Bucatini all'amatriciana

[Continuação de "O fim da trilha"]

De volta à mesma cantina onde haviam jantado dias antes, Gottardo desviou os olhos do menu para Estella, sentada do outro lado da mesa.

- Então... posso pedir o bucatini all'amatriciana, com aquele vinho natureba chileno?

A jovem abriu um sorriso.

- Ótima lembrança! Claro que pode.

Gottardo fez sinal para um garçom, que anotou diligentemente o pedido. Em seguida, ele voltou novamente a atenção para Estella:

- Por falar em lembrança... o que aconteceu no dia em que seu ex-noivo foi buscar você na estação ferroviária?

Estella não conseguiu disfarçar a surpresa.

- Como assim? Do que está falando?

- Você não ia se encontrar com ele, naquela cidadezinha nos Alpes?

Estella inclinou-se sobre a mesa e indagou com voz tensa:

- O que você sabe sobre isso?

Gottardo abriu as mãos num gesto evasivo. Sem saber o que realmente havia ocorrido, não queria revelar sua incursão na cabana nas montanhas.

- O Dr. Migliore... ele andou investigando - respondeu.

Estella suspirou e pareceu recompor-se.

- Compreendo... bom, nós não chegamos a nos encontrar - disse em voz pausada. - Ele nunca apareceu na estação ferroviária... fiquei esperando por horas, e como o celular dele só desse caixa postal, acabei desistindo. Como já era tarde para voltar a Roma naquele dia, me hospedei num hotel e peguei o primeiro trem no dia seguinte.

Gottardo levou a mão ao queixo.

- Que estranho. E depois disso, ele não fez mais contato?

- Não diretamente - afirmou Estella. - Mas começou a mandar mensagens de texto intimidatórias, nas poucas vezes em que ousei sair com alguém; era como se estivesse me vigiando à distância.

Gottardo sabia agora como Proteo fazia isso, embora achasse melhor não dar detalhes.

- Mas desde que removemos o spyware do seu celular, as mensagens pararam? - Inquiriu.

- Sim! - Disse Estella categoricamente. - Sou muito grata pela ação do seu chefe.

- Excelente! - Aprovou Gottardo, virando-se para o lado. - Bem, o nosso pedido está vindo.

A conversa foi interrompida enquanto o garçom servia os pratos. Finalmente, Gottardo comentou:

- Não lhe parece estranho que Proteo tenha desaparecido justamente no dia em que iria acertar as coisas com você?

Estella deu de ombros.

- Talvez tenha chegado à conclusão de que era melhor não me encarar mais de frente.

E num tom reflexivo, depois de dar a primeira garfada no bucatini:

- Eu posso não entender nada de informática, mas não sou tão indefesa quanto pareço. De um jeito ou de outro, creio que ele aprendeu ao menos esta lição...

- [Conclui em "Sobre-humano"]

- [23-06-2023]