O ASSALTO

“CONTOS”

ROBERTO CARLOS CARDOZO

O assalto

Os dois Velhinhos

Sobrenatural

Um homem de coragem

O ASSALTO:

- Homem, ta faltando açúcar, leite e manteiga! - Disse a Tião, sua mulher.

- Não tenho dinheiro, o serviço ta escasso, o Tche Alcides disse que me arrumaria algum, mas falhou.

- Quem manda eu ter casado com um homem de pouca fé. Ta ai o que acontece!

Murmurou Alvina.

- Mulher insuportável, essa, qualquer dia desse eu vou me dar bem, ai eu dou um pontapé nela. Pensou Tião.

Pegou o seu chapéu, passou a mão espalmada na cabeça e enterrou o chapéu e saiu porta a fora. Na rua quase que um carro o atropela. Chega ao bar da esquina, sobe os três degraus de acesso.

- Bom dia a todos!

- Chega mais! - Disse Alcides.

Tião encostou-se no balcão e disse ao bodegueiro.

- Serve um trago!

- O de sempre?

- Sim!

Tião tirou o chapéu e, começou a girá-lo com as duas mãos na altura da barriga. E, disse a Alcides:

- Eu não agüento mais, minha mulher esta cada vez mais insuportável a cada dia que passa. Eu tenho que arranjar algum dinheiro.

- Tenho um trabalho para nos, e a maior moleza. Eu já to na espreita a mais de uma semana.

- De que se trata?

- Após semanas observando a casa, aquela lá da esquina, cercada de muros altos, construída no pé do rochedo. Veja ta aqui, tudo anotado na carteirinha. O proprietário sai todas as sextas feiras exatamente às 19h30 horas e retorna as 00h30. O motorista retorna às 21h00, saindo as 00h00 para retornar com o patrão as 00h30. A mansão fica completamente vazia das 19h30 às 21h00 horas e das 00h00 as 00h30.

- Amanhã é sexta feira, vamos limpar a casa enquanto eles estiverem fora. O que é que tu achas Tião?

- Eu to necessitado, pra mim qualquer trabalho me ajuda. Mais, Tche Alcides, me arranja algum por hoje, se eu chegar a casa sem dinheiro, minha mulher me mata.

- Só posso te arranjar cinqüenta mangos. Ta bom?

- Quebra o galho por hoje.

- Amanhã vamos forrar a mala.

No dia seguinte, Tião encontra com Alcides as 19: h00 e, começam a espreitar a mansão, que é conhecida como a casa do pé do rochedo. A casa tinha os fundos engastados na rocha. Suas laterais ficavam escondidas por uma murada de pedra de mais de dois metros de altura. Um portão em aço com afresco em bronze, na mesma altura dos muros, era a única via de acesso ao casarão.

Tião olhando os muros e o portão, coça a cabeça, colocando a mão por dentro do chapéu, que quase lhe cai da cabeça, e diz:

- Não vai se moleza! Temos de escalar o muro, é só com escada.

- Que nada Tião! Vai por mim, nos temos de surpreender o motorista quando retornar às 21 horas. Ele abre o portão com o controle remoto de dentro do carro. Quando ele chegar, nos fingimos que estamos passando, quando o carro entrar nos entramos juntos e o rendemos com o revolver.

Como foi dito, foi feito. O mordomo não esboçou nenhuma reação e, ainda disse aos dois assaltantes:

- Eu sou apenas um mordomo, não sou vigilante do patrimônio do patrão. Fiquem calmos que eu prometo não reagir.

Tião tremia como uma vara verde, até parecia que o mordomo era quem o estava assaltando. E, que eles eram os assaltados. O mordomo os levou para dentro da casa. Porem alertou que a meia noite teria de buscar o patrão. Ao qual Alcides lhe disse:

- To sabendo, eu estou controlando os movimentos de vocês há mais de 30 dias. Não se preocupe que até a meia noite nos limpamos a casa.

- Perfeitamente cavalheiros.

Respondeu o mordomo.

- Vamos deixar de embroma e vamos direto ao que interessa, onde é que o patrão guarda a grana? Jóias e outras coisas de valor?

- Eu posso lhes mostrar, mas vai ser difícil o acesso aos valores do patrão. Acham que ele os deixaria comigo, se eu os pudesse alcançar. Não, ele guarda tudo em um cofre inexpugnável. Mas vamos negociar. Eu facilito as coisas para vocês e vocês me dão uma recompensa. O que acham da idéia.

- Parece boa. – Respondeu Alcides, mas que tipo de ajuda você pode nos dar?

– É isso ai! Como é que tu podes nos ajudar? – Perguntou Tião.

- Acontece que eu somente trabalho para o velho, esperando que um dia eu possa achar a combinação do cofre. Mas vocês são do ramo, devem saber arrombar um cofre?

