Os crimes de Hércules. Sétimo crime.

SÉTIMO CRIME.

A cidade de Mor estava a salva com a prisão de Hércules, que na verdade, era Ariel, o policial reformado. Mor voltou a sua normalidade, as pessoas não tinham mais medo de saírem a noite, tudo parecia bem. O delegado Apolo designou o assassino para uma avaliação psiquiátrica com um especialista. Alguns detetives voltaram para a capital, apenas o detetive Roberto resolveu ficar mais aquela semana na cidade. Embora tudo parecesse bem, uma coisa ainda incomodava o delegado Apolo, e era exatamente a última frase dita do assassino quando ele foi preso.

( - Não se preocupe delegado, estou apenas começando, não se esqueça de que são doze os trabalhos, são doze os signos, aquilo que não terminei, meus discípulos… Terminaram, isso eu lhe garanto ─ Disse o policial assassino no momento em que foi colocado na viatura da polícia.)

Para Apolo a captura de Ariel foi fácil demais, alguma coisa ainda estava errada na história toda. Ele queria entender os verdadeiros motivos do assassino, e porquê ele matou uma jovem inocente? Eram muitas perguntas que não haviam sido respondidas, mas Apolo estava determinado em obter respostas.

O assassino foi colocado em uma sala pequena, no próprio prédio da delegacia, para ser analisado do ponto de vista psicológico pelo doutor Neuzariã, nesta sala havia apenas dois sofás e uma pequena mesa de centro. Ariel permaneceu o tempo todo algemado, não esboçou qualquer tipo de sentimento que remetesse violência, medo, ou arrependimento. Ele apenas respondia às perguntas feitas com extrema naturalidade.

- Podemos começar senhor Ariel? Disse o doutor.

- Sim claro, podemos sim?

- Como tudo isso começou? o senhor poderia contar-me, Ariel.

- Eu não me lembro de como ou quando isso começou. O que eu posso dizer é que eu tive uma infância normal, pelo menos eu a considero normal, não sei se isso tem haver com os fatos, mas eu tinha muitos amigos doutor, e como toda a criança sempre fui muito travesso; coitada da minha mãe, elas quase arrancava os cabelos de tanto nervoso que passava comigo, também não era para menos, um bando de moleques soltos o dia todo na rua, só podia dar em bagunça, mas… Foi uma época boa.

- Onde o senhor morava nessa época, em que considera como, " Boa.?

- Até os doze anos de idade eu morei em um sítio; não… Desculpe, sítio não doutor… Uma fazenda, essa fazenda ficava no interior de uma cidade próxima à cidade de Rio das Antas, que lugar maravilhoso e encantado. Havia de tudo lá, de tudo mesmo.

- Você tinha irmãos Ariel?

- Sim, éramos em dois irmãos e uma irmã, eu sou o mais velho, depois vem o Fábio, e a caçula Anita, sempre fomos muito travessos, como irmão mais velho a culpa de todas as traquinagens dos meus irmãos recaia sobre mim, as chineladas, palmadas e varas de goiaba eram sempre para mim, como minha irmã era a caçula, você já pode imaginar né... Ela aprontava todas e se livrava da culpa, meu pai não batia doutor, o desgraçado filho da mãe me espancava. Meu irmão Fábio era o tipo calado, ficava mudo diante de nosso pai, como eu sempre tentava explicar os fatos a culpa sobrava para mim. Que merda que era.

- Essa violência sofrida no seio do seu lar, você a considera um dos motivos de tê-lo influenciado aos seus atos posteriores?

- Não sei lhe dizer se isso influenciou no meu futuro doutor, às vezes penso que sim, às vezes penso que não. As vezes penso que temos uma missão. Talvez aquela fosse a minha.

- Como foi a educação que você recebeu de seus pais? Você a considera uma boa educação?

- Quando os senhor fala em educação, sim, a minha mãe sempre me deu uma boa educação, a escola era próxima da nossa casa, naquela época na fazenda tinha até a quarta série, da quinta série em diante tinha que ir para a cidade estudar.

- E quanto ao seu pai, quer dizer alguma coisa dele?

- Não toque mais nesse assunto doutor, por favor, não estrague a entrevista, me irrita falar de meu pai.

- Tudo bem, não falaremos nele. Agora diga-me; você era uma criança travessa certo?

