2-4-0: Assassinato, traição e chantagem (parte 8)
Uma semana passou tranquilamente, Janice não teve novos problemas, mas era hora de encontrar o réu mais uma vez. A promotora chegou ao presídio onde estava preso João Paulo e foi encaminhada por alguns policiais à sala reservada para o encontro.
- Nós vamos interferir em qualquer comportamento agressivo de qualquer um de vocês, mas o que será dito lá dentro não será ouvido por nós – disse Jânio, querendo passar segurança para a promotora.
- Agradeço novamente a vocês.
- Ele é seu, doutora.
Janice entrou na sala encarando o assassino com raiva.
- Matou um amigo meu, causou o acidente de outro e está observando meus filhos. Onde pretende chegar com isso?
- Considere como um troco por bisbilhotar minha vida.
- Eu fiz isso sem matar ou machucar pessoas. Você tirou um pai de seus filhos e quase fez isso de novo quando causou o acidente do Saulo.
- Foi você quem tirou um pai de seus filhos, graças à sua insistência ele aceitou o serviço e perdeu a vida.
- Por que você faz isso? Que motivo você tem para matar as pessoas?
- Acho que isso você já descobriu. Eu disse que você sabia melhor do que eu o significado do número.
- Agora eu sei, mas não entendo seus motivos.
- Depois do que passei quando jovem, eu senti que devia eliminar os que traíam seus companheiros, como meu pai fez com a minha mãe. Logo depois que meu pai morreu fui criado por uma tia muito religiosa e que me fez voltar a fé para o lado dela. Dediquei-me muito ao estudo da Bíblia e aos ensinamentos da Igreja. Não deve ser difícil entender a cruz no peito das vítimas.
- O padre contou tudo a mim.
- Padre Francesco, um grande homem, ensinou-me tudo que sei sobre Deus e Jesus.
- Interessante, mas você acha que isso era mesmo motivo para matar?
- Pra mim é motivo suficiente, contraria os mandamentos do Senhor. Nunca quis que a Igreja fosse responsabilizada pelo que eu fiz, sempre responderei por meus atos e não me arrependo do que fiz.
- Por que você tem que matar as pessoas? Uma punição não basta?
- Eu acredito que o homem não aprende com as punições, tanto que existem vários criminosos que continuam agindo.
- Eu notei algo muito interessante, você mata apenas homens. Por que não mulheres?
- Eu nunca pensei em assassiná-las, talvez porque tenha sido meu pai que cometeu o adultério e não o contrário.
- E o número no papel? Você não sabia que adultério nem é mais considerado crime?
- Como se eu me importasse com isso, o número é só mais uma marca minha, como a cruz.
- Então, já sabemos o seu motivo sem fundamento, mas ainda não imagino como você escolhia as vítimas. Como saber que eram autores do adultério ou apenas participavam dele?
- Tem uma coisa que você precisa saber promotora. Estou sempre um passo à sua frente.
- Não é difícil de perceber, cuidou do Jefferson rapidamente e fez tudo aquilo ainda por cima. Responda-me uma coisa. Jefferson também traía a esposa? Por isso você o matou?
- Não foi obra minha, meu advogado cuidou de tudo. Como pode ver, estou algemado e estive na prisão todo esse tempo, além do mais, não mato por outro motivo que não seja o que você sabe.
- Ótimo, tenho o que preciso – disse Janice dirigindo-se para fora da sala.
- Vejo que não leu minha carta – provocou o assassino.
- Como? Perguntou a promotora.
- Não leu a carta que enviei a você, se tivesse lido provavelmente discutiria comigo.
- Como assim? Que carta?
- Leia antes e depois fale comigo. Resolveremos depois que você souber o que eu quero.
Janice saiu da sala e agradeceu novamente aos policiais.
- Hoje não teve nada estranho – disse Jânio.
- Hoje agimos como pessoas civilizadas, até me surpreendi, sendo um assassino.
A promotora não voltou ao escritório, foi direto para casa.