- Sim, nos somos do ramo e vamos abrir o cofre, onde é que ele está?

Nessa altura dos acontecimentos, os dois assaltantes já tinham relaxado a vigilância ao mordomo, que passara a ser um parceiro interessado.

- Sigam-me senhores.

O mordomo segue por um grande corredor. A casa era uma fortaleza, construída toda em pedra basalto. As portas do interior da casa eram em madeira de lei, as ferragens eram em latão, sempre bem polidos. Ao chegarem ao final do corredor. O mordomo para frente de uma porta e diz:

- A partir desta porta eu nunca tive acesso, quero crer que aqui é que o patrão guarda seus valores. Dessa forma o primeiro trabalho dos senhores e abri-la.

- Isto é comigo mesmo. – Disse Alcides, retirando da maleta uma chave mestra. Após poucas tentativas a porta estava aberta. A pouca claridade do corredor, não era suficiente para que chegassem a enxergar no interior da sala recém aberta. Alcides dirigindo-se a Tião diz:

- Tião entra e procura uma chave de luz.

Este adentra no recinto e começa a apalpar a parede a procura de uma chave para ligar a luz. Alcides inquieto pela demora de Tião, também entra na sala e começa a procurar como acender a luz.

O mordomo fecha a porta e ambos ficam encerrados no interior da sala escura.

No interior da sala ambos os assaltantes, continuam a procura, ate que Tião encontra o interruptor de energia e a luz e acesa. No centro do salão um grande lustre pendia do teto a mais de 4 metros de pé direito. Cortinas vermelhas forravam todas as paredes. Duas grandes janelas em uma única lateral. O piso em madeira de lei reluzia ao refletir a luz que vinha do alto. Uma grande mesa centralizada no grande espaço da sala. Em duas paredes laterais, poltronas em couro negro se destacavam. Na outra parede uma estante de livros tomava conta de todo o espaço.

Refeitos do susto inicial, os assaltantes se dirigiram à janela que, certamente, dava para o pátio. Abriram-na, mas, uma grade em aço tornava impossível à saída, tudo em vão.

- Tião! Disse Alcides.

– Vê em que sinuca nos metemos, quero que quando pegar o mordomo tu batas nele até cansares.

- Ta bem Alcides, mais o que vamos fazer agora?

- Procuramos uma saída desta sala. A porta não há como abrir, pois o maldito mordomo passou ferrolhos na porta. As janelas têm grades de ferro de 20 milímetros de diâmetro. Acho que estamos presos nesta merda.

O grande relógio de pendulo que se encontrava engastado na estante de livros, começou a badalar. Os incautos começaram a contar as badaladas, que foram 10, ou seja, eram 22 horas. O telefone toca. Ambos começam a procurá-lo. Tião o encontra esta em uma mesinha, entre duas poltronas. Alcides atende:

- Alo! – Aqui é o mordomo! Vamos negociar?

- O que é que você quer?

- Quero saber tudo sobre vocês, quem são família, parentes e tudo o mais. Você como você é?

- Sou o loiro, e me chamo Alcides Guilherme Rodrigues. Sou mais conhecido como Gui.

- Sr. Gui, eu preciso saber com quem estou fazendo negócios, quero ver se vocês são de confiança. Se eu achar que posso confiar em vocês eu os solto, caso contrário serão entregues a policia, quando o patrão chegar.

- Não, não seu mordomo, eu juro que nóis somos de confiança.

- Então me fale sobre sua família e parentes.

- Eu sou apartado da mulher, não a vejo há vários anos, não tenho emprego, faço alguns biscates de vez em quando. O tião.

– Deixa o Tião para depois que eu falo com ele. Você tem parentes?

- Tenho, mas são do interior, não tenho contato com eles há muito tempo.

- Mulher! Você tem uma mulher?

- Não, não, tenho apenas uma vadia para ficar.

- Filhos! Tem filhos?

- Não, não tenho filhos.

- Passa o telefone para o Tião.

- Tião fala tudo o que ele perguntar, ele quer ver se somos de confiança, para nos soltar.

- Alo, aqui é o Tião falando.

- Sr. Tião. Conte-me todo sobre você, por exemplo: É casado, tem filhos, parentes, têm emprego, amigos íntimos?

- Tião informa que é casado, não tem filhos, é desempregado e não tem amigos íntimos.

- Mais Tião, como é que vive com a sua mulher?Bem?

- Não senhor, eu nunca tenho dinheiro e ela esta quase que me dispensando, por causa disso.

- Mas Sr. Tião! Sua mulher sabe que esta aqui, isto e que esta assaltando esta casa?

- Deus o livre, se ela sabe disso me dispensa de vez.