- Se eu era bagunceiro. Mas é claro que era doutor, sempre aprontei todas, brigava quase todos os dias. Eu era muito bom em brigas.

- O seu temperamento sempre foi calmo? Ou o seu temperamento era explosivo? Como você julga o seu temperamento?

- Sim, o meu temperamento era muito explosivo na adolescência principalmente, sempre foi, e por causa disso apanhei a beça, mas na fase adulta, quando entrei para academia de polícia, meu temperamento foi trancado em uma pequena jaula ou modificado, não sei ao certo.

- Quando foi o seu primeiro contato com a violência? O senhor poderia me contar?

- Lembro-me da minha primeira briga sim, ô se lembro doutor. Foi na terceira série, com um menino da mesma idade minha, o motivo foi muito besta é claro, estávamos na fila do recreio, o folgado do menino cortou a fila, e bem na minha frente, eu pedi para que ele saísse e voltasse para o seu lugar, mas daí ele deu de ombros, não perdoei aquilo doutor, dei-lhe uma tremenda bofetada na cara, o resto você já sabe, socos e pontapés na orelha, fomos para diretoria, nossos pais tiveram que comparecer na escola levei uma tremenda surra do meu pai naquele dia, fiquei todo marcado, até hoje tenho as marcas.

- Embora, o senhor descreve sua infância ligada a eventos de violência, como o senhor julgar ter sido ela?

- Minha infância foi assim, de certa forma normal, toda criança apronta briga e tudo mais, a única coisa que era diferente em mim, isso eu reconheço, era meu temperamento explosivo, era anormal, coisas mínimas me tiravam do sério, às vezes no momento de raiva eu ouvia vozes.

- Você morou até a fase adulta com seus pais

- Não, quando eu completei doze anos fui morar na cidade de Rio das Antas, na casa de um tio, o motivo era os estudos, mas foi bem nessa época que as coisas começaram a acontecer, eu estava entrando na adolescência a fase mais difícil da vida, pelo menos no meu ponto de vista.

- O senhor cultivava amizades, ou era recluso, do tipo que não queria saber de ninguém?

- Recluso não, tive muitos amigos na escola, e todos eles eram os piores da escola doutor, minhas amizades definiriam quem eu seria, é sempre assim doutor, as amizades da adolescência influencia no nosso futuro, se não diretamente, indiretamente, no meu caso foi dos dois jeitos eu acho, indireta e diretamente.

- Os seus pais brigavam, houve eventos em que o senhor quando criança presenciou brigas?

- Os meus pais brigavam muito doutor, não tinha lugar, não tinha hora, bastava um mínimo de qualquer desentendimento e pronto, estava feita a briga.

- Eles faziam isso na sua frente Ariel?

- Sim claro, eles brigavam muito na minha frente, não só de boca, eram socos para tudo o que é lado, minha adolescência foi recheada de violência, começando pela casa dos meus pais, na verdade o meu pai era o violento, minha mãe apenas se defendia. Depois a violência se estendeu a escola, e foi na escola que experimentei o cigarro pela primeira vez doutor, um colega chamado Bruno me ofereceu no recreio, daí foi uma consequência desastrosa de erros, de um cigarro foi para dois e três, e depois veio à maconha, cocaína, eram sempre as mesmas pessoas que ofereciam, depois veio o vício, nessa época eu já tinha atingido a maioridade, eu saí de casa, perambulei por aí, depois de muito tempo. Eu fui para uma clínica de recuperação da polícia na cidade de Mor, me recuperei lá, e por influência deles mais tarde tornei-me policial.

- O senhor via os seus pais nesse período?

- Não, eu não via meus pais com frequência, eu diria que a cada dois meses eu acho, no começo meus pais tentaram conversar comigo, mas não adiantou a rebeldia já havia dominado meu coração, e um ódio descontrolado pelo meu pai que não consigo explicar, aquilo tomou conta de mim, na verdade ditava as regras da minha vida. Mesmo depois de estar na Polícia.

- O senhor conseguia controlava as suas emoções?

- Não doutor, eu nunca tive controle das minhas emoções, era e é tudo uma bagunça dentro da minha cabeça, eu nunca consegui me controlar de verdade.

- O senhor já furtou antes? Se furtou, lembra-se de como foi?

