecida. “Mas porque vir aqui a esta hora, o combinado não é para hoje.” pensou. Bem, já que estava aqui, decidiu abrir a porta e saber o que houve, pois, haviam combinado de se encontrarem na próxima semana. Hesitou em abrir toda a porta, deixou entreaberta e falou:

- Oi, você aqui a esta hora, algum problema? – perguntou surpresa.

A pessoa apenas balançou a cabeça, em afirmativo. E ela decidiu deixá-lo entrar.

[...]

A diarista, como sempre estava atrasada, pois já passava das sete horas, desceu do ônibus correndo em direção a casa da Dona Fátima na Rua das Flores. Chegando lá, passou tranquilamente pelo portão que sempre ficava encostado, estranhou o fato da porta está destrancada. Olhou em volta e tudo no lugar. Entrou chamando por ela:

- D. Fátima, cheguei! Desculpe o atraso. – Repetiu três vezes e nada da resposta.

Ao passar pela segunda sala, próximo a escada, algo chamou sua atenção. Aproximou-se para ver melhor e deparou-se com o inevitável: o corpo da D. Fátima jazia estirada ao pé da escada, com um pequeno corte na cabeça, banhada em sangue. Em seu desespero, correu para a rua e começou a gritar, pedindo socorro. A vizinhança apareceu rapidamente e ficaram todos estarrecidos com o acontecido.

- Logo a D. Fátima? Tadinha – Uns falavam.

- Mas, ela tinha inimigos? – Queriam saber.

****

Beth acordou com o toque insistente do celular. Resolveu atender já sabendo que deveria ser alguma ocorrência.

- Alô, Elisabeth Félix falando! – Atendeu sonolenta.

- Detetive Beth, precisamos de você. Uma mulher foi assassinada no bairro do Altiplano. Você precisa ir para lá, agora. – Determinou o delegado Pedro.

Imediatamente arrumou-se e sem ao menos tomar café dirigiu-se para a ocorrência. Conferiu o endereço e em menos de 15 minutos já estava em frente a cena do crime.

Pela posição em que o corpo se encontra, ela percebeu na hora que a vítima não esboçou nenhuma reação. Pelo jeito, foi pega de surpresa. Observou que a pessoa pelo qual fez isso com ela entrou pela porta da frente, espontaneamente.

Mais adiante viu o policial Roger que estava com uma prancheta nas mãos. Resolveu chamá-lo para obter informações sobre a vítima:

- Oi, o que descobriu?

- O nome dela é Fátima Cristina de Lopes, 55 anos, solteira, sem filhos; professora aposentada; sem parentes próximos. Todos, com exceção de uma prima, moram no interior, município de Cajazeiras. – Explanou o policial de forma pausada.

- Mais alguma coisa? – Quis saber detalhes.

- Sim, nada foi levado, o que descartamos latrocínio. Pela arrumação da casa, não houve luta corporal. Talvez ela conhecesse quem a matou. - Por fim, falou o PM Roger.

- Obrigada Roger pelas informações iniciais. O resto é comigo. Porém, não esqueça que precisarei da sua ajuda, como sempre, né amigão. – Piscou o olho ao terminar.

O policial apenas fez um aceno de cabeça e retirou-se para a entrada da residência. As informações repassadas para Beth já não eram novidade. Foi exatamente o que percebeu ao entrar na residência. Agora somente uma perícia minuciosa esclareceria mais detalhes sobre o crime. Percebeu que a fotógrafa criminalista e o perito criminal ainda não haviam chegado ao local do crime. Restava-lhe apenas aguardá-los. Falou com alguns policiais que impedissem a entrada de pessoas não autorizadas para não causar danos ao local onde a vítima se encontrava.

Um mistério envolvia este assassinato. Quem teria tirado a vida da Fátima? Pensou a policial sem tirar os olhos dela, estirada de bruços em meio a uma poça de sangue e um pequeno corte revelando-lhe um tiro na cabeça, aparentemente não teve tempo para se defender. Quem fez aquilo sabia exatamente com qual propósito foi até ali. Ouviu vozes e percebeu que os peritos haviam chegado. Foi ao encontro deles.

- Olá pessoal, até que enfim chegaram. Irei acompanhar a perícia. Espero que minhas suspeitas sejam confirmadas. – Falou com determinação.

- Já imaginávamos que a encontraríamos aqui. – Respondeu o perito Walter.

- Verdade! – Afirmou Ângela, a fotografa forense da cidade.

E seguiram em direção ao corpo estendido no chão da sala de jantar. Fizeram a perícia com calma, chegando a uma conclusão inicial.

- E aí? – Quis saber os resultados.

- A vítima foi morta por volta das 23 horas, sem agressões graves pelo corpo. Com certeza foi empurrada antes de ser morta. Provavelmente, tentou resistir, sem sucesso. – Continuou. – A pessoa que cometeu o crime foi cuidadosa, estava de luvas e camisa de mangas compridas. Veio preparado, sabe. – Concluiu despedindo-se da cena do crime.

Após o períciamento do corpo, a detetive Beth decidiu ir para casa, pois havia ficado o dia inteiro no caso “Fátima”. Um caso aparentemente sem pistas concretas. Pelo jeito levará algum tempo para ser solucionado. Com a mente cansada de tanto pensar sobre este assassinato, resolveu deitar-se um pouco. Logo após cochilar acordou assustada com um barulho de um trovão seguido por um relâmpago. Estranhou, era noite. Levantou-se da cama tentando entender onde estava e viu que próximo a janela do quarto havia alguém no escuro. Mais um relâmpago, o clarão a fez ver que era uma mulher magra de cabelos curtos, e estatura mediana. Também pode ver que o quarto não era o seu. Olhou em volta e não reconheceu onde estava. A chuva começou e mais relâmpagos riscaram o céu. A mulher apontou o seu dedo para a escrivaninha insistentemente, como se quisesse lhe dizer algo. Beth tentou entender o que ela queria dizer. Aproximou-se um pouco e um trovão estarrecedor ecoou no céu.

