Três histórias de assassinato

I

O primeiro homem que matei foi um barbeiro. “Trabalhador honesto” e “pai de família”, diziam. De repente, um bandido que ameaça cortar a jugular da vítima. Uma ruptura assim é possível de uma hora para outra? Não sei, foda-se. Chamei ele para atender no meu domicílio. Época de pandemia de Covid-19, não dava para sair, tudo fechado. Viu meu smartphone e notebook em cima da mesa. Sentei-me na cadeira. Ele tirava as coisas da mochila. Me distraí olhando para a TV. Quando me virei, a navalha estava no meu pescoço.

“Não faça nada. Não quero te matar”.

“Disseram que você é pai de família”.

“E eu sou mesmo...”

“Metendo navalha na jugular de um fodido como eu?”

“Posso ser pai de família e passar a gilete na sua garganta mesmo assim. E como um fodido pode ter Samsung e Motorola Lenovo?”

“Não são meus”.

“Sim, e minha bunda não tem cabelo. Coloque a algema dupla descartável. Qualquer movimento ousado e corto seu pescoço”.

Fiz um movimento ousado, ele passou a navalha, mas mal me cortou. A gilete estava cega. Dei uma cabeçada no nariz dele. Ele caiu. Chutei a cara dele, pisei, chutei a barriga, dei cacetadas com um pedaço de madeira de cama. Ele estava sangrando no chão. Peguei minha arma na gaveta e a usei para espalhar os miolos dele no chão.

Pensei que ficaria chocado, que sentiria remorso, porém não. Meu emocional ficou intacto. Parece até que tinha acabado de escovar os dentes ou de lavar os pratos. E eu achando que precisaria de terapia caso apagasse alguém. Como fui catastrofista.

Eu fiz uma execução. Meu agressor estava indefeso no chão quando encostei o cano da arma na nuca e apertei o gatilho. Nenhum júri acreditaria em “legítima defesa”. Então, fiz um telefonema.

“É o Jack?”, perguntei.

“Sim. Como conseguiu esse número?

“Nos encontramos há dois meses. É o Caim”.

“Opa. Se está me ligando....”

“Sim, é isso mesmo.”

“Sabia que você ia acabar fazendo o que fez e iria precisar da minha ajuda. Meu bom, o cara com uma arma, o dedo coça, ele vai usá-la cedo ou tarde”.

“Quanto você cobra?”

Depois de tudo acertado, dois homens com malas apareceram na minha porta. Tiraram instrumentos cortantes de dentro delas. O barbeiro seria cortado em pedacinhos minúsculos que seriam espalhados por aí ou enterrados. Foi a saída que encontrei. Depois olhei o celular dele para saber se havia alguma coisa que indicasse que o último lugar onde ele foi visto foi a minha casa. Nada. Disse para a esposa que iria na outra rua cortar o cabelo de um cliente – sem especificar, que sorte. Como era “trabalhador”, a polícia estava pouco se fodendo. Sem corpo, sem investigação por homicídio. O “pai de família” sumiu sem explicação. Mas havia outro problema. Potenciais testemunhas. Alguém pode ter visto ele entrar na minha casa.

“O trabalho que você está propondo é muito complexo”, disse Jack, por telefone.

“Quanto você cobra?”

“Você não poderia pagar. E nem sei se toparia, mesmo se você pagasse.”

“A limpeza de vocês é impressionante. Duvido que não fossem capazes de fazer o que eu pedi”.

“Mano, você quer que a gente faça ‘sumir’ seus vizinhos que estavam na casa deles bem na hora em que o barbeiro foi na sua casa. Seria uma sujeira imensa e chamaria atenção da imprensa mesmo que não deixássemos nenhum rastro de que houve uma série de mortes. Tanta gente sumindo assim vira pauta de jornal, o que leva a polícia a ser pressionada. Não queremos essa atenção, que aliás acabaria mirando em você, o único que não desapareceu. Nesse caso, você vai ter que se virar sozinho”.

Desligou.

II

O homem estava apavorado. Não sabia que estava mexendo com uma quadrilha de alta periculosidade. Gente que passou da mera acusação de calúnia para a possível contratação de um assassino implacável. Como combater esse (suposto) sicário? A polícia é inútil. Os contratantes sabiam disso, por isso me chamaram.

