ESSA É UMA HISTÓRIA COM FINAL FELIZ
Esta história tem como pano de fundo, o bairro do Humaitá, lá no início dos anos 70, quando a rua ainda era ponto de encontro das turmas de adolescentes da vizinhança, esse ambiente público abrigava variado leque de atividades, que atendia desde a turma de sedentários, do tipo intelectual, frequentadores do restrito circuito de cinemas de arte, que exibia filmes de célebres diretores do momento.
Por outro lado, no grupo havia espaço para o pessoal já com o cabelo parafinado ensaiar seus drops nas primeiras ondas e ainda comportando uma maioria que só sabia de jogar futebol, mas às vezes incluía o vôlei nas preferências.
Quando o assunto era pelada, e tantas vezes jogos começavam pela manhã, obedeciam à parada para o almoço e retornavam à tarde, se prolongando até que a falta de luz natural inviabilizava o prosseguimento dos jogos.
Na hora de dividir times, a depender das escolhas iniciais, praticamente definiriam boa parte dos resultados das futuras partidas. Quando um jogador, no caso o Jaiminho, fazia parte do time, significava sinônimo de vitórias, no plural mesmo, como plural e inesgotável era sua intimidade com a bola, que aliada à potência dos chutes, inibia a ação do infeliz que estivesse guarnecendo o gol. Houve casos de goleiros apagados, ao tentar defender petardos disparados pelo Jaiminho
O sujeito era endiabrado, não importando a modalidade em disputa, partia para dentro com uma fome de anteontem, conseguindo com certa facilidade chegar à vitória. Não importando se havia presença ou não da bola, ele sempre vencia.
Uma vez inventamos um jogo de fechada com bicicleta, que acontecia dentro de um espaço delimitado por linhas marcadas no asfalto, não valia empurrar o adversário na disputa. Mesmo com uma bicicleta emprestada, ele rapidamente pegou o espírito da coisa, e foi derrotando um a um os adversários.
Jaiminho era filho de uma doméstica, que nunca soube do paradeiro do pai, Dona Nadir sua mãe, se orgulhava do filho pródigo, e adorava quando cruzava com algum colega de rua, que não poupava elogio as virtudes do Jaiminho.
Anos passaram, e o filho de Dona Nadir convocado a servir o exército, sempre esperto, conheceu um coronel gay, o Praxedes e imediatamente entendeu que poderia tirar vantagem da situação, se conseguisse quebrar o coração do militar.
Não deu outra, agora o que Jaiminho murmurasse como desejo, Praxedes como gostava de ser chamado, usando sua autoridade acabava realizando seus desejos.
Vale lembrar que Jaiminho, ainda na adolescência, ganhava um dinheirinho extra fazendo avião para seus amigos da rua. Algumas vezes subia o Santa Marta ali pertinho, em Botafogo, outras pegava um ônibus e se deslocava até a Rocinha, para conseguir o bagulho.
Nessas aventuras, conseguia levar adiante o que todo atravessador faz bem, auferir lucro, ou seja, parte da compra ficava com ele, função do risco envolvido, posteriormente esse produto se transformava em lucro.
No exército conseguiu trabalhar com revisão e montagem de armas de grosso calibre, especialidade típica das forças nacionais de segurança, também muito valorizada nas fileiras do tráfico e também da milícia. Jaiminho pensava no futuro, sabia que em algum momento seria dispensado das forças armadas.
Alguém sabe-se lá porque, denunciou Praxedes, acusado de conduta inapropriada, o coitado foi parar precocemente na reserva, e o pior, sem a companhia de Jaiminho, que aproveitou a situação, para pular fora da relação.
Sem formação acadêmica e nenhuma vocação para sobreviver à base de um salário mínimo, até procurou amigos de adolescência, ninguém se prontificou a abrir uma porta para o mercado de trabalho formal.
Ainda morando de favor na casa de um amigo dos tempos de caserna, ele não se fez de rogado, e foi procurar seus antigos fornecedores de maconha, nas duas favelas que frequentou durante bom espaço de tempo.
Para sua sorte, conseguiu contato com um antigo vaporzinho, que conseguira ascender na carreira do tráfico. Foi Bagana quem o apresentou ao Portinha, chefe do tráfico no morro da Rocinha. Passaram juntos uma tarde inteirinha conversando sobre armamento, acabou contratado para manutenção dos armamentos sob jurisdição do Portinha.
Jaiminho de cara recebeu um imóvel no alto da Rocinha, mas não demorou a fazer seu retorno ao asfalto, e em grande estilo, passando a residir num daqueles apartamentos de luxo, ali de frente para a Praia de São Conrado.
Encontrei com ele outro dia num vôo para São Paulo, nos cinquenta minutos de conversa ele foi franco em relatar, que hoje tem as mãos limpas, passou a intermediar transações de armamentos com empresas internacionais, para posteriormente distribuí-las aos comandos e a milícia, através de empresas geridas por laranjas de sua confiança.