- Sim, lembro-me perfeitamente da primeira vez que roubei, foi um mercadinho próximo de casa, lembra-se do Bruno que me deu o primeiro cigarro que mencionei agora a pouco, então, foi ele quem me deu a arma, um trinta e oito bem velho e enferrujado, ele me deu uma daquelas toucas ninjas, esperei o melhor momento e fui ao ataque.

- O quê o senhor sentiu naquele momento em que cometia o crime?

- Olha doutor… É difícil dizer o que eu senti naquele momento, eu diria que medo, com dose de euforia, e depois do roubo, uma sensação de alegria talvez, eu gostei daquilo eu tive prazer em roubar, depois é claro veio os outras coisas.

- O senhor voltou a morar com os seus pais nessa época

- Não, eu não moro mais com meus pais, eles pegavam muito no meu pé, e como eu tenho um temperamento descontrolado e agressivo, decidi morar em outro lugar, antes que eu fizesse algo de ruim com eles.

- E o senhor teria coragem de agredi-los?

- Se eu tinha coragem! Mais doutor, é claro que eu tinha e tenho, eu acho… Bom… Não tenho muita certeza doutor, deve ser por isso que pediram que você viesse né, não sei por que isso tudo, mais tudo bem, vamos lá, continuemos então.

- O senhor se viciou em Drogas?

- Sim, eu era um viciado em varias drogas doutor, e o vicio é como dizem, te escraviza, te domina, não adianta tentar fugir, não adianta doutor.

- E as suas antigas amizades? Ainda perduram?

- Sim, eu continuei com as mesmas amizades, o Bruno é como um irmão para mim.

- Havia naquela época algum tipo de grupo ou organização da qual os senhores agiam?

- Sim doutor, tínhamos um grupo, fazíamos barbáries, todos tinham medo, principalmente de mim, pelo meu temperamento, e com o efeito das drogas eu ficava ainda pior. Vivíamos fugindo da polícia, meus pais por exemplo doutor, eu nem visitava mas, a única falta que sinto é da minha mãe, principalmente dos abraços dela.

- Vamos fazer um intervalo, um descanso, se o senhor quiser, continuaremos depois do almoço.

- Tudo bem então doutor, foi até bom desabafar com o senhor, depois do almoço então, tudo bem para mim, combinado então, tenho muita coisa a lhe contar, de certa forma isso parece me deixar um pouco mais calmo, quem sabe o senhor consiga me consertar. Não é mesmo doutor. Obrigado, um bom almoço para o senhor.

ENQUANTO ISSO NA DELEGACIA.

Apolo estava pensativo, ainda analisando os fatos referente aos crimes e as provas, tentando entender algumas coisas, que por ventura, veio a passar desapercebido.

De repente, um dos policiais entra em sua sala apressadamente, o olhar assustado.

- Mais o quê foi agora Carlos, que cara é essa, viu um fantasma?

- Delegado!; é melhor o senhor vê isso, estão todos assustados.

- Ver o quê homem? Conte-me logo o quê houve, assustado com o quê?

- Lembra-se da jovem morta, a última vítima do Ariel.

- Sim, eu me lembro, O que tem ela?

- O pai dela, o vereador Anacleto, lembra-se dele? Que depois da morte da filha disseram que ele tinha viajado.

- Sim, claro, mas o que tem haver isso meu filho? O que o senhor quer dizer? Seja claro.

- Acabaram de encontrá-lo doutor… Morto... Amarrado dentro de uma jaula com javalis selvagens, coisa horrenda. E tem mais… Na sua testa estava escrito Hércules, e o número sete.

O delegado deu um salto da cadeira, quase sem voz, colocou as mãos sobre a cabeça, acendeu outro cigarro.

- Mais ele está preso - Disse o policial - o assassino está preso, como pode?

- Por favor Carlos, mande chamar o detetive Roberto agora, ele ainda está na cidade, no hotel nova Esperança. Mantenha isso em segredo, tente ser discreto, e, por favor, mantenha a mídia fora disso por enquanto.

O policial saiu na mesma hora, quase a tropeçar nos próprios passos, enquanto o delegado Apolo foi direto onde o prisioneiro estava.

Tiago Macedo Pena
Enviado por Tiago Macedo Pena em 02/06/2017
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