Ofegante, a policial acordou assustada, o coração acelerado ao lembrar-se do pesadelo que acabou de ter. Olhou para o relógio da parede e viu que era madrugada, passava das 04 horas. Assim que raiasse o dia iria vasculhar mais sobre o caso.

No dia seguinte foi ao DP (Departamento Policial), cumpri seu horário normal e aproveitou para fuçar mais a respeito do caso “Fátima”. Lembrou-se do relato dos peritos que explicaram sobre o assassino não ter deixado digitais e que ele fora cuidadoso. A vítima também não foi estrupada e nada aparentemente havia sumido da residência, segundo alguns familiares. A detetive Beth precisava solucionar este caso de feminicídio. Pegou o fichário e passou a ler o relatório novamente em busca de alguma pista. Viu as fotos da vítima antes e depois de morta. E foi aí que se lembrou do sonho que tivera. Era ela, a Fátima, a mulher do sonho. Entendeu que ela tentou se comunicar. Isso era loucura. Precisava averiguar mais.

Ligou para o policial Roger e foram até o local do homicídio, a Rua das Flores. O local estava interditado, mesmo assim entraram na casa e Beth foi para o quarto da vítima. Roger a seguiu sem entender bem o que estavam de fato fazendo ali.

- Detetive, lugar já foi todo vasculhado. Creio que não encontrará nada satisfatório. – Argumentou em vão, ele já sabia da teimosia da policial. - O que está procurando Beth?

- Sonhei com o espírito dela na noite passada e eu estava exatamente aqui neste quarto, enquanto ela, a vítima, apontava para esta escrivaninha tentando informar algo. – Respirou fundo, o encarou – Parece loucura, mas foi bem real. Você precisa acreditar em mim. Eu sinto que a resposta para esse crime está bem aqui neste quarto. - Continuou a vascular, desceu para a segunda gaveta e achou um caderninho de anotações escondido bem no fundo dela. Folheou cautelosamente em busca de alguma informação. Notou que da quinta página pulava para a sétima. Uma página havia sido arrancada.

Seguiram para a delegacia, tranquilamente. Na hora do almoço, Beth resolveu ir em casa. Lembrou-se que a sua sobrinha sempre que ia visitá-la deixava algumas coisas, incluindo canetas fluorescentes que brilham no escuro. Talvez pudesse ajudar a revelar o que havia sido escrito naquela folha.

Apesar de na delegacia possuir quimioluminescentes, preferiu não divulgar o achado por enquanto – Encontrando a caneta seguiu para seu quarto, pegou a cadernetinha e na página número sete, rabiscou a caneta fluorescente cor de rosa cintilante. Em seguida apagou a luz do quarto, dito e feito. Algumas palavras apareceram. Estava escrito “Próxima semana – combinado – José Henrique – 20h30m (jantar) pizzaria D.” Ligou para o DPI (Departamento Policial de Inteligência) imediatamente pediu para descobrir onde fica uma possível pizzaria D., depois o resto seria com ela. E para piorar encontrar somente um nome não era suficiente.

Um dia após dela ter achado a caderneta, recebe uma ligação importante:

- Oi, sou eu!

- E aí, encontrou algo interessante? – Perguntou ansiosa ao PM Roger.

- Tem uma Pizzaria no bairro de Manaíra chamada Dinápole, conhecida como Pizzaria “D”. Aproveitei para interrogar o dono e descobri que ele tem um funcionário chamado José Henrique. – Pausa – Acho que pegamos ele.

- Calma, o fato do nome dele estar anotado não significa que foi ele quem a matou.

No mesmo dia descobriram o horário em que o possível suspeito encerrava o expediente, às 22 horas. Ficaram esperando-o sair para discretamente fazerem-no algumas perguntas. Depois de meia hora de espera, vira-o sair pelo estacionamento.

- José Henrique? – Beth chamou-o aproximando-se devagar.

Quando viu que era a polícia correu sem rumo do local. Os policiais correram atrás dele por dois quarteirões. Viraram uma esquina e o pior aconteceu: um microônibus vinha em sentido contrário e atingi-o em cheio. O rapaz teve sorte, o veículo vinha devagar e simplesmente o derrubou, causando algumas escoriações. Ele ainda tentou fugir, porém o policial Roger chegou a tempo. No desespero falou aflito.

- Ela me provocou, ameaçou contar para todo mundo o meu segredo, por isso a matei. – José desesperado falava sem parar.

A partir da confissão dele, foi levado direto para a Delegacia de Crimes Contra Pessoa.

*****

Dias depois no cemitério da Boa Sentença, Beth e Roger estavam em frente o túmulo da professora Fátima.

- Agora ela ficará em paz. Embora como cristã, eu não acredite nisso da alma ficar vagando aqui na terra. Só sei que a D. Fátima apareceu em meu pesadelo e ajudou-me a solucionar o seu próprio assassinato. – Disse a detetive Beth toda melancólica.

Após a visita, seguiram aliviados pelo dever cumprido.

Débora Oriente

Debora Oriente
Enviado por Debora Oriente em 25/08/2024
Reeditado em 27/08/2024
Código do texto: T8137035
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