~*SENHOR DAS DESCONFIANÇAS*~ cap. L
- Mas num certo dia minha neta Thalia me viu numa rua e descobriu que eu estava viva - prosseguia a Sra. Eloise contando de seu caso - e eu disse para ela que tinha sobrevivido ao acidente, mas que havia perdido a memória e ela teve a ideia de me levar algumas lembranças minhas que agora estavam na mansão. Foi quando eu perguntei sobre meus relacionamentos e pedi a ela uma foto de Wagner. Mas a verdade é que eu não tinha perdido a memória, me lembrava muito bem de cada um de vocês e até do dia do passeio de bote e do momento em que Beatriz tentou me afogar!
- Então por qual motivo a senhora mentiu para minha filha Thalia? - questionou o Sr. Arantes.
- Porque... Porque eu não quis dizer o real motivo pelo qual pedi a fotografia de meu marido, porquanto isso já havia causado uma grande confusão.
- Não entendo a que se refere, mas... Quanto ao fantasma, mamãe?
- Ah - ela deu uma risada, mirando o olhar na Sra. Beatriz e retrocedendo-o ao filho - Também falei para minha neta que ao ler meu diário soube do quanto sua esposa me detestava e que por essa razão queria assustá-la de algum modo. Mas na verdade não foi por causa do que eu li em meu diário e sim por Beatriz ter tentado me afogar no passado. Isso também explica a frase que escrevi na janela.
- Quer dizer que a todo esse tempo só minha filha Thalia sabia que a senhora estava viva? - ele virou o rosto para fitar Thalia, pensando que iria ouvir algo dela, mas sendo chamado a atenção para outra pessoa ali.
- E eu também - quem disse foi Hudson, o xofer, levantando devagarinho o braço e virando alvo do olhar do Sr. Carlos Arantes.
- Você? - indagou com o cenho franzido o Sr. Carlos.
- Eu precisei pedir para Hudson me levar à casa da vó Eloise e para isso eu mentia dizendo que ia visitar a tia Madalena - explicou Thalia, tomando a vez - Isso mesmo, papai, todas aquelas vezes em que eu disse que ia para a casa de minha tia eu estava indo era ver a vovó.
- Que decepção - ele disse à medida que se sentava no sofá e meneava de um lado a outro a cabeça com a mão na testa - Fui enganado por minha própria filha... Bom, pelo menos sei agora que minha mãe está viva.
- Mas não pensem que acabou por aqui! - o detetive enunciou, após um período em silêncio.
- Não? - o Sr. Carlos perguntou com um ar de exaustão.
- Não seria justo eu revelar todos esses segredos e não falar sobre uma peça muito importante desse jogo! Pois, que seria do xadrez sem o rei? Uma partida impossível? - Ruan olhou para o Sr. Arantes ao falar - Devem estar se perguntando de quem estou falando... Pois digo que é daquele que começou tudo isso me chamando para resolver o mistério.
Nesse instante o Sr. Carlos levantou o rosto, viu que os olhos de Ruan estavam fitos nele e com um certo temor foi afundando no sofá.
- Sabe, desde que ele me disse que almejava me contratar para investigar o súbito desaparecimento de objetos e fotografias de sua mãe, eu desconfiei de que havia alguma coisa muito misteriosa nessa história - dizia Ruan, andando de um lado para o outro, a refletir - Por que um homem se preocupa tanto com algumas fotografias e coisinhas mais sumidas? Sem contar que foi o caso mais distinto de todos os que já investiguei. Então pensei que para ele se preocupar tanto assim com essas "coisinhas" elas teriam de ter um grande valor... Sim, um valor sentimental! Não. Não só um valor sentimental, mas um maior valor. Até que comecei a suspeitar de algumas coisas... Primeira: o cofre secreto do Sr. Arantes.
- O senhor tem um cofre? - perguntou Thiago ao pai e este outro se encolhia mais no sofá.
- Sossegue, Thiago - falou Ruan -, lá seu pai só guardava fotografias. E por isso estranhei, um cofre só para guardar as fotografias da mãe? E ele me disse que temia perdê-las também, já que eram as últimas que lhe restavam, ainda assim suspeitei de algo. Outra coisa que também me intrigou demasiado foi na vez que vi o Sr. Arantes molhando fotografias na água e disse todo desajeitado que só queria limpá-las! Foi daí que minhas desconfianças aumentaram. Agora vem a parte mais surpreendente! Estava eu me preparando para dormir e antes quis tomar um pouco de água, mas dispropositamente derramei água encima da fotografia que carrego da Sra. Eloise com o músico e sabem o que eu descobri? Um enígma no verso da foto. Acredito que foi escrito com alguma tinta incolor que se acende com algum tipo de líquido. E, me perdoe, senhor Arantes, mas tive que abrir seu cofre para saber se as demais fotografias também escondiam algum enígma.
- Anh? - o Sr. Arantes levantou-se de supetão e olhou com reprovação o detetive.
- E descobri algo extraordinário! Alguém arrisca um palpite? - o detetive jogou a vista para direções distintas e não houve nenhuma manifestação, apenas rostos repletos de receio e curiosidade - Ninguém? Está bem, então direi! Havia sim em cada fotografia um enígma no verso e todos eles falavam de uma única coisa: um tesouro.
Sabendo disso, parte dos ali presentes fizeram um "oh!" que mais pareceu ensaiado, por terem ficado surpreendidos. Ruan gostou daquelas reações, ele sempre gostava quando as suas magníficas revelações causavam espanto aos ouvintes; era como contar uma piada e conseguir fazer alguém rir.
- Sim, um tesouro! - ele ressaltou com prazer - E isso justifica a tamanha importância que as fotografias têm para o senhor Arantes e o porquê dele ter as mergulhado na água, pois descobriu sobre o tesouro. Mas ele estava mais inquieto em razão de que não encontrava a fotografia com o seguinte enígma e ficou remexendo na caixinha de jóias de sua mãe, porquanto no enígma interior dizia: "no fundo, uma caixinha de jóias sempre guarda uma lembrança". Exatamente, "no fundo"! Foi onde eu encontrei a fotografia da Sra. Eloise.
O Sr. Arantes prestou a atenção no rosto de Ruan, refletiu sobre aquilo, recordando-se das tantas vezes que verificou a caixa de jóias de sua mãe e não foi capaz de perceber a fotografia oculta. Deixou os ombros caírem. Então o detetive Ruan girou os ombros e lançou o olhar à Sra. Eloise.
- Agora, Sra. Eloise, poderia nos contar melhor sobre esses enígmas nas fotos? - disse Ruan.
- Sim - respondeu a Sra. Eloise - Tudo começou quando Wagner me disse que tinha um tesouro em algum lugar de nossa casa; ele estava no exterior, mas eu fiquei na casa. Para deixar tudo mais divertido, Wagner resolveu me enviar por correio fotografias, cada uma com uma pista de onde estaria o tesouro. Essas pistas me levaram a diversos objetos, lembranças, coisas velhas e presentes. Contudo, antes que eu terminasse as últimas fotografias e encontrasse o tesouro, aconteceu o acidente e eu não voltei mais àquela casa. E quando reencontrei minha neta Thalia, pedi à ela as fotografias de meu baú exatamente para ter conhecimento das fotografias com as últimas pistas, mas parecesse que o detetive as encontrou primeiro.
~*Continua...