Os Segredos da Rua Baker 3: 32- Irene Holmes

Os Holmes estavam confortavelmente acomodados nos sofás e poltronas vitorianos que foram pessoalmente escolhidos pelo Mycroft, quando, no melhor estilo ninja, Irene surgiu no meio da sala quase concedendo uma parada cardíaca a cada um deles.

Diana correu para abraçar a irmã, Lilian adoraria fazer o mesmo, porém, por motivos óbvios, decidiu se conter. Irene garantiu estar bem e confessou que a convulsão, juntamente com o estado inconsciente, aconteceu apenas como uma forma de ludibriar o Sigerson.

Logo se puseram a comentar a respeito da evolução do John em fingir tamanho desespero.

-Aprendi com a melhor. – Ele disse, ao abraçar Irene e lhe ofertar uma piscadela como brinde.

Esse gesto tão singelo fez Irene, pela primeira vez, sentir seu rosto esquentar.

A mãe da Alex sugeriu transformarem aquele momento raro, em que todos os Holmes e agregados estavam juntos, no jantar de noivado da filha com a Jasmine.

Em uma grande mesa de madeira, Mycroft e Sherlock foram colocados cada um em uma ponta, enquanto de um lado ficou a senhora Meankovich junto da Alex, Jasmine e Lilian; do outro lado estavam John, Irene, Diana e Sean.

Esperançosamente, John escorregou a mão dele por debaixo da mesa para segurar a da Irene que estava entretida em uma conversa com a irmã.

-Você está bem? – Perguntou Diana. – Ficou toda vermelha de repente.

-Tenho me sentido meio febril ultimamente. Porém, notei acontecer sempre que o...

-Irene! – John chamou a sua atenção.

-O que?

-V-v-você está gostando da comida? – Foi a única pergunta que conseguiu pensar.

-O que?

-Oh! – Exclamou Diana entendo tudo.

Algumas horas se passaram, eles se encontravam na sala da lareira tomando um conhaque. Jasmine exibia feliz o anel que ganhou de sua noiva.

Irene perto da janela os observava com um leve sorriso nos lábios, ela pensava em como suas ações dali pra frente valerão a pena, pois só assim os manterá vivos e livres, talvez, não serão inteiramente felizes, porém nenhuma tristeza é permanente.

Afundada na incerteza de seu futuro, ela não percebeu a aproximação da Lilian.

-Não pretendia assusta-la. – Ela disse, em tom de desculpas.

-Você não me assusta, Lilian.

-Sei disso... Irene, eu...

-Lilian, eu apenas culpo o Sigerson. Você pode parar de tentar encontrar perdão para a toda a sua traição inconsciente.

-Nunca poderei parar de buscar o seu perdão e da sua irmã também. Espero um dia conseguirem voltar a confiar em mim e sermos felizes como antes.

-As porcentagens para que seu sonho se torne real é baixa, é claro que depende de como me sairei amanhã, mas no fim, Lilian, você é parte dessa família... – Irene pousou rapidamente a mão no ombro dela. – E é minha mãe.

Irene se afastou deixando Lilian quase aos prantos.

Era uma noite atípica para a família Holmes, entretanto não havia nada de incomum no fato da Irene se esgueirar até o escritório do tio e do fundo de uma parede falsa retirar uma garrafa de uísque que deveria custar mais que uma mansão em Chelsea.

Duas batidas na porta a roubou de seu delicioso momento de degustação.

-Soldado...

-Apenas vim saber se está tudo bem.

-Por que não estaria?

-Irene, eu sei que pensa que sou estúpido...

-Nada pessoal, soldado, a grande maioria é.

-Ok. Vou reiniciar. Eu sei que tem algo errado.

-Como?

-Você parece triste quando acha que ninguém está prestando atenção.

-Essa foi a coisa mais estúpida que já ouvi.

-Você não precisa fingir pra mim. Ninguém fala nada, mas todo mundo ali sabe que você tem um plano e, com certeza, vai ser algo bem idiota e perigoso.