Acusado de assédio sexual por 14 mulheres. Execrado em público. Ameaçado de morte na rua. Filhos sofrendo bullying na escola. Uma vida boa que se transformou numa vida de merda num piscar de olhos. É a era das redes sociais. Você vira predador sexual em questão de minutos, ainda que seja um donzelo que nunca tocou em mulher e que acha que boceta é horizontal.

Ele reagiu. Expôs conversas íntimas que demonstravam uma relação íntima entre ele e as 35 acusadoras. Público ficou sabendo, algumas pessoas passaram a ficar do lado dele. Depois elas deram entrevistas. O acusado era inteligente e articulava provas e argumentos de forma magistral.

As 57 acusadoras teriam que fazer alguma coisa para evitar a desmoralização crescente. Não deixariam barato.

“Interceptamos uma conversa. Eles falavam em códigos. Entendemos que se tratava do contato com um jagunço. O cara planeja apagar o nosso cliente aqui, na casa dele”, disse um dos contratantes.

“Aqui na casa dele. É um matador ousado”, eu disse.

“Ousado e confiante”.

“Como vocês têm tanta certeza que ele vem?”

“Nosso cliente não sai de casa. E matá-lo aqui dentro é o ideal para ele”.

“Por quê?”

“Ele não é um assassino comum, supomos. Veja, não seria nada bom para as 99 acusadoras se o seu suposto abusador fosse assassinado no meio de um imbróglio na Justiça e na opinião pública. Acreditamos que o assassino o matará e depois fará parecer que é suicídio”.

“Não sabia que havia bandidos tão sofisticados aqui em Salvador”.

“Aqui em Salvador tem de tudo.”

“Deixem tudo comigo”.

“Venha conhecer o cliente”.

Era um homem magro, cara macilenta, olheiras. Era um fodido. Alguém que estava se entupindo de antidepressivos e ansiolíticos nos últimos meses. Também, né... Estava com um livro em mãos. Não deu para ler direito, capa envelhecida, era livro de sebo. E eu nem quis perguntar.

“Como vai?”, perguntei. Sacanagem, admito. É óbvio que ele não está bem.

“Indo.”

O assassino poderia aparecer qualquer dia. E um matador teria que agir como um guarda-costas na casa do cara. O suposto matador adversário teria que ter uma habilidade inaudita. Ele teria que me apagar, matar o Alvo, fazer a morte do Alvo parecer suicídio e dar um jeito de não deixar nenhum rastro da minha morte na casa. Gente com habilidades assim, apenas em filmes.

O cara choramingava toda noite. Falava dos três filhos, da ex-mulher. Não queria tocar no assunto da acusação. Na estante, variados livros. A maioria sobre o Império Romano. Tinha ficção científica, como o autor Philip K. Dick. Três dias se passaram. Não houve tentativa de matá-lo. Até que...

“Interceptamos uma ligação. O assassino tentará apagar o Cliente hoje. É hora de trabalhar. Acabe com ele”, disseram os contratantes.

“E eles mencionaram a hora do ataque?”

“Não”.

E lá estava eu e o Alvo. Me acostumei rápido com a rotina. Choramingo, Império Romano, filhos. Até que...

Telefone toca. Algo que não acontecia há meses, segundo o Alvo. Eram 23h37. “É incomum”, disse ele. Era o assassino, óbvio. Mas por que ele ligaria? Falaram que ele era confiante. Então, cheio de pabulagem, ele deve avisar que vai matar nós dois.

“Quer deixar algum recado para ele?”, pergunto.

“Não! Você é louco?”

“Foi uma piada.”

“Sem graça!”

“Você é politicamente correto. Quer que eu contate os contratantes? Eles podem te tirar daqui.”

“E se for isso que o assassino quer?”

Atendo.

“Alô?”

Silêncio por três segundos. Até que... Escuto uma melodia. Parece ser da música Wind, de Akeboshi. Durou cinco segundos. De repente, tudo veio à tona. Reminiscências, memórias e uma missão. Desligo o telefone.

“Quem era?”

“Não respondeu nada”, eu disse.

A partir de um conto escrito por Philip K. Dick, elaboraram a “Teoria do Impostor”. A princípio, uma mera tese acadêmica sem nenhuma atenção. Depois, organizações criminosas começaram a adotar.

