Johnny?
Olavo adentrou o escritório de Luís e se surpreendeu com a muvuca que tinha lá dentro. Armários abarrotados, poeira pra todo lado, o que fez com que pensasse com carinho na faxineira que limpa sua casa, quem sabe até desse um aumento pra ela... Felizmente, sabia onde procurar, devido às instruções de Luís, caso contrário, já teria desistido há tempos dessa missão. Sua missão era encarar um arquivo com três gavetas e uns mil casos arquivados, frutos de duas décadas de trabalho. Mole? Bem, isso renderia uma bela sexta...
E foi assim que Olavo encarou, após abrir uma Heineken e começar buscando os arquivos cuja inicial do nome começasse com J. Depois de pegar uns cinquenta casos com nomes de João, José, Jorge, só na lista com sobrenomes que iniciados por A, como Antunes, Andragon, Almeida, Olavo se perguntou se essa seria uma boa estratégia. Isso o fez olhar para os sobrenomes seguintes, e, ao perceber poucos casos com sobrenomes da letra B e C, decidiu largar a letra A e mergulhar nesses casos, vai que daria mais sorte?
Sua intuição, realmente, o ajudou. Ao mergulhar nesses novos sobrenomes, conseguiu encontrar dois casos, cujo culpado chamava-se Johnny. Ao ler os casos, observou que, em um deles, Johnny tinha um irmão pequeno na época, que ficou bastante chateado pela prisão. Ao olhar a data, julho de 2008, levantou a hipótese dessa criança, agora um rapaz na casa dos vinte e poucos anos, não ter agido no ímpeto da emoção contra aquele que "destruiu a sua família". Seria esse o caso?
Na cabeça de Olavo, aquilo ressoava muito como uma trama malfeita e repetida de uma novela das 20h. De todo modo, não poderia ignorar a única pista que tinha, posto que esse foi um dos poucos casos cujo suspeito chamava Johnny, com a inclusão de um familiar próximo, com motivação suficiente para cometer um crime.
Fuçou, fuçou, fuçou. E lá se foi um dia inteiro. Ao final das suas investigações, chegou a juntar 5 casos de suspeitos "Johnny's", levando-os no seu encontro com Luís, com o intuito de separá-los para, quem sabe, dois suspeitos finais.
Fazia quase uma semana desde que Luís o pedira para estudar seus velhos casos. E tinha alguns anos desde o último encontro com ele. Jamais imaginaria o reencontrar numa cama, descansando, enquanto recuperava-se de uma facada. Todavia, como velhos amigos, seria uma boa oportunidade para quebrar o gelo.
- Mas não é que te pegaram?
- Você some por anos e é assim que chega? Logo na zoeira?
- Ué, se quisesse flores, que chamasse uma de suas paqueras... Ou então, aquela menina, a, Letícia!
- Hahaha, justo justo. Mas, me diga. O que essa cabeça aérea conseguiu encontrar?
- Então, pelo que pude ver, ao longo de sua carreira, você prendeu várias pessoas, e, destes, 5 me chamaram a atenção, justamente por se chamarem Johnny. E nesse pequeno universo, dois se destacaram: Johnny Cortazar e Johnny Valak.
- Desenvolva.
- Johnny Cortazar tinha 23 anos e foi preso após se envolver com tráfego de drogas e prostituição. Durante a sua prisão, um de seus primos foi baleado e ficou paraplégico, o que poderia facilmente mobilizar uma vingança direcionada ao investigador do caso, no caso, você, em parceria com a polícia, em um ato feito pelo seu irmão, à época de menor, mas hoje, já um jovem adulto.
- Hmm, interessante. E o outro?
- Johnny Valak, preso após assaltar bancos e contrabandear órgãos, por todo o Brasil e em parte da Europa, sua prisão interrompeu vários negócios, o que pode ter irritado muita gente a ponto de enviarem alguém pra te atacar.
- Mesmo sendo um ataque feito com uma faca?
- Qual a melhor maneira pra despistar rastros, senão mandar um "zé-ninguém" agir?
- Mas e a raiva dele?
- Poderia ser fruto de provocações, ameaças, enfim, n possibilidades.
- Mas aí, dificilmente encontraríamos o autor.
- Justamente, mas esses dois casos me chamaram a atenção devido ao fato de eles possuírem parentes residentes nessa região.
- Sério?
- Sim. Uma rápida pesquisa pelas redes sociais aponta para pelo menos umas 10 pessoas de cada um por aqui.
- E os demais casos?
- Nenhum deles, apresenta residentes nessa região. O mais próximo está morando há uns 10 h de viagem daqui.
- Olha só... para quem estava há tanto tempo parado, até que você se saiu bem.
- Claro que sim. Investigar é como andar de bicicleta: uma vez que se aprende, não se esquece.
- Mas você não sabe andar de bicicleta...
- Aprendi no ano passado.
- Caramba, isso que é novidade!
- Então, podemos agir?
- De fato, em que posso te ajudar?
- Você consegue fazer um retrato falado de quem te atacou?
- Eu fiz um pra polícia há alguns dias, mas posso fazer outro pra você.
- Faça e me mande por e-mail.
- Certo. Ah, tem uma pessoa que pode te ajudar nessa missão.
- Quem?
- O Hermeto, ele tem contatos no meio da periferia e pode te ajudar a entrar.
- Você trabalhou com ele?
- Digamos que sim.
- E dá pra confiar?
- Sem dúvida. Ainda mais, porque você não deixa preguiçosos em paz...
- Não mesmo. Bem, vou me indo. Quaisquer novidades, informo.
- De acordo. Grato pela visita. Até.
- Até.
Luís pensava se seria uma boa usar Hermeto pelos contatos e sujeiras de seu passado, todavia seria a última chance que daria para sua redenção, ao mesmo tempo que poderia ver se, realmente, ele estava sendo observado. Seria um sucesso ou um duplo fracasso?
O andarilho