A Primeira Testemunha

- Verdade que já tem o caso Veenstra resolvido? - Indagou o comissário Sibe Pasma, ao encontrar o inspetor Palle Wagenaar datilografando um formulário em sua escrivaninha, na Delegacia de Homicídios. O interpelado puxou do rolo o documento, contendo a transcrição do depoimento recém-dado por Sasje Koster.

- Por ora, temos apenas um bom depoimento, comissário - admitiu Wagenaar. - A testemunha descreveu um homem que viu de relance, saindo do apartamento de Roimer Veenstra na noite do crime, e eu convoquei o porteiro da noite para prestar informações. Ele provavelmente poderá nos ajudar a montar um retrato falado do suspeito, já que ninguém que não seja visitante pode entrar no prédio sem passar pela portaria.

- Alguma pista sobre quem seria o assassino? O que esse Veenstra fazia? - Questionou Pasma, braços cruzados.

- Veenstra era professor de literatura na Universidade Van Tuinen, mas estava afastado do trabalho há seis meses para tratamento de saúde - recordou o inspetor. - Não tinha filhos, parentes na cidade, nenhum relacionamento íntimo conhecido e poucos amigos próximos com acesso à sua residência. Como os porteiros do prédio de Veenstra têm que consultar o morador antes de autorizar que um visitante suba, é pouco provável que um completo desconhecido tivesse acesso ao mesmo; o morto conhecia ou tinha negócios a resolver com o assassino, isso é certo.

- E esses porteiros mantém um registro dos visitantes? - Inquiriu Pasma.

- Aí seria esperar demais, comissário - lamentou Wagenaar. - Mas pelo retrato falado que pensamos obter, é possível que alguém do círculo profissional ou de amizades de Veenstra possa identificá-lo. Ao menos, tenho essa esperança; não creio ser provável que o assassino tenha ficha criminal e esteja em nossos arquivos fotográficos ou de impressões digitais.

- Então está descartando a hipótese de que o assassino tenha antecedentes, apesar da brutalidade do crime? - Questionou Pasma.

- Vamos averiguar, - apaziguou-o o inspetor - mas pelo estilo de vida do professor, aparentemente não há nada que o ligue a criminosos convictos.

- A hipótese de latrocínio também está descartada?

- Se o homem que a minha testemunha viu era mesmo o assassino, não parecia estar carregando nenhum pertence volumoso do morto - ponderou Wagenaar. - Localizamos a carteira de Veenstra, com algum dinheiro nela, e um relógio de ouro, no quarto. Todavia, os móveis da sala e do quarto foram revirados... mas ainda não sabemos o que estava sendo procurado ou se o assassino teve sucesso na busca.

E antes que o comissário perguntasse:

- Veenstra não era um homem de posses; tanto o prédio quanto o apartamento dele, são modestos. A quem interessaria a morte de um professor universitário pobretão?

Pasma deu-lhe uma palmadinha amistosa no ombro.

- É precisamente o que eu quero que descubra, inspetor. O chefe de polícia me ligou, perguntando como está o caso... a imprensa, você sabe.

E afastou-se, para falar com outro policial.

Wagenaar colocou o formulário numa prancheta com uma esferográfica presa à ela por um fio de nylon, e foi até a sala de espera da delegacia, onde Sasje Koster o aguardava.

- Por favor, leia e se estiver tudo correto, date e assine - solicitou.

A mulher balançou a cabeça em concordância e leu atentamente o depoimento. Finalmente, apanhou a caneta e datou e assinou o documento.

- E agora? O que acontece? - Indagou ela calmamente.

- Se tivesse visto o rosto do homem, poderíamos tentar fazer um retrato falado - redarguiu o inspetor.

- Não, realmente não vi - afirmou Sasje Koster.

- Então, se quiser um café ou refrigerante antes de sair... - sugeriu Wagenaar.

A mulher o encarou de um modo curioso.

- Hoje não, inspetor. Quem sabe, noutro dia... eu posso lhe ligar?

- Para falar sobre o caso? - Indagou Wagenaar.

- Naturalmente - acedeu ela.

E estendeu a mão direita, que Wagenaar apertou.

[Continua]

- [08-08-2021]