Reminiscências formam um conjunto sólido de memórias. Vem tudo de uma vez. Dor de cabeça.

A Teoria do Impostor: é possível, através de métodos e determinados recursos tecnológicos, fazer uma pessoa acreditar firmemente que é outra pessoa. “Acreditar que é a pessoa, de corpo e mente. Uma fidedigna réplica de uma determinada identidade”.

Tudo está claro.

Lembro da conversa. Da missão. Fui treinado para acreditar que era outra pessoa. Os contratantes acham que estão passos na nossa frente. Coitados. Antes de interceptarem, sabíamos de tudo. Quem eles queriam contratar acabou afundando no mar da Orla com concreto, para o cadáver não subir. Eu precisava assumir o lugar dele. Assumi. E estou próximo demais. A ligação interceptada não continha informações falsas. É hoje!

“Por que gosta tanto do Império Romano?”, pergunto.

“Acho que é por causa do filme Gladiador”.

“Com Russell Crowe?”

“Isso.”

“Gosto também de Spartacus. Quase chorei no final.”

“Pensei que matadores não tivessem remorso”.

“Isso é clichê. Temos remorso pra caralho. Choramos muitas vezes. Conheci matador que chorava como criança sempre quando era corneado. Mas a tristeza passava quando ele estrangulava as vagabundas”.

“Desse jeito eu fico com medo de você”, disse o Alvo. Não sei se estava sendo irônico.

“Sabe do que eu gosto no Império Romano?”

Tiro o smartphone do bolso.

“A maneira como eles encaravam o suicídio. Você sabe mais do que eu”, afirmei. E mostrei a tela. Uma foto.

“Gladiadores se suicidavam em combate. A vergonha também era razão muito comum. Um soldado estuprado se matava. Pessoas tiravam a própria vida para evitar sofrer punição judicial. O luto também causava o suicídio. Matar-se para salvar a vida de outras pessoas, como entes queridos, também era uma razão”, ele disse.

“Sabia que você daria uma aula. Olha só essa quantidade de livros sobre Império Romano. Você é um especialista”.

“Era. Mas as 307 acusadoras destruíram a minha vida. Não posso mais dar aula”.

“Que azar.”

“Seu olhar mudou”.

“Ah, é?”

“Eu não queria ter feito”, disse um pecador confessando seu pecado? O apartamento viraria, por alguns segundos, um confessionário? Porém, o expiador de ocasião carregava pecados talvez piores. O preto da “batina” significava cessação da existência.

“Vou na sacada. Volto logo”, afirmei. Precisava de uma lufada de ar fresco. E paciência.

No outro dia, os contratantes notaram um silêncio insólito. Eles ficaram de guarda na noite e madrugada, circulando pelo prédio. Todavia, nem um vulto ameaçador sequer. Naquela manhã, além da ausência de choramingo que cortava o silêncio, perceberam que não conseguiam entrar no apê do cliente. Se tivessem suas próprias chaves, isso não ocorreria, mas preferiram dar “privacidade”. Chamavam, porém o Alvo não atendia. Temiam o pior. Arrombaram. O “pior” logo estava diante dos seus olhos. Overdose de antidepressivos. Morto sobre o tapete. Engoliu inúmeros comprimidos. Uma carta com uma única frase. “Um comprimido para cada acusadora”. Na estante, o livro de Philip K. Dick não estava mais. Nenhum rastro da minha pessoa.

III

Não sabia que o cara era policial.

“Cê é burro, sua desgraça!”, berra o meu comparsa, outro condenado à morte.

O ocorrido que nos condenou: eu estava doido atrás de crack. Mateus, o meu comparsa tinha crack guardado, mas ele estava devendo ao traficante. Tentou ser baleiro. Vendia bala de café no ônibus. Até que um dia trocou tiros com pessoas viciadas em café. Ele viu que ser baleiro era muito perigoso, então passou a ser assaltante. Nós dois precisávamos agir rápido. A abstinência me deixava agressivo. Eu seria capaz de roubar leite de uma criança para comprar droga. E o traficante, conhecido como Will Boca, um bandido discreto, havia dado ultimato a Lucas: “Pague ou vamos te brocar de bala. Você tem alguns dias”.

