(in memoriam de O. Borges Rodrigues)

 

      Apago o cigarro no palco da noite, a arma está na cintura. Ontem foram à praia tentar me matar, não me acharam. Saí da polícia há dois anos, tudo bem, "quebrei alguns", traficantes em sua maioria, outros assaltantes, estupradores... Cumpri meu papel. Não vou salvar o mundo, nem levar todos a lide da toga, é alheia as ruas e passa longe da realidade. Aliás, a tal qualidade de vida,  faz isso com as pessoas. Aqui no pavilhão de existências e esquinas, almas agonizam e a vida, tem alta rotatividade... É puta, malandro, assaltante, proxenetas e o "polícia", no meio da merda! Não tenho tantos bens, um carro velho e um dois quartos no subúrbio, não me locupletei da profissão, apenas agi como achava certo. Amanhecendo vou tomar um café no Espanhol, bonachão, mulherengo e amigo. Afinal, não consigo dormir, paira essa tal "ameaça".
    - Espanhol, bom dia!  Põe um café e pão com queijo branco na chapa.
Costumeiramente sempre responde: - Por ahora Orlando, mi hermano. Mas, silencia...

Ouço então o primeiro estampido. Merda! Arrancou minha orelha, saco a 45 e quebro o filha da puta. Porra, tem mais dois, acertaram minha barriga. Descarrego o restante do pente no cabeludo que me acertou.  Ele cai, o outro escapa. Manolo que estava abaixado, se aproxima e segura firme minha mão, deve estar com medo. Olho para a figura de São Jorge tatuada em meu antebraço, ela sorri. Minha cabeça roda e tudo fica rubro. Deus ou sei lá quem se aproxima, em segundos o dia em vermelho se apaga...