- Onde ela pensa que você esta neste momento?

- Pensa que estou de guarda em algum lugar, e o que eu digo quando estou fora de noite.

- Passa o telefone para o Sr. Alcides.

- Alo e o Alcides.

- Sr. Alcides! Temos mais um problema para resolver, antes de eu abrir a porta. Os Srs. Tinham um revolver, o qual exibiu no assalto, lembra?

- Sim Senhor!

- Pois bem! Quero que pegue uma corda que se encontra dentro da gaveta dessa mesa em que esta o telefone, abra uma das janelas e através da grade de aço, baixe o revolve com a corda, trave-o antes para evitar disparo acidental. Após havê-lo largado feche a janela. Faça isto agora. Eu fico no telefone esperando, que me avise quando tudo estiver pronto.

- Sim senhor.

- Passado alguns instantes.

- Alo seu mordomo já larguei o revolver.

- Fechou a janela?

- Sim, senhor. Agora o Senhor Vai abrir a porta para nóis sair? Não vai?

- Não acho que vocês estão me escondendo alguma coisa importante.

- Juro por deus seu mordomo, nos não escondemos nada. Não senhor.

Os dois detentos, nada mais ouviram a não ser o badalar do relógio de meia em meia hora. Os raios de sol os acordara pela manhã, deitados nos incômodos sofás, que lhes serviram de cama. O telefone toca. Ambos correram para alcançá-lo. Tião chega primeiro.

- Alo quem fala.

- E o mordomo. Prestem bem a atenção? Vocês estão vendo a estante contendo livros, pois bem, no centro há um relógio, no lado direito do relógio há um espaço vazio, com uma aba em meio circulo. Forcem para que a aba gire, haverá o café da manha para uma pessoa, retire , espere, a pos gire novamente. A propósito se necessitarem de um banheiro, basta abrir a cortina da parede contraria a dos sofás, haverá uma porta que os levara a um banheiro, no armário encontrarão roupas de trabalho.

Dois dias se passaram. Os então prisioneiros estavam atônitos, embora fossem bem alimentado, seu futuro era incerto.

No amanhecer do terceiro dia, o telefone toca, Tião corre para atendê-lo.

- Alo! Aqui é o Tião falando.

- Bom dia Sr. Tião! Aqui é o mordomo falando. Srs. Na prateleira giratória há dois pares de algemas, peguem-nas e coloquem-nas um no outro. Mas antes olhem para o alto e verão uma câmara de televisão, estarei observando-os. Após estarem algemados, coloquem os capuzes na cabeça, apertem bem os cadarços no pescoço, não se preocupem que há um tubo para entrada de ar pelas costas.

Passado alguns instantes, o mordomo fala novamente ao telefone.

- Srs. Estão prontos? Vou-lhes apresentar o Senhor Delegado de Polícia que veio para levá-los a penitenciaria.

- Que furada nóis demos Tião!

- Nóis vamos apodrecer na cadeia. E, eu vou perde a minha mulher.

- A porta é aberta, o mordomo a porta diz:

- Senhores apresento-lhe o Senhor Delegado de Polícia. Sr. Manfredo de Assunção.

- Estes são os larápios, que os estavam assaltando? Bem, vamos levá-los.

Os dois inofensivos pelas algemas e pela falta total de visão, não tinham como esboçar qualquer resistência.

- Vamos seus pilantras, vamos dar um passeio até a penitenciaria.

- Os dois prisioneiros, foram conduzidos até o carro, e colocados no banco posterior. O carro, um Ford Landau, com vidros com película escurecedora. O carro partiu. Após mais de duas horas de viagem, o carro estacionou. O delegado falou:

- Chegamos, vamos descer.

Ambos desceram do veiculo e foram conduzidos a uma cela, onde lhes foram retiradas as máscara. O carcereiro que lhes tinha tirado as máscaras, também lhes serviu o almoço, nessa oportunidade tendo lhes informado que a tarde seriam levados a presença do Senhor Juiz para que fossem sentenciados. Às 14 horas ambos foram conduzidos, porem ante o carcereiro lhes colocou a mascara e as algemas, informando que esse procedimento era para evitar que se evadissem durante o trajeto. No carro novamente fizeram uma viagem de mais de uma hora ate chagarem ao tribunal. Subiram e desceram escadas, portas foram abertas e fechadas, ate que estavam finalmente dentro da sala do tribunal. As máscaras foram novamente retiradas. O tribunal estava completamente escuro, apenas uma luminária sobre a mesa do magistrado. O Senhor Juiz bateu com o malhete em uma madeira e disse.

- Os réus foram presos quando assaltavam uma residência a mão armada. O que tem a dizer em suas defesas?

