OLHA O "CREMOZIIIN" !

OLHA O "CREMOZIIIN" !

Planejado como uma Brasília o bairro era quase um "labirinto", a urbanização igualando ruas e casas, construídas da mesma forma e tendo todas números semelhantes, "pulando" de 10 em 10, "esperteza política" para aumentar (?!) a quantidade delas. O município -- jovem ainda -- cresceu à sombra de três fatores nefastos: falta de empregos, terceiro posto em homicídios no Estado, sétimo nacional em assassinato de rapazes até 20 anos... e nada indicava melhora. Daí, sair de casa a qualquer hora sem sofrer algum tipo de violência era "loteria".

"Seu" Gumercindo -- já "queimando óleo 6.7" -- escondeu como pôde o fato de que estava para meter as mãos numa "bolada federal" em razão da tardia aposentadoria. Não deu... teve que fazer cópia do aviso de pagamento numa "lanhouse" e aí começou sua desgraça. Os donos do "cyber", 2 irmãos, contactaram amigos do interior para sequestrá-lo, um irmão do "Matusalém" pagaria o resgate. Simples assim, coisa comum no país inteiro, a tal "saidinha" ficara muito arriscada. Entretanto, as coisas se complicaram... jogado dentro de um carro quando passeava de manhãzinha com o vira-lata, o velho confessou que nem seu irmão gêmeo sabia a senha da conta bancária e, pior, seu celular vivia desligado para poupar bateria porque estavam sem energia elétrica, por atraso no pagamento. Os meliantes recorreram ao velho sistema de bilhete e Romercindo ao jovem PM "Marcelão", amigo de longa data dos irmãos, com quem jogava Xadrez. Para não pôr em perigo a vida do idoso decidiu-se pagar o resgate, mantendo a Delegacia longe do caso. Uma "vaquinha" de amigos próximos juntou a quantia exigida -- que nem era tanto assim -- e postaram "olheiros" com binóculos nas 2 pontas da avenida, junto à pracinha onde o pacotinho foi deixado, dentro de uma lixeira, meia-noite.

Anotaram a placa do carro velho, as digitais no bilhete não foi possível, seria necessário envolver a Polícia Civil no caso. Contatos de "Marcelão" conseguiram no Detran o endereço do dono, procurado na manhã seguinte ao pagamento. Esforço inútil: êle revendera o calhambeque para um sujeito no interior, cidade muito distante... o jeito foi esperar a volta do velho, libertado já noite avançada -- tremendo mais do que aluno ruim em dia de prova final -- grato a Deus por estar vivo. Consultado, o ancião declarou que ficara numa casa qualquer a 10 minutos dali, não mais do que isso, num porão, que de tardezinha passara alguém na rua vendendo "CREMOZINHO" -- espécie de "sacolé", suco de frutas congelado -- e que, naquele momento, uma casa tocava a velha canção "Quem eu quero não me quer"... o velhinho do sorvete caseiro "rodava" a cidade inteira, era muito conhecido. Bateram na casa dele de madrugada, acordou assustado mas lembrava bem da música, era no boteco do "seu Dico", na rua tal, quadra tal.

Em 2 carros comuns lotados de PMs, os anciãos conversando concluíram que o sorveteiro "estava vindo" de encontro à música, passando depois pelo lar dos vagabundos. Restava definir de que lado da rua ficava o "cativeiro", logo que o "camelô" lhes indicasse qual fôra o seu trajeto.

Revelado o percurso feito, selecionaram 2 casas de cada lado e "vestidos como ninjas" entraram como manda a "tradição", arrombando as portas. Foi consenso que, caso se anunciassem, os sequestradores poderiam se evadir, fugir do local. Batendo com os coturnos no chão de cada cômodo, em uma das casas deu "éco". Sob tapete surrado, portinhola de madeira escondia a escada rústica e um cubículo de 2 x 2 metros, sem luz nem banheiro. Solucionado o caso, restava localizar a grana do resgate,

-- "Era a pensão de uma velha tia" !, justificou um bandido, quando o militar encontrou-a dentro da lata de feijão, a quantia quase integral. Comparando os números de série com a relação trazida, desmascararam o tratante. Receberam os 2 alguns "carinhos" e o conselho de sumirem da região... ou "sumiriam" êles !

Estavam explicados diversos sequestros misteriosos. A lanhouse amanheceu depredada, um prejuízo de uns 10 mil reais. No boletim de ocorrência seus donos confessavam não compreender a razão daquilo tudo !

"NATO" AZEVEDO

(2/nov. 2019, 5hs)