Passos...

Hermeto estava nervoso naquele momento, tendo em vista toda a sua história e seus erros para com, agora, sua ex-mulher. A ideia de ter um filho parecia ser a oportunidade perfeita para se reconstruir seu nome e deixar um bom legado. Seria uma forma de ser melhor visto por sua ex-cunhada cuja perseguição deixara marcas em sua cabeça.

Todavia, nem todos pensavam assim. Horácio (se é que esse era seu nome mesmo) mostrava muita curiosidade pela trajetória daquele homem desconhecido, uma vez que seguia-o até o hospital. Algo que não se explicaria por vias lógicas, pois não tinha amizade, tampouco o conhecia, mas como não agia há algum tempo, preferiu observar ao longe para decidir o que fazer. Precisava ver se seriam interessantes o bastante para investir.

Entretanto, não contava que aquela fosse a família de Letícia, que conhecera tempos atrás. Exatamente por isso, decidiu observar ao longe, pois, ao ver a reação animada do homem, percebeu que ele sentia falta da ex, e, agora que viria a ser pai, poderia formar uma família novamente. E famílias eram o seu tipo preferido de vítimas. Enquanto refletia sobre isso, pôde ouvir uma voz alta de alguém que não fazia a menor questão de ser discreta:

- Ah, então você veio? Quer ganhar o quê aqui? Pai do ano?

- Olá Letícia, bom te ver também. Como ela está?

- Como ela está? Bem, está com uma barriga grande, estresse acima do normal, xingando Deus e o mundo. Acho que tá bem, né?

- Hahaha, eu até que senti falta desse sarcasmo, viu?

- Oh, que fofo! Eu quase consigo esquecer o escroto que você é quando você diz isso!

- Olha aí, ainda conseguimos nos entender... Eu posso vê-la?

- ...

- Anda Letícia... Eu já tô aqui pra isso, porra!

- Olha o palavreado, rapaz! Isso aqui não é a sua casa!

- Desculpa... Mas, vai fala...

- Aff... Está bem, guenta um minuto aí que eu vou ver.

- Obrigado.

- Hey, o Hermeto está aqui pra ver o menino...

- E por que diabos ele ainda está lá fora? Mande entrar, logo!

- Sério?

- Vai, Letícia! Deixa de enrolar!

- Tá, tá!

- Olha, seu maldito pode ir.

- Agradecido.

- Oi... como você está?

- Estou gorda, estressada e com contrações a cada 5 minutos, então acho que estou bem né?

- ...

- Anda, vem sentir o bebê chutando.

- Sério? Posso?

- Vai logo! Você é o pai desse troço, mesmo!

- Si.. sim. Nossa, que incrível!

- É seu filho, Hermeto. Lembre-se de cuidar dele.

- Claro que sim! E já tem um nome?

- Já. Será chamado Eduardo.

- Gostei.

- É, mas vê se não ver ser um pai ausente pra ele. Porque você foi um marido péssimo...

- Eu sei... eu sei... Se eu pudesse voltar no tempo, faria diferente...

- Será mesmo?

- Confie em mim. Tudo o que aconteceu me fez refletir muito...

- Não sei... e agora não estou em condições de naaada!

- O que? O que foi?

- Arf... arf.. Foi uma contraçãaao. Ui! Estão cada vez piores!

- Pela madrugada! Letícia, chame o médico por favor!

- Já está chegando! Aqui, doutor.

- Ok, ok, vamos ver como está a sua dilatação... Hmm 9 cm... É, você está perto de dar a luz, vamos para a sala.

- Letícia veeem.

- Não tenha nem dúvida.

- Eu posso ir também?

- Melhor não. Fica aí que eu te aviso quando tudo terminar.

- Mas..

- Foi o que você plantou, agora aguenta.

Enquanto via um resignado Hermeto voltar para sala de espera do hospital, Horácio ficava curioso com aquele momento, sobretudo com Júlia, tanto pela sua beleza quanto pelo seu temperamento agitado e firme para com o ex, uma cena altamente improvável até uns meses atrás. Pensava como seria interessante uma "conversa" com essa família, enquanto os torturaria até o fim de suas vidas. E para sua surpresa, um nervoso Hermeto queria conversar...

- Caralho, será que vai demorar muito?

- Desculpa, está falando comigo?

- Não, não, só estou ansioso porque meu filho nasce hoje.

- Ah, meus parabéns, rapaz! É menino ou menina?

- Menino. Ele se chamará Eduardo.

- Ótimo nome. É o seu primeiro filho?

- Sim, sim.

- E a sua esposa está animada com a ideia?

- Ela não é minha esposa... Estamos no meio de um divórcio...

- Que pena, ainda mais com um filho a caminho.

- É, mas eu acho que ainda podemos nos acertar.

- É bom pensar assim. Uma família unida favorece o crescimento saudável da criança.

- Com certeza.

Sentindo conformo e compreensão nas palavras de um estranho, Hermeto pensava se essa era a sua chance de redenção depois de tanto tempo. Ter um novo começo, ensinando a uma criança parecia o ideal para alguém tão estragado pelo sistema. Para Horácio, ele era apenas parte de uma de suas experiências. E antes que a conversa se aprofundasse, veio a notícia:

- Ei, "cunhado". Nasceu seu filho. Venha conhecê-lo. Ei, você não me parece estranho...

Será que Horácio seria reconhecido?

O Andarilho

Rousseau e o Andarilho
Enviado por Rousseau e o Andarilho em 26/10/2019
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