- Ai meu deus. Que carta é essa? Perguntou Janice e procurou onde ficavam as correspondências.
- O que procura aí meu amor? Perguntou Marcos. O que está aí é apenas correspondência velha.
- Procuro algo do trabalho.
- E acha que está aí?
- É uma carta que o Silvio me mandou há um tempo, preciso achá-la.
- Bom, se eu encontrar algo parecido te entrego.
Janice não encontrou o que queria até a hora do jantar e durante o momento tentou imaginar onde estaria a carta enviada pelo assassino. Marcela perguntou:
- Falta pouco pra você tirar férias mãe?
- Sim minha querida, agora falta pouco.
- Quer dizer que vamos logo visitar a vovó? Perguntou de novo a filha.
- Sim, sim, vamos visitá-la.
- Coma mais querida – disse o marido. Você comeu tão pouco até agora.
- Tudo bem, vou pegar mais comida.
Mas Janice comeu sem vontade, não conseguia parar de pensar no que o assassino lhe dissera. A promotora estava cansada demais, como naquele dia em que recebeu uma carta e não leu, pois estava exausta.
- Já sei! Exclamou a promotora.
- O quê? Perguntou Marcos.
- Nada demais.
Janice lembrara-se de onde tinha enfiado a carta e correu para seu quarto. Chegou ao seu aposento e abriu a gaveta, lá estava o envelope guardado há dias, retirou-a como um tesouro de um baú, mal imaginava que seu conteúdo não corresponderia à sua animação. No papel estava escrito:
“O que vale mais? Sua carreira ou sua família? Pense na pergunta e me dê uma resposta.”
Janice ficou assustada com o conteúdo da carta, colocou-a de volta no envelope e escondeu numa gaveta que era fechada a chave.
- Está bem querida? Saiu correndo da mesa de jantar.
- Estou sim. Muito bem – mentiu a promotora.
- Então tá. Vou tomar banho. Pode cuidar das crianças na sala?
- Já estou indo.
Janice estava cansada de mentir para o seu marido, há anos que ela fazia isso. Sempre temeu pelo bem da família por causa de seu cargo. Já recebera ameaças antes no exercício da profissão e estava acostumada, mas o que estava por vir parecia ser muito pior do que antes. A noite daquele dia foi perturbadora para a mãe daquelas crianças, a promotora não tirou da cabeça a pergunta que continha na carta.
No dia seguinte seu chefe entrou na sala e viu Janice derrubada em sua mesa.
- Vamos tomar um café? Convidou-a o promotor de justiça.
- Por que não fez o convite antes? Respondeu Janice.
Os dois sentaram numa mesa do refeitório e pediram duas xícaras de café puro.
- Continuo preocupado com você, na verdade estou mais preocupado ainda.
- Pegue a senha e entre na fila.
- Não venha com brincadeiras, isso é extremamente sério. Sua vida inteira está em jogo dessa vez, não é como as outras vezes, esse criminoso é muito mais perigoso que os outros que você já enfrentou.
- Não precisa dizer, ele já o fez ontem. Segundo ele, está sempre um passo na minha frente.
- Percebo que é verdade. Estou avisando do perigo há muito tempo, você está sobrecarregada, seus filhos estão correndo perigo, um amigo seu morreu e outro sofreu um acidente induzido pelo réu. O que ainda falta acontecer para você tomar atitude?
- Você soube dos meus filhos?
- A diretora da escola falou comigo, me deu uma bronca por expor você e sua família a perigos constantes.
- O que você disse?
- Que seria o seu último caso no ano, depois você vai tirar férias por um período prolongado.
- Como?
- Não discuta comigo. Você sabe que precisa descansar por um tempo, as folgas que estou dando a você são apenas adiantamentos das suas férias.
- Eu preciso encontrar o réu mais vezes.
- Está fora de cogitação agora.
- Então tenho que passar por cima de sua ordem – respondeu a promotora e voltou para sua sala.
- Que bicho teimoso, mas é incrível.