Antes do aviso, Mateus havia levado um monte de porrada, foi amarrado e levado até um local conhecido como o Jardim dos Perfurados. Toda gangue estava lá e zombava dele, dizendo que ele nunca ia conseguir e por isso estava condenado.

E aqui estamos nós prestes a assaltar uma sorveteria. Seguimos o modus operandi convencional do assaltante: fingir que é cliente; observar o local, de forma discreta; aguardar o momento perfeito; puxar o ferro, ameaçar, render e dar coronhada nos cornos daqueles que parecem ser das classes mais abastadas; ameaçar o caixa do estabelecimento com mais virulência do que os outros. Tudo foi seguido à risca. Foi então que a variável possível, que acabamos esquecendo ou ignorando, se concretizou. Sempre quando metemos o ferro por aí, consideramos inconscientemente que a vítima é alguém indefesa. Nunca esperamos que ela irá reagir. Há aqueles bandidos que são mais alertas e que por isso improvisam com sucesso, acabando com a vítima que reage. No nosso caso, dentro da sorveteria, aconteceu algo que rola de vez em quando com outros bandidos: uma das vítimas estava armada. Ou seja, não era tão indefesa. Que fazer?

É sólito que os bandidos matem a vítima armada. E por quê? Pode ser um policial. Não sei por quê. Mas a bandidagem brasileira costuma apagar policiais à paisana e indefeso. É como se houvesse um manual sugerindo que isso é o que deve ser feito. Matar um possível policial seria uma posição ortodoxa. E eu, que tenho horror a coisas heterodoxas, segui a cartilha. Dois tiros na cabeça. Meu comparsa, Mateus, gritou “não!”. Tarde demais. Deixamos a vítima sangrando no chão.

“Caralho”, berrou Mateus, num local distante do estabelecimento onde ocorreu o crime, “e se ele for policial, sua desgraça burra!?”

“Se for, azar dele”, eu disse, sem perceber o tamanho da merda.

“Não, desgraça!, azar nosso. Tu nunca olha o noticiário? Sabe o que acontece quando policial morre? A polícia revida! Estamos fodidos!”, Mateus anda de um lado para o outro. Ele está com o cu na mão.

“Mateus, calma, estávamos de boné, não vão nos identificar”.

“Cara, se lembra do Sazonal, aquele bandido bom em matemática que matou um policial militar? Ele também acreditava no mesmo que você. Os Homens queimaram ele vivo. Acredite, se aquele cara for policial, vamos ser caçados como animais!”

O bandido acha que nunca vai ser pego, identificado, muito menos morto. A mentalidade que impulsiona a bandidagem pode ser sintetizada na seguinte frase: “vai dar tudo certo”. Se houvesse uma simples cogitação que seria possível ser morto, talvez ninguém tentasse a sorte. Mas a gente acha que vai se dar bem. Não sei de onde tiramos tanta certeza. Nem mesmo Sazonal, um bandido bom em cálculos, conseguiu pensar em probabilidades pessimistas.

O noticiário confirma: a vítima era policial. Estávamos mesmo fodidos. Lembrei de uma canção de Facção Central: o eu lírico da música reflete sobre o sucesso ou fracasso numa tentativa de assalto. Ser bem-sucedido no crime resulta em imediatos ganhos materiais. O fracasso (”já era, fodeu”), porém, implica na morte ou cadeia. Mas a minha situação é diferente, é como se fosse uma síntese do sucesso e do fracasso. Assaltamos a sorveteria e tivemos ganhos rápidos. No entanto, matei um policial no processo. A morte virá mesmo com o sucesso no crime. É como se fosse um destino inevitável. Todavia, não vou me entregar fácil a esse destino. Meu comparsa talvez vá, porém não posso permitir.

Encontrei Mateus, dois dias depois. Fui à casa dele.

“Não era pra você ter vindo aqui, porra!”

“Precisamos reagir a isso”.

“Reagir? Tá louco? Eles têm mais armas!”

“Não é reagir desse jeito.”

“Cara, eu nem durmo direito. Questão de tempo até nos identificarem!”

“O que vai fazer, então?”

“Não sei!”