-Idiota não. Perigoso sim. – Ela tomou mais um gole do uísque antes de guarda a garrafa. – Você está certo, cunhado. Não estou bem. –Disse, depois de soltar uma pesado suspiro. -Amanhã será um momento decisivo, porém independente das consequências, eu estarei satisfeita, pois é o único jeito de deixar todos vocês seguros e livres.

Antes dela sair, Sean a segurou pelo pulso.

-E quanto a você?

-Por que se importa? Oh, é claro, Diana. Apenas permaneça ao lado dela por um tempo, ela logo ficará bem. – Irene hesitou por alguns segundos. – Ela escolheu bem. Você é um dos bons, mesmo sendo tão estúpido na maioria das vezes. Boa noite, soldado.

-Por Deus, obrigado, eu acho.

John já havia se recolhido quando Irene decidiu fazer o mesmo, mas, se surpreendeu ao não encontra-lo em seu quarto. Ela vagou por cômodos até dá de cara com um John usando apenas uma cueca boxer preta.

-Sempre atende a porta desse jeito? E se fosse a Diana ou a Jasmine?

Ele mostrou um largo sorriso.

-Ciúmes?

-Por que continua a me fazer essa pergunta? Você sabe que não consigo entender ciúmes.

-Eu apenas estava me preparando para dormir e atendi a porta sem pensar.

-Ok. Isso me traz de volta ao ponto. Por que está aqui? Por que não está no meu quarto?

-A governanta me acompanhou até aqui.

-Você deveria ter ido direto para o meu quarto. O que? Não quero ter pesadelos, afinal amanhã será um dia decisivo...

-Falando nisso, qual o plano? Você não me disse nada a respeito dessa parte.

-Oh, você está com raiva. Começa a me incomodar o fato de como sua mudança de humor tem sido tão frequente.

-Você que não prestava atenção. Irene, você disse que faríamos isso juntos.

-Não significa contar cada detalhe. John, não se preocupe, você é parte disso.

-Mas...

Ele se viu estático quando Irene encostou seus lábios nos dele dando início a um beijo ardoroso. Ainda com os braços ao redor do pescoço do inspetor, ela disse:

-Eu ouvi minha irmã e a Jasmine falando a respeito de uma regra do terceiro encontro. Creio que esse seja o nosso terceiro.

John não pensou duas vezes, afinal, ela poderia mudar de ideia, então apenas abraçou a sua cintura e a levou para dentro do quarto fechando a porta imediatamente.

No dia seguinte, com tudo pronto para voltarem a casa do Sigerson (ele havia mandado um carro), com Irene não contando o que se passava por sua cabeça e John com um sorriso de orelha a orelha, Sherlock decidiu intervir.

-Não deve fazer o que está pensando.

-Você não faz ideia sobre o que estou pensando, Sherlock.

-Quer que eu diga em voz alta?

Dessa vez uma atmosfera de um pesado azul caiu sobre os ombros dos Holmes, então Irene apenas deu uma rápida olhada para o John seguindo para a sala de música, com o pai logo atrás.

-Antes de dizer qualquer coisa, Sherlock, me responda: por que escolheu esse caminho? Por que lidou com o Sigerson dessa forma? Fugindo?

-Isso novamente. Eu fiz o melhor...

-Que pôde? Você não fez, sabe disso. Eu te avisei sobre o Sigerson e você fingiu não acreditar. Se tivesse agido desde o primeiro instante...

-Você se lembra de tudo mesmo.

-Sim. Infiltração teria sido melhor. Talvez em dez anos o colocaria atrás das grades. Eu queria ajudar... Eu te ofereci ajuda.

-Você era uma criança!

-Ainda assim teria ajudado, mas ao invés disso...

-Eu sei que agi errado...

-Então... Por quê?

-Porque eu estava desesperado! Nunca me imaginei tendo uma família e quando tive, eu não podia... Não conseguia abrir mão. Preferi aceitar o plano do Mycroft, ir pra longe, deixar vocês seguras, mas ainda sendo minhas filhas. O pior acabou sendo para a Lilian, eu sempre soube quem estaria com ela, mas a deixei lá. Todo o seu sofrimento de antes e de agora é minha culpa.

