Perigo à espreita
Em algum lugar distante dali, na cidade vizinha de Eucadócia, um grupo de amigos discutia e fazia uma festa para celebrar o ano que se passou. Com uma mesa farta por comida, bebidas e 4 malas lotadas por dinheiro, além de sacos de drogas, a aparente algazarra parecia sem fim e sem a menor preocupação com polícia ou quaisquer investigadores. Até que um som interrompe a conjunção desarmônica de barulhos, os quais silenciaram como se estivessem diante do seu rei. Ou melhor, da sua rainha.
- Eita que a farra está boa aqui, hein? Posso saber o motivo?
- Ooo, oi dona Natasha. A gente tava celebrando as últimas aquisições né? O último mês foi muito bom pra nós.
- Ah, é mesmo? E como diabos vocês tão contando? Vão encher os copos com dinheiro ou usar pra limpar os rabos é?
- Não, não, a gente já vai contar...
- Ah, é mesmo? Que bom, aproveitem pra levar esse dinheiro pro lugar onde ele deve ficar: o cofre no subsolo. Ah não ser...
- Não entendi senhora.
- Ouse repetir isso, e não terá nunca mais o dom de duvidar... Soldado.
A expressão de susto misturada com horror se espalhou entre os membros da gangue causando como efeito o fim da festa. Em poucos instantes, todos aqueles homens e mulheres correram como nunca para jogar as latas de cerveja e os restos de comida no lixo, colocando as malas para contar os dinheiros dos negócios da gangue na mesa, afinal negócios são negócios.
Todo aquele alvoroço também se explicava na figura que se avizinhou à mesa. Com seus 1,65m, cabelos castanho claros, ondulados, calças jeans, blusa verde escura, bastão numa mão e lábios da cor de sangue, Natasha realmente fazia a sua presença ser temida. Naquela manhã, ainda contava com o destaque de ter chegado com marcas de sangue no bastão e algumas manchas pelo braço, sinal de que havia "repreendido" alguém há pouco tempo. Não poderia ser subestimada.
Todavia, pouco sabia ela que estava na mira de Hector e Letícia. A suspeita pelo ataque e morte de Luís permanecia como uma sombra sobre a sua cabeça, algo que dava de ombros, especialmente agora que estava morto e o delegado corrupto fora preso no processo. Os peões do seu jogo de xadrez não falhavam ao script que escrevera. Algo que mudaria em breve...
Passada uma semana, Natasha foi informada da busca feita por Hector e Letícia por um de seus informantes na cidade, que leu uma matéria de jornal sobre a morte de Luís e a derrubada da gangue chefiada pelo delegado. O susto veio quando as investigações citaram o seu nome como suspeita e verdadeira "mentora" do assassino. Algo que a revoltou, a ponto de jogar fora seu cigarro, enquanto reclamava da sorte.
- Como essa merda aconteceu? Quem foi o filho da puta que me dedurou?
- Nã-, não sei, senhora. Só vi isso no jornal hoje.
- Mas que porra, Esteves! Não serve pra nada, mesmo! Vaza daqui, vaza, antes que eu mude de ideia.
Intrigada e irritada com aquela reviravolta, Natasha previa a queda do delegado em um embate que acabasse com ele e Luís somente, não que voltasse pra ela de algum jeito. Tudo aquilo parecia errôneo e inaceitável, visto que, ao terceirizar a missão para os Lâminas, não pretendia ver o seu nome envolto nessas brigas de rua. A pergunta que a intrigava era: como chegaram até ela?
No jornal, não aparecia a investigadora Melissa, responsável por atuar infiltrada e acabar com a gangue. Porém, na matéria do jornal, Hector era o destaque, agora como chefe da investigação, cujas suspeitas recaíam em Natasha, numa tentativa de retaliação pelo que acontecera com Luís e pela caos provocado à delegacia.
Em poucos instantes, a raiva de Natasha transformou-se em adrenalina e felicidade numa declaração "indireta de guerra" que sentia na pele ao ler aquela matéria de jornal, o que a mobilizou a procurar manchetes e as fichas de Hector na Internet e nos contatos que possuía pelas redes. Agora, sentia a vontade dançar "um tango da morte", deliciando-se com a possibilidade de detonar Hector em pedaços e mostrar quem era a "dona do pedaço".
Enquanto isso, do outro lado da cidade, Hector entrevistava um dos membros do grupo Lâminas sem sucesso. Recebendo respostas vazias e ambíguas sobre as ações do grupo, antes do seu ataque à Luís, Hector decidiu brincar com o suspeito usando os dados de sua pesquisa particular.
- Então, Dênis, todas as suas ações eram limitadas por um chefe, correto?
- Todos têm chefes, não é detetive? Até você, ali atrás, ó?
- Sim, sim, é verdade, só que a minha chefe não costuma cortar os outros, igual a sua, correto?
- O que você quer dizer com isso?
- Não sei... O nome Natasha Aimes traz alguma lembrança?
O suspeito, outrora brincalhão, começa a demonstrar um nervosismo, com os olhos revirados, mas tentando manter a pose, disfarçou.
- Não, eu nunca ouvi falar dessa mulher não...
- É mesmo? E por que os seus batimentos cardíacos subiram tanto e você passou a suar com frequência? Coincidência, não é detetive Melissa?
- Rapaz, agora que você falou, eu achei mesmo! E o que será que ela faz com delatores hein?
Nesse momento, demonstrando nervosismo, o detento virou-se para a dupla de detetives, decidido a cortar um acordo.
- Pe... Peraí, ô chefia. O que vocês tão pensando fazer?
- Ah não sei, a gente ia colocar a conta das nossas descobertas sobre a gangue na sua conta. Não parece legal?
- Oh, oh, peraí amizade, não faz isso comigo não... O que que você quer saber, hein? A gente pode se ajudar e fazer um bem bolado né?
- Olha só... Agora, podemos conversar né?
E as cortinas de uma nova guerra começam...
O Andarilho