Às Noites Foram Feitas para Matar | Capítulo 3

Às Noites Foram Feitas para Matar

Capítulo 3

A lua não apareceu. A noite estava fria com um vento esmurrando a vegetação de moderado a fraco. Teresinha caminhava arrastando suas sandálias rasteiras no asfalto irregular da vila. No pensamento uma única pessoa: Juarez Cardoso e o que ele a vem lhe proporcionando desde quando se conheceram. Todo ser humano merece uma segunda chance e diga-se de passagem, como ela necessitava dessa nova oportunidade. O pensamento era tão bom, tão palpável que ela não se deu conta de que Bartolomeu Gomes vinha ao seu encontro.

— Rindo a toa, dona Teresinha?

— Oi, Gomes. Me perdoe, eu estava distraída.

— Não tem medo de circular por aí a essa hora da noite com tudo o que está acontecendo? — cruzou os braços.

— Confesso que sim. E você?

— Quem teria coragem de me atacar? — lhe mostrou o punho.

— É mesmo. Quem ousaria bater de frente com um homenzarrão desse. — riu.

— Venha. Lhe farei companhia.

— Obrigada!

Até que Gomes não é má companhia. Eles conversaram sobre muitas coisas no pequeno percurso que ainda restava. Bartolomeu conseguiu tirar a péssima impressão que Teresinha tinha dele, principalmente quando o mesmo lhe revelou ser devoto de Nossa Senhora.

— Eu moro mais adiante.

— Nossa! Praticamente a última casa da vila. Você não se sente sozinho?

— Que nada. Como eu falei, eu tenho a virgem Maria comigo. — apontou para o céu. — Mas, o que é aquilo lá em cima?

— O que, onde?

De repente todas as estrelas e nuvens desapareceram do céu e a noite que já era sombria se tornou apavorante. O soco no rosto da idosa foi tão bem dado que a mesma apagou na hora.

— Crianças, achei a mamãe. — falou jogando-a nos ombros.

*

O tornozelo esquerdo foi quebrado com uma única pancada dada com o pé de cabra. Teresinha seguia inconsciente. O outro precisou de pelo menos três até Gomes ouvir o estalo. A namorada de Juarez foi deixada no mesmo quarto onde Josias e Isabela foram executados. Enquanto aguarda a volta da consciência de sua vítima, Bartolomeu se propôs a conversar com os corpos em sua cama.

— Será que vocês dois podem falar mais baixo, estou com visita.

O cadáver de Josias, diferente do de Isabela, encontrava-se inchado, esverdeado e já havia a presença de moscas orbitando sobre ele. Gomes as espantou.

— Em breve estarei providenciando a pessoa que cuidará de vocês, ela está lá no outro quarto.

A voz rouca implorando por ajuda de Teresinha foi ouvida.

— Hora do show. — pegou o pé de cabra atrás da porta. — Volto já, crianças.

*

Teresinha nunca foi de se atrasar. O que pode ter acontecido? Juarez discou outra vez o número e o mesmo só dá caixa postal ou desligado. Ele deixou o celular sobre a mesa e foi até a janela. Afastou a cortina e nada viu além de uma escuridão densa e se sentiu culpado. No caso era ele quem deveria sair de casa e não ela. Aonde ele estava com a cabeça quando ela propôs isso? Faz tempo que Vila Carmem deixou de ser um lugar pacato onde o homem mais perigoso gostava de roubar galinhas. Eu não sei o que eu faria se algo de ruim acontecesse a você.

*

Que noite ruim. Se fosse para pontuar, talvez essa seria a pior noite de sua vida desde quando soube que sua mulher havia falecido. Juarez Cardoso não conseguiu pregar os olhos só imaginando o pior. Seu psicológico foi afetado e ele mal conseguia formular pensamentos mais agradáveis. Serei eternamente perseguido por esse fantasma. Viúvo pela segunda vez o levaria a nocaute sem chance de volta. Disposto a espantar as energias negativas, o ex agente decidiu passar um café e tomá-lo sem açúcar ou adoçante, mas o processo foi interrompido por fortes batidas de Onofre em sua porta.

— Sinto muito, meu caro Juarez. — Onofre tinha o rosto ruborizado e suado.

Se a noite foi ruim, o dia seria ainda pior. Cardoso sempre foi um sujeito casca grossa, acostumado a suportar pancadas das mais diversas e de todos os lados. Enquanto abria caminho entre a multidão que, assim como ele, se encontrava apavorada, perdida, sem chão e porque não dizer em pânico, Juarez nutria dentro de si outro sentimento: vingança. Sargento Avilar se aproximou e bastante sem jeito tentou consolá-lo.

— Farei o possível para pôr esse monstro na cadeia, Juarez.

— Do fundo do coração eu espero que consiga, sargento senão o senhor terá que prender a mim.

Logo ali atrás o monstro vislumbra tudo o que causou se alimentando do sofrimento alheio. Bartolomeu Gomes, oco por dentro e por fora, apenas um corpo sem vida possuído por dezenas e dezenas de seres obsessores. "Não posso parar até que minha vontade não esteja completamente satisfeita".

Júlio Finegan
Enviado por Júlio Finegan em 24/05/2024
Código do texto: T8070336
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