-Então, você não pode me recriminar, Sherlock. Você acima de todos tem de me entender. Eu estou desesperada.

-Irene, tem outro jeito. Juntos nós podemos...

-Não. Eu estava bem com o cativeiro, em cuidar das empresas, em ver o Sigerson tentar ter minha mente e meu corpo. Saberia lidar com tudo isso e em dez anos, mais ou menos, eu teria provas o suficiente, talvez não para uma prisão formal, mas para puni-lo através da Cúpula dos Nobres.

-O que a fez mudar de ideia?

-John. Não consigo vê-lo sofrendo por eu ser torturada... Eternamente com medo dos pais serem assassinados. Não permitirei que ele viva dessa forma.

-No entanto, você poderá fazê-lo sofrer uma dor descomunal.

-Ele irá se recuperar. Assim como todos os outros... Só mais uma coisa. Eu não te culpo mais, nem te odeio ou qualquer coisa do tipo. Consigo entender tudo mais claramente agora. – Ela se aproximou do Sherlock lhe dando um beijo no rosto. – Cuide bem da família. Adeus, pai.

John ainda esperava perto da porta; Irene lhe disse que teria um pequeno ato emotivo antes de saírem: eles se abraçaram por um tempo. Irene ainda sussurrou para que fizesse o possível para perdoa-la.

Fora da casa de Mycroft Holmes e na frente dos homens do Sigerson o espetáculo já se deu início. Irene parecia desesperada para chegar logo a mansão do tio, assim que chegaram, ela se jogou aos seus pés implorando por perdão.

Ele sorriu sarcasticamente para John, que apesar de saber do teatro, ainda assim se viu desconfortável com a cena. Irene foi além, pela pressa teve de exagerar, então beijou o tio.

-Eu pertenço a você. – Lágrimas começavam se formar nos seus olhos. – Meu corpo, minha alma, tudo é seu. Irei cuidar das suas empresas, te ajudarei a ser Primeiro-ministro... Você tem de ser Primeiro-ministro. Essa nação precisa da sua ajuda para prosperar.

-Você é boa em esconder as suas micro expressões.

Sigerson levantou, ela suplicou para ter permissão de segui-lo, pois não aguentaria qualquer minuto a mais longe dele. Apesar de desconfiado, ele assentiu.

Não demorou tanto quanto o esperado, em apenas três dias Sigerson já estava convencido e feliz por, finalmente, ter dobrado a sobrinha. Irene parecia um robozinho adestrado com seus vestidos chiques, maquiagem impecável e penteado moderno.

Naquela manhã haveria uma reunião do partido para oficialmente indicarem o Sigerson como Primeiro-ministro, pois era algo no qual já vinha mexendo os pauzinhos para conseguir fazia alguns meses.

Irene estava a ponto de explodir, havia chegado a hora de acabar com toda essa merda que vinha suportando, mas nunca conseguia ficar sozinha com o tio. Contanto que o Sigerson morresse, ela não se importaria com consequências. Todos estariam salvos de um monstro e essa era sua recompensa.

Pouco antes de seu discurso, Sigerson a viu em seu verdadeiro eu: sem maquiagem, cabelo solto, usando seu velho jeans surrado, uma camiseta cinza escura, botas quase caindo aos pedaços e, seu acessório mais marcante, a jaqueta de couro. Ele não poderia fazer nada a respeito naquele instante, por isso apenas suprimiu a raiva indo em direção ao palanque.

Quando a chamou fazendo uma pequena piada sobre seus trajes, ele notou imediatamente um olhar diferente no rosto da sobrinha.

-Esse será o fim? – Ele perguntou. – Forcei muito? Pelo menos, você gostou de termos ficado juntos nesse delicado jogo?

-Você deveria ter deixado o John fora disso. E se eu gostei? Não.

Ela estourou os miolos do tio na frente de todo o partido, jogando a arma longe e levantando os braços em seguida. Apesar dos seguranças, muitos deles homens do Sigerson, John continuava no comando ordenando repetidamente para não atirarem na Irene que já estava no chão sendo algemada.

