Mão Negra - Capítulo 1

Mão Negra

Capítulo 1

Foi numa madrugada de sábado para domingo. Marlene e eu havíamos tido uma baita discussão sobre o fato de eu não lhe dar mais atenção devida. Ela foi a primeira a ir para cama e eu, como sempre, fiquei sentado na varando fumando e bebendo meu Bourbon pensando na vida. Pensando no Mão Negra para ser mais exato. Eu estava chateado demais, pensei em acender outro cigarro ou até mesmo pegar o carro e dar uma volta, respirar um pouco, mas... eu não fiz isso. Apaguei o que restará do cigarro na sola do meu Havaianas e entrei. Marlene fingia dormir. Sentei-me na ponta da cama e comecei a acariciá-la por debaixo do coberto. A princípio houve uma certa resistência, mas aos poucos ela foi cedendo.

- Vamos nos entender? – eu disse.

- Venha logo.

A alegria com minha mulher durou vinte minutos. Fizemos amor como nos velhos tempos de namoro. Marlene estava sensacional naquela noite. Depois do banho eu já tinha relaxado na cama e o sono começava a dar as caras quando meu chefe me ligou. Marlene não disse nada, apenas murmurou baixinho, me xingando provavelmente.

- J.A falando. – atendi.

- O ladrão atacou novamente, foi num motel bem próximo daí, vá pra lá agora.

Mais que merda! Pensei.

- Tudo bem.

Encerrei a ligação e virei-me para minha mulher que já não queria mais assunto comigo.

- Tenho que sair.

Ela deu de ombros.

Eu amo ser policial, é o que eu sei fazer de melhor, mas confesso que tem dias – como esse por exemplo – que de verdade eu penso em jogar tudo para o alto e desistir. Mas não adianta. Tenho a lei correndo em minhas veias, minha missão ainda não acabou. Enquanto eu não puser às mãos no maldito do Manuel Clemente eu não vou me aposentar, não vou desistir. Foi o que fiz. Me vesti, peguei as chaves, meu distintivo e minha arma e fui. Caí na madrugada.

*

Cheguei ao motel por volta das duas da manhã aborrecido e com sono. Desci do carro fechando o zíper da jaqueta e olhando ao redor buscando visualizar Amorim. Ele ainda não havia chegado, graças a Deus, porém minha animação durou pouco quando olhei para a recepção do estabelecimento e reconheci Pavanelli conversando com um suposto funcionário do lugar. Empurrei a porta e entrei.

- Grande João Antônio. – disse ele com aquele sorrisinho enviesado que tanto me irrita.

- Pavanelli. Como chegou tão rápido? – coloquei às mãos no bolso da jaqueta.

- Sabe como são às coisas né, um jornalista precisa estar antenado, mesmo na madrugada. – mostrou o celular.

A minha vontade era de agredi-lo, mas verdade seja dita, Pavanelli querendo ou não já me foi muito útil em outros casos. O bicho é inteligente.

- O que temos aqui? – olhei ao redor.

- Mão Negra ataca novamente. – apontou para o cartão de visitas do ladrão em cima do balcão. Uma folha de A4 com uma mão negra xerocada toda amassada.

- Caramba! – exclamei cansado. – e quanto foi dessa vez?

- Hum, o grande J.A precisando da ajuda da imprensa? – desdenhou.

- Fala logo.

Pavanelli sacou seu bloquinho de anotações. Minhas pernas estavam bambas.

- Segundo me relatou o gerente, ele saiu daqui com 15 mil reais, fora os pertences dos clientes.

- Carambolas! – falei entre os dentes. Nesse momento Amorim empurrou a porta da entrada furioso.

- O que ele faz aqui? – vociferou.

- Boa noite para o senhor também, delegado.

Celso Amorim odeia o Pavanelli mais do que eu. Essa guerra já é antiga, desde quando estávamos atrás do “Piloto”, um traficante de drogas perigoso que, graças a intromissão de Pavanelli, um dos nossos policiais quase foi morto. Hoje o pobre agente vive numa cadeira de rodas sobrevivendo de uma aposentadoria de merda.

- Vou pedir uma vez só: saia. – falou Amorim com o rosto vermelho feito um pimentão.

- Mas... – encolheu os ombros.

Amorim gesticulou para os dois PMs que o acompanhavam e os mesmos avançaram pra cima do jornalista indefeso.

- Isso é censura hein. – gritou.

- Tire esse bosta daqui.

Ele se virou para mim.

- Alguma pista?

- Acabei de chegar. – pigarreei. – só temos aquilo por enquanto. – lhe mostrei o papel.

Contei tudo o que Pavanelli me falou ao delegado. Andamos pelo motel, olhamos quarto por quarto atrás de uma pista que nós dois sabíamos que não existia. Conversamos com clientes, funcionários e chefia. Lá pelas tantas saímos do lugar ainda sem nada nas mãos. Amorim estava visivelmente frustrado.

- Ele se safou novamente.

- Se o senhor quiser eu posso montar uma equipe de busca e...

- Não. Esse caso já era. – abriu a porta da viatura. – quero você às nove no meu gabinete. Temos que alinhar nossas ideias. Já passamos da hora de prendermos esse otário.

- Certo.

Os pneus da viatura deixaram poeira para trás e eu permaneci ali, parado olhando para o motel. Eu também estava frustrado querendo arrancar a cabeça do miserável, mas isso não me levaria a lugar algum. Eu também não queria ir para casa, então resolvi enfiar a cara no trabalho. Voltei para dentro do motel e fui até o gerente.

- Preciso das imagens das câmeras de segurança. Agora.

Júlio Finegan
Enviado por Júlio Finegan em 18/05/2022
Código do texto: T7518740
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