O Assassino do Halloween

Vanessa Bradshaw fez os últimos ajustes na fantasia de bruxa diante do espelho do quarto e colocou o chapéu preto pontudo na cabeça.

- Ficou ótimo! - Disse uma voz atrás dela. Virou-se e ali estava a irmã caçula, Allison, ainda vestida com roupas caseiras.

- Não vai sair? - Questionou Vanessa, mãos na cintura.

- Não vou, e acho que você também não deveria - redarguiu Allison com firmeza. - Há um alerta da polícia sobre esse tal Assassino do Halloween, e olhe só que surpresa... a descrição das vítimas dos anos anteriores bate com a sua!

Vanessa ergueu os sobrolhos.

- Eu também vi o noticiário, Allison - declarou, virando-se novamente para o espelho e ajeitando o cinturão do vestido. - O assassino gosta de ruivas vestidas de bruxa, embora no meu caso seja só uma peruca. Ocorre que todas as garotas que ele matou foram encontradas em locais ermos, e aqui é o centro da cidade; tem muita gente pelas ruas hoje à noite.

Olhou para o reflexo da irmã no espelho; ela ouvia a explanação muito séria e de braços cruzados.

- E ademais, - prosseguiu Vanessa - vou me encontrar com as garotas da equipe de boliche. Somos oito. Quero ver esse tal Assassino do Halloween ter coragem de nos encarar!

E deu uma piscadela para Allison, que levou a mão ao rosto e abanou a cabeça em desalento.

- Gostaria que mamãe estivesse aqui - disse por fim. - Provavelmente, à ela você escutaria.

Vanessa franziu os lábios.

- Que esperança! Mamãe gostava tanto de Halloween quanto eu, você sabe.

E beliscou a bochecha de Allison, antes de sair do quarto.

* * *

Vanessa caminhava apressada pelas ruas cheias de adultos e crianças fantasiadas, rumo ao local onde marcara de se encontrar com as amigas. Tentara parecer jovial diante da irmã, mas na verdade estava apreensiva. Ninguém sabia qual era a aparência do Assassino do Halloween, embora pelo estado deplorável em que as vítimas eram posteriormente encontradas, ele devesse sair da cena dos crimes coberto de sangue. A pergunta era: a fantasia dele incorporava esse detalhe, com sangue falso, ou simplesmente se deixava lambuzar, sabendo que naquela noite ninguém iria reparar num sujeito que poderia estar personificando um zumbi ou canibal?

Ao dobrar uma esquina para uma rua menos movimentada, viu que um furgão de entregas vinha em sentido contrário, devagar, como se o motorista estivesse procurando um endereço. Foi só quando passou pelo veículo, pela calçada oposta, que Vanessa se perguntou: quem estaria fazendo uma entrega, em plena noite de Halloween? Apertou o passo, pois ainda faltavam dois quarteirões para chegar ao ponto de encontro.

O ruído do motor atrás dela, fez com que olhasse por sobre o ombro: o furgão havia dado a volta, e estava vindo agora no mesmo sentido em que ela caminhava. Em pânico, Vanessa olhou ao redor, mas a rua era comercial e ela só viu portas e janelas fechadas.

Antes que pudesse gritar, o furgão parou adiante dela. A porta lateral deslizou e ela foi puxada bruscamente para dentro, um pano com um produto químico pressionado contra seu nariz e boca. Antes de perder os sentidos, ainda viu seu chapéu pontudo rolar pela calçada, enquanto o veículo arrancava. Depois, a porta foi fechada e tudo mergulhou em trevas.

* * *

- Sim, parece o chapéu da fantasia da Vanessa - disse acabrunhada Allison Bradshaw na tarde seguinte, ao ser chamada pela polícia após uma denúncia anônima. Alguém havia visto um furgão sair em alta velocidade de uma rua no centro, quase provocando um acidente, e o adereço estava caído na calçada.

- Você deu parte do desaparecimento da sua irmã hoje, pela manhã, menos de 24h após o desaparecimento dela? - Questionou Melvin Serrano, o detetive responsável pelo caso do Assassino do Halloween.

- Minha irmã era uma vítima em potencial - lamentou Allison. - Eu implorei que ela não saísse de casa, mas não me deu ouvidos... e agora, está desaparecida.

- Temos várias equipes fazendo buscas pela cidade, com base na descrição do furgão, - informou Serrano - mas tenho que ser realista: se ela realmente foi capturada pelo assassino, a probabilidade de que ainda esteja com vida é baixa. Só nos resta desejar que não se trate de obra do assassino serial, mas uma outra situação qualquer.

Allison sabia que esse era um fio de esperança extremamente tênue, mas se apegou a ele. E, no início da noite, suas preces foram atendidas.

* * *

- Onde a encontraram? - Inquiriu Serrano com o telefone preso entre o queixo e o ombro, enquanto rabiscava garatujas num bloco de papel.

- Foi deixada no final da tarde, próxima de uma lanchonete na saída da cidade - respondeu o patrulheiro do outro lado da linha. - Tirando o fato de estar desorientada, com sede e fome, externamente não aparenta sinais de ter sofrido violência.

- É cedo para dizer - atalhou Serrano. - Leve-a para o hospital, fazer o corpo de delito. Estou indo para lá, tomar o depoimento.

- Se ela disser coisa com coisa - replicou o patrulheiro. - Está bem confusa, detetive.

- Vamos ver o que os médicos dizem - insistiu Serrano. - Ela falou algo sobre quem a sequestrou?

- Só sabe que eram dois, mas usavam máscaras de esqui.

- Certo. A perícia talvez possa recuperar alguma coisa nas roupas dela.

Ao desligar, pensou em ligar para a irmã da vítima; mas depois, concluiu que seria melhor tomar primeiro o depoimento no hospital.

* * *

- Allison Bradshaw?

Allison havia atendido no segundo toque; estava próxima ao telefone, caso a polícia ligasse. Mas não era a polícia.

- Sim, sou eu.

- Sua irmã foi encontrada, viva e bem; - disse uma voz masculina. - Ainda está sob efeito do anestésico, mas a polícia já a levou para o hospital e em breve deverão ligar para dar a notícia.

- Quem está falando? - Indagou Allison, apreensiva.

- Somos os responsáveis pelo sequestro de Vanessa - replicou a voz. - Se ela não tivesse saído de circulação na noite passada, hoje seria apenas mais uma estatística de homicídio. Esperamos que ela tenha aprendido a lição.

E antes de desligar, acrescentou:

- O Assassino do Halloween ainda está à solta; ele nunca será capturado.

- [23-07-2022]