***

Jasmine adentrou como uma ventania no escritório da noiva interrompendo a conversa dela com Mycroft. Ela imediatamente mostrou um vídeo da Irene matando o Sigerson, deixando-os em choque.

-A salve! – Disse Mycroft, com a voz trêmula. – Você tem de salvá-la.

***

Diana sorria assistindo uma comédia, ouvindo o barulho de pratos quebrando na cozinha, ela levantou apressada. Sean mostrou celular para esposa.

-O que ela fez, Diana? Por que...?

-Para nos salvar. Ela se sacrificou... Por Deus, Irene...

Sean envolveu a esposa em seus braços, enquanto ela começou a soluçar entre lágrimas pesadas que desciam queimando o seu rosto.

***

Em alguns meses todos os vídeos do assassinato foram apagados e a história virou quase uma lenda urbana. Alex lembrou aos membros da Cúpula dos Nobres que apesar de ter dado um passo errado, Irene ainda era a Mestre, sendo assim, eles deveriam penaliza-la fora dos preceitos considerados normais a sociedade.

Depois de passar seis meses em uma solitária, Irene se despedia de seus familiares antes de ser colocada em um jatinho a caminho de uma missão que duraria alguns anos.

-Todo aquele papo de cuidar da Diana fez sentido. Não se preocupe, cunhada, eu vou tomar conta dela direitinho.

-Para seu próprio bem, que isso seja verdade.

-Vamos viver o resto das nossas vidas a base de ameaças?

-É meio que uma coisa nossa agora, cunhado.

Ele se afastou passando a vez para Diana que se jogou nos braços da irmã.

-Qual é, Diana, eu não estou indo para uma missão fatal. Para de chorar.

-Eu sei, mas vamos ficar sem nos ver por anos. Não é justo você estar sendo punida desse jeito. Você salvou esse país inteiro.

-Irmã, eu estou recebendo uma punição leve por ser Mestre da Cúpula. – Irene disse, ao afastar a irmã para se fitarem. – Vamos encarar a realidade, eu sou uma assassina. O Sigerson não foi minha primeira vítima, eu matei muitos para conseguir essa posição de Mestre.

-Eram todos homens perversos. E... E você fez por boas razões.

-Uma assassina não pode ser uma heroína. Irei pagar minha pena e quando voltar serei digna desse título. – Irene tomou a iniciativa de abraçar a irmã. – Apenas cuide todos por mim.

-Ok.

Era chegada vez do John.

-Essa era a razão de querer meu perdão.

-Esperou tanto tempo para colocar essa frase pra fora.

Eles sorriram.

-Sabe qual será seu destino?

-Croácia. Vou precisar de um aliado. Sr. Colin é um dos bons.

-Oh. Ele. Por que não eu?

-Você acabou de voltar do mundo dos mortos. Deve ter muito trabalho na Scotland Yard. Também esse caso é bem perigoso. Prefiro ter ao meu lado alguém que não me faça ficar preocupada ao se machucar.

-O que aconteceu na casa do Mycroft...

Ela o abraçou e Sean começou a pular todo feliz.

-O que está fazendo? – Perguntou Diana.

-Eu sempre shipei esses dois.

-Shi o que?

-Depois te explico.

-Lilian conquistou o Sherlock devagar. Com paciência. Preenchendo cada espaço da vida dele sem ser notada. Você fez o mesmo.

-O que?

Irene Holmes, finalmente, beijou John Smith sem ter qualquer motivo escondido por trás desse gesto.

-Espere por mim. – Ela disse, antes de entrar no jatinho.

***

Cinco anos se passaram, ela estava sentada na bancada de um bar quando um homem se sentou ao lado. Sem pronunciar uma palavra, ele passou um envelope, com o símbolo da coroa britânica, para Irene.

-Como poderia recusar? Vou, finalmente, poder rever meu marido.

Ela sorriu.

***************************Fim****************************

ALANY ROSE
Enviado por ALANY ROSE em 20/08/2020
Código do texto: T7041743
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