Mateus estava com medo, vulnerável. Se a polícia pegá-lo, irá torturá-lo para que diga onde estou ou onde posso estar. Não posso permitir isso. Quando ele virou de costas, atirei na cabeça dele. Ao cair, atirei mais duas. Peguei o dinheiro dele e a droga. Ele nem havia pago os traficantes. Fugi. Corri para um bairro onde a polícia evita entrar, o chamado “Formigueiro”. Estou disposto a lutar contra meu destino!

“Some daqui, Marcos!”, disse Juliana, minha ex-namorada e moradora do “Formigueiro”.

“Só por alguns dias, Ju. Por favor!”

“Você tá aqui porque fez alguma merda grande”.

“…”

“Diz o que você fez!”

“Melhor você nem saber”.

“Fala! Ou some daqui!”

“Matei alguém”.

“Meu Deus…”

“Ju, por favor, eu vou morrer.”

Eu nunca machucaria Ju. Ele deixa eu entrar. A contragosto, mas deixa. Não demorou muito para minha cara aparecer nos telejornais locais como um dos “suspeitos” de matar o polícial Paulo Guilherme dos Santos. Um homem de bem, com incontáveis serviços prestados à comunidade. Comoção em toda polícia. O Capitão aparece na TV e avisa: “vamos procurar os suspeitos até no inferno”. Juliana, é claro, se desesperou.

“Você matou um policial! Vaza daqui! É capaz desses caras me matarem junto contigo! Some!”

“Juliana, calma! Aqui é o Formigueiro. A polícia não entra aqui.”

Ela se toca e parece se acalmar. A polícia não entra aqui. O tráfico é poderoso nessa região. O Estado está ausente aqui. É um desses bairros chamados de “Buracos da História”. É a lei do bandido mais forte. Eu estou pagando “aluguel” para ficar aqui no bairro. Estou protegido.

Eu pensava estar protegido. De madrugada, bandidos da área entraram na casa de Juliana. Deram porrada nela e em mim. Um homem chamado Peteka, chefe do tráfico, disse que estavam ali para me tirar do Formigueiro. “A polícia já sabe que você está aqui. Acha que eles não virão? Estão dispostos a trazer um batalhão para cá. Vai ter guerra aqui por sua causa, seu safado. Vamos entregar você de bandeja!”, disse Peteka, que estava furioso. Dentro do carro, onde me levavam, levei várias coronhadas e ainda escutei ameaças e provocações. “Os homens vão comer seu cu antes de estourar sua cabeça e ainda dirão que você reagiu”, disse um dos caras.

“Por favor, não façam isso!”, eu disse. Levei coronhada na boca.

“Para de chorar feito uma puta, seu bosta!”

“Cara, eu sei onde tem muita droga e dinheiro. Vocês derrubariam eles fácil”, eu disse, em última tentativa de evitar ser entregue aos policiais.

“Para de falar bobagem”, disse Peteka.

“É sério. Um tal de Will Boca”, eu disse.

O carro parou de repente.

“Will Boca?”, perguntou Peteka.

Will Boca era discreto. Montou um imenso negócio de drogas. Mas não tinha muito poder de fogo.

“Mateus devia dinheiro a ele”, eu disse.

“Diga o local”.

Disse o nome do bairro. A gente assiste a filmes de ação e acha que outros bandidos engolem conversas assim. Só em roteiros. Mais coronhadas.

“Você está fodido, seu filho da puta”, disse Peteka.

A facção de Peteka tinha alguns policiais em sua lista de pagamentos. A ideia seria me entregar aos Homens. Assim, o batalhão não precisaria invadir o Formigueiro para me matar. Marcaram o local, onde fui entregue para dois policiais corruptos, amigos do policial que matei. Me colocaram no carro e me levaram a outro local. No trajeto, uma única frase: “ao matar seu parça, poupou metade de nosso trabalho”. Não houve ameaças explícitas, nem nada do tipo. Chegamos a um local deserto. Havia mais policiais lá. Todos fardados. De certa forma, era tudo algo teatral, tinha personagens, cenário. Estava faltando montar a cena. Me colocaram num terreno baldio. Estavam prestes a me matar ali. Em seguida, forjarão a cena do crime para parecer que eu “resisti à prisão”. É o fim.

RoniPereira
Enviado por RoniPereira em 04/06/2023
Reeditado em 02/11/2023
Código do texto: T7805053
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