- Alcides se antecipa a Tião e disse:

- Senhor Juiz. Nóis não temos serviço e por isso que resolvemos para não morrer de fome assaltar a casa, mas prometemos que se o Senhor Nos livrar desta, nóis morremos de fome, mas não vamos mais assaltar casas.

Tião assentia com movimento da cabeça em sinal positivo.

O Meritíssimo ao ouvir a confissão assim se pronunciou:

- Os réus são confessos, eu os sentencio a seis meses de trabalho em uma mina do estado. Esta encerrada a audiência de julgamento.

- O guarda que os tinha levado, coloca-lhes as mascaras e os encaminha de volta. Portas são abertas e fechadas, escadas são subidas e descidas, adentram no carro e este viaja por mais uma hora. E, estaciona, os detentos são desembarcados e conduzidos a uma cela, com duas camas, e um sanitário ligado à cela, onde havia um chuveiro, um vaso sanitário, uma pia e um armário, onde havia toalhas e roupas em uma prateleira, na outra havia roupas de trabalho de mineiro. O carcereiro lhes disse:

- Descansem por hoje, amanhã às 6 horas serão despertados para o café da manhã as 07h00min, serão conduzidos à mina para o cumprimento da pena.

- Na manhã seguinte os sentenciados foram, algemados, encapuzados e conduzidos à mina.

A mina era formada por um túnel, com dimensões de 2 metros de altura por 3 metros de largura. Os dois apenados foram amarrados em grilhões e presos por correntes a um bloco de concreto armado que pesaria cerca de um tonelada. Antes de deixá-los, o carcereiro lhes informou como deveriam proceder na execução do trabalho. Era simples, bastava com o uso de um rompedor pneumático, quebrar as rochas, enquanto um manejava o rompedor o outro retirava com o uso de picareta e pá as partes removidas da rocha. E, as colocasse em uma vagoneta, que se encontrava sobre trilhos, nos trilhos havia 10 vagonetas a serem enchidas. Dada às instruções o carcereiro disse que retornaria ao meio dia para conferir o trabalho e medir a produção. E, evidentemente lhes trazer o almoço. Vendo-se sozinhos, os dois detentos, sentaram no bloco de concreto e começaram a conversar. Tião lamentava, pois tinha certeza de que quando fosse solto não mais seria recebido pela esposa, e mais o que diria a ela? Alcides disse que quando saísse, após o cumprimento da pena, ia para São Paulo. E, jamais retornaria à Palmas. Assim passaram conversando até o meio dia, entre um assunto e outro, rompiam uma pequena porção de rocha.

Ao meio dia retorna o carcereiro, e vê que os detentos tinham enchido apenas uma e meia vagoneta. O carcereiro se afasta dizendo que iria trazer a comida, após 5 minutos retorna trazendo dois pratos contendo umas minúsculas porções de comidas, bem variadas e muito saborosas. Os detentos reclamam que não podem passar fome. O guarda apenas lhes diz que a comida é proporcional ao trabalho executado.

Afastou-se informando que às 18 horas seria servido o jantar.

Assim os dois detentos não tinham alternativa a não ser de trabalhar cada vez mais para receberem uma alimentação farta e de boa qualidade.

O tempo passa e ao final de 6 meses de trabalhos esmerados. Os dois sentenciados, são finalmente postos em liberdade, para tento, foram levados à presença do magistrado que os tinha sentenciados. Foram advertidos de que se retornassem, seriam enviados para uma prisão federal e lá apodreceriam. E, assim foram levados a uma estrada e soltos. O landau que os levara até o local da soltura, partiu deixando os dois a beira da estrada.

Passados vários meses, Tião adentra no bar do Gordo a procura de Alcides. Lá estava ele tomando uma cerveja, com mais dois amigos de infortúnio.

- E, ai Tião, estes são o Rodrigão e o Alcidão, meus novos amigos.

- Os quatro se cumprimentaram com apertos de mão. Alcides quebrando o silêncio disse:

- Imagina tião que os dois acabaram se serem soltos, após a tentativa de assaltar o casarão do pé da montanha. E, por incrível que pareça a historia foi a mesma que aconteceu conosco.

- Enquanto isso no Casarão.

- Sr. Marco Gianturco! Eu acho que devemos interromper o sentenciamento de trabalhadores na exploração dos diamantes. Considerando que o pátio já está completamente aterrado pelos resíduos proveniente da escavação da mina 1.

- Eu concordo plenamente, considerando, que temos diamantes para negociar para os próximos 2 anos. E, vamos convir que a nossa farsa de delegado e juiz, pode ser descoberta. Embora fosse a nossa palavra contra a de delinqüentes e marginais. Mesmo assim poderíamos ser descobertos na exploração clandestina de diamantes.

rocado
Enviado por rocado